Maioridade penal acirra debate entre ativistas no Congresso
Parte dos manifestantes que agitaram as sessões da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados em março não era nem nascida quando a proposta de emenda constitucional (PEC) para a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos começou a tramitar, em 1993. É o caso da presidente da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes), Bárbara Melo, 20 anos, ferrenha opositora à PEC, aprovada pela comissão no último dia 31. Ela é uma das mais assíduas nas sessões que debatem a questão no Congresso para protestar — muitas vezes com ânimos acirrados, ataques aos parlamentares e até xingamentos — contra ou a favor da medida.
Roberto Sekiya foi a Brasília apoiar proposta porque vê crime crescer - Ailton de Freitas-31-03-2015 / Agência O Globo
Nas sessões da CCJ, os manifestantes contrários à PEC eram maioria, mas havia também alguns favoráveis, como o administrador Roberto Sekiya, de 40 anos. Morador de São Paulo, ele faz parte da União em Defesa das Vítimas de Violência e foi a várias reuniões da CCJ em março. Sekiya diz ser amigo da família da deputada Keiko Ota (PSB-SP), que apoia a redução da maioridade penal. O filho dela, Yves, foi assassinado em 1997 quando tinha oito anos, num crime que causou comoção nacional. Os assassinos, porém, eram maiores de 18 anos.
O mesmo clima de enfrentamento poderá se repetir nas próximas semanas na comissão especial criada na Câmara para analisar o assunto antes da votação. Além de gerações diferentes, as reuniões em torno dessa PEC têm atraído manifestantes de visões e origens diversas. Em comum, eles têm, em geral, algum tipo de militância política.
Filiada ao PCdoB, Bárbara era também uma das mais ativas nas críticas aos deputados favoráveis à proposta. Na sessão do dia 31, por exemplo, era comum ouvi-la chamar um ou outro deputado de fascista. Quando questionada sobre o porquê de ir à comissão protestar, Bárbara dá motivos de ordem legal e também social:
— Acredito que a PEC é inconstitucional, fere direitos individuais. Não é solução colocar o jovem na cadeia mais cedo. Para nós, a solução é algo que evite que ele cometa crimes, que o Estado se preocupe com as desigualdades sociais, com escolas de qualidade, que o jovem tenha lazer e cultura, não vá para a criminalidade. E que aqueles que estejam na criminalidade tenham tratamento diferenciado, com medidas socioeducativas que possam recuperá-los.
— Cada vez mais têm vindo aqui familiares de vítimas em que os assassinos são menores de idade. Nos últimos seis anos, aumentou demais. Latrocínio, tiro na cabeça, espancamentos, crimes muito cruéis. Tudo cometido por menores — rebateu Sekiya.
Na CCJ, Jardel Santana mostra cartaz contrário à prisão de menores - Ailton de Freitas/31-03-2015 / Agência O Globo
Contrário à PEC, mas com um perfil mais contido que a presidente da Ubes, o psicólogo Jardel Santana, de 32 anos, era outra presença constante na CCJ. Católico, ele é integrante da Comissão de Direitos Humanos do Conselho Regional de Psicologia do Distrito Federal, faz parte da Pastoral da Juventude e também da Rede Brasileira de Centros e Institutos de Juventude.
Um tumulto ocorrido na Comissão de Constituição e Justiça em 24 março foi um dos motivos alegados para controlar a entrada, mas acredita que era do interesse dos parlamentares favoráveis à PEC tumultuar a sessão.
— A audiência pública foi tumultuada por um dos parlamentares, que começou a discutir com outro. Não foi a galeria. A avaliação que a gente faz é que seria uma estratégia. A primeira mesa foi com dois constitucionalistas. um que defende a constitucionalidade e outro que era inconstitucional. A segunda mesa era com quatro representações do campo jurídico. Parece que os deputados que fizeram tumulto estavam com medo dessa segunda mesa se posicionar de forma contrária. Aí foi suspensa a audiência — afirmou Santana.
Apesar disso, ainda há várias etapas a serem vencidas para que a PEC se converta de fato numa emenda constitucional e a maioridade penal aos 16 anos passe a valer. Isso porque, para evitar constantes mudanças na Constituição, foram criadas regras que tornam a aprovação de uma PEC mais morosa. A da redução da maioridade penal, apresentada em 1993, teve sua admissibilidade aprovada no último dia 31 de março na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara. Isso significa que a maioria dos deputados da comissão entendeu que a proposta não viola a própria Constituição e o ordenamento jurídico brasileiro.
Uma nova etapa da tramitação foi iniciada na última quarta-feira com a instalação de uma comissão especial que tem 40 sessões — cerca de três meses — para analisar a PEC. Se a comissão, onde 20 dos 27 deputados são favoráveis à proposta, aprovar a PEC, ela ainda precisará ser votada em dois turnos no plenário da Câmara. Nessa etapa, precisa do apoio de pelo menos 60% dos deputados, ou seja, 308 dos 513.