Título: Desmando inaceitável
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Fonte: Correio Braziliense, 17/08/2011, Opinião, p. 16
Talvez nenhuma grande cidade brasileira exiba frota de ônibus tão sucateada quanto o Distrito Federal. Apesar de a lei fixar em sete anos o limite de idade do veículo, metade dos que circulam na capital da República ultrapassaram o teto. Passam pelas retas e curvas do Plano Piloto e cidades do DF ônibus com duas décadas de fabricação. Como no Velho Oeste, lei e fiscalização só existem no papel. Na prática, são ignoradas com a desenvoltura de quem não tem contas a prestar.
O descaso não se restringe aos carros velhos, sujos, sem manutenção. Atinge a mão de obra. Sem receber treinamento adequado que os torne aptos a tratar o público com civilidade, motoristas e cobradores desconhecem normas elementares exigidas dos que têm o dever de transportar adultos e crianças. Ignorar passageiros nas paradas, arrancar antes de todos terem entrado, dar freadas bruscas, desconhecer informações básicas constituem rotina a que o brasiliense se submete por absoluta falta de opção.
Pelos maus-tratos, vale lembrar, o cidadão paga uma das tarifas mais caras do país. A contrapartida faz parte da humilhante paisagem urbana de uma das capitais mais modernas do mundo. Sem obrigação com a periodicidade ou o horário, os ônibus impedem que as pessoas planejem seu ir e vir. Atender a compromissos com pontualidade depende da sorte ou da determinação de sair de casa com muita antecedência ¿ o que se traduz em perda de tempo e de energia. Mais: veículos quebrados deixam passageiros no asfalto à espera de socorro que não tem pressa de chegar.
O poder público contribui para a via crucis. A falta de segurança aumenta dia a dia. Assaltantes fazem arrastões no interior dos ônibus. Cobradores e motoristas vivem aterrorizados com a possibilidade de assaltos. Paradas escuras estimulam a violência e amedrontam quem embarca ou desembarca à noite. A escassez de abrigos obriga usuários a esperar o transporte sob sol ou sob chuva. Muitos pontos não contam, sequer, com placa de sinalização para indicar a parada.
Brasília completou 51 anos. Abriga 2,5 milhões de moradores. Já passou da hora de tratar o transporte público com seriedade. Décadas de desmandos entregaram o setor à sorte e a empresários muitas vezes inescrupulosos. O governo tem de transformar promessas de campanha em fatos.
A ampliação das linhas, a integração vans-ônibus-metrô, a ativação dos corredores exclusivos, a renovação de frotas, a qualificação dos servidores, a construção do VLT, a fiscalização são urgências reiteradamente repetidas. Até quando?