Título: Governo admite que crise chegará ao país
Autor: Álvares, Débora; Batista, Vera
Fonte: Correio Braziliense, 05/08/2011, Economia, p. 10

Em reunião com sindicalistas, Dilma afirma que situação se agravou. Guido Mantega antevê queda no crédito e no comércio exterior

O derretimento dos mercados financeiros ontem, num ensaio do que ocorreu no último trimestre de 2008, assustou o governo. A presidente Dilma Rousseff acusou o golpe. Numa reunião com sindicalistas, fez um paralelo entre o cenário atual e o que se seguiu à quebra do banco norte-americano Lehman Brothers. Segundo relato dos representantes dos trabalhadores, Dilma claramente deu a entender que a crise global se agravou, passando de uma gripe para uma pneumonia. Preocupado com as possíveis implicações negativas da frase, o Palácio do Planalto divulgou a transcrição de um trecho da conversa atribuído a ela. "A situação internacional é assim. Na crise aguda, você reage de uma forma. Na crise crônica, mudamos a reação", a presidente se limitou a dizer, na versão de seus assessores.

O encontro teve a participação de nomes importantes das centrais sindicais, do ministro da Fazenda, Guido Mantega, e do ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho. A equipe econômica está seguindo detidamente os acontecimentos nos Estados Unidos, na Europa e nos mercados globais e avalia tomar novas medidas para reduzir os efeitos internos das turbulências. Ontem, Mantega reconheceu que o país vai sofrer com o agravamento dos problemas. "Temos que ficar alertas. É claro que sempre haverá consequências. Sempre há, por exemplo, queda na Bolsa. Pode haver diminuição de comércio e de crédito, mas o Brasil enfrentará a crise com um mínimo de danos", previu.

Segundo o ministro, o Brasil "nunca esteve tão bem preparado para enfrentar as consequências de uma crise", porque tem reservas e mecanismos de defesa eficientes, criados desde o tombo de 2008. "Eles poderão ser implantados a qualquer momento", disse. Entre os instrumentos, estão a liberação de depósitos bancários compulsórios e a redução dos juros. Ele afirmou que não teme um movimento brusco do dólar, o que poderia ocorrer em caso de fuga de capitais. "Não acredito em overshooting (valorização excessiva), embora o dólar esteja subindo hoje (ontem). Acredito em movimentação relativa do câmbio", assegurou. Para Mantega, o país "certamente oferece segurança" e deverá sofrer "danos mínimos".

Segurança Mantega afirmou que, diante do enfraquecimento das economias norte-americana e europeia, é natural que ocorram quedas nas cotações das ações na Bolsa de Valores de São Paulo, nas trocas comerciais e também no crédito. Mas essa conjuntura, embora adversa, será insuficiente para elevar significativamente o preço do dólar, mesmo com as medidas já tomadas no mercado de câmbio para conter uma supervalorização do real. "Apesar de não sabermos qual é a reação do mercado. No passado, sabíamos que era uma fuga para a segurança. Hoje, eu pergunto, onde está a segurança?", indagou.

O ministro fez esses comentários antes de embarcar para Lima, capital do Peru, onde participará de reunião da União de Nações Sul-Americanas (Unasul). Vai discutir os riscos da crise internacional para a América Latina e a fixação de mecanismos conjuntos de defesa, principalmente em caso de fuga de capitais. Um dos temas centrais será a possível criação de um banco regional de compensação financeira ou o fortalecimento de instituições semelhantes que já existem. Também fazem parte da pauta estratégias para conter o fluxo comercial de países desenvolvidos, que sofrem com o aumento da dívida soberana e se aproveitam da queda das moedas fortes para invadir os mercados emergentes com produtos que não conseguem vender na origem.