Ministério Público Federal pediu ao presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que envie os trabalhos realizados pelo setor de controle interno do “cotão” da Casa para a contratação de uma gráfica de fachada que faturou R$ 1,7 milhão de 143 deputados. Como mostrou o Correio em abril do ano passado, a empresa Gráfica e Papelaria BSB não existe, e o dono apenas agencia negócios com parlamentares, que usaram reembolsos originados na verba de R$ 92 mil mensais para contratar a firma. Quatro meses após a reportagem, a Receita Federal abriu uma investigação, fechou a empresa e encontrou indícios de que os serviços não foram prestados. Como mostrou o jornal no último dia 10, o proprietário, Edvaldo Francisco de Oliveira, declarou que a maioria dos pagamentos dos parlamentares era feito em dinheiro vivo — os deputados se negaram a responder sobre a forma de pagamento utilizada.
No ofício, que chegou à Câmara na semana passada, o procurador da RepúblicaFrederico Paiva quer a amostra da Cota para o Exercício da Atividade Parlamentar (Ceap), o nome oficial do “cotão”. Ele lista 16 parlamentares e ex-deputados, que fecharam contratos com a Gráfica BSB entre 2009 e 2010. Dados da Câmara analisados pelo movimento Operação Política Supervisionada (OPS) mostram que esse conjunto de deputados gastou R$ 1,6 milhão entre 2009 até o ano passado, ou 91% do total. Quem lidera o grupo é o deputado e ex-governador Carlos Bezerra (PMDB-MT), que gastou R$ 392 mil no período, mas não prestou esclarecimentos. A assessoria da Câmara informou que a Casa busca responder o pedido de informações de Paiva.

O procurador explica o motivo de suas suspeitas. “Há indícios de que os serviços não tenham sido prestados”, disse Paiva em entrevista ao Correio. O procedimento preliminar, aberto em agosto do ano passado, será convertido em inquérito civil público, segundo ele. “A princípio, há indícios de malversação de recursos públicos.”
Edvaldo Francisco de Oliveira disse à Receita Federal que repassava todo o serviço para uma pessoa que chamou de “Zezito”, e que ficava com 70% do dinheiro. O depoimento integra representação fiscal por falsidade ideológica enviada ao Ministério Público. Três orçamentos obtidos pelo Correio mostram que gráficas de Brasília cobrariam até menos da metade por 140 mil informativos contratados por Carlos Bezerra, pelos quais ele pagou R$ 20 mil, valor reembolsado pela Câmara mediante o cotão.

Paiva diz que é preciso saber se os valores cobrados são razoáveis. “Tem que se verificar se o valor que está sendo pago é razoável, se a qualidade do material impresso condiz com valores de mercado”, afirmou ele. Como a Câmara não utiliza licitações, ele entende que o simples uso do “cotão” é “obviamente antieconômico” para o contribuinte. No ano passado, o procurador Anselmo Lopes abriu ação civil pública contra o Senado e a Câmara por não abrirem concorrências públicas para serviços comuns, como impressões, compra de combustíveis e locações de carros. Sem licitação, as duas Casas permitem que os parlamentares gastem até R$ 249 milhões por ano.