Duplicação de tercerizados

Correio braziliense, n. 19967, 01/05/2015. Economia, p. 7

Simone kafrune

Na lista de ameaças aos direitos trabalhistas neste ano de ajuste fiscal, as medidas provisórias que reduzem o acesso a seguro-desemprego, abono salarial, pensão por morte e auxílio-doença somam-se ao polêmico PL nº 4330, que amplia a terceirização para as atividades-fim.

Aprovado pelos deputados federais, o projeto está em avaliação no Senado. Para a vice-procuradora-geral do Trabalho, Eliane Araque, a proposta de ampla terceirização vai provocar a precarização dos direitos trabalhistas, a redução dos salários e a pulverização do poder sindical, com menor capacidade de barganha dos trabalhadores. “Isso permitirá que empresas administrem apenas seu capital e o lucro, sem funcionários”, assinala. O presidente do Superior Tribunal do Trabalho (TST), Antonio de Barros Levenhagen, também vê com restrições a proposta que tramita no Congresso (leia entrevista na página 8).

A vice-procuradora argumenta que, hoje em dia, com a permissão de terceirização apenas para atividades-meio, já existem muitos problemas trabalhistas no setor, como salários baixos e desrespeito a direitos básicos. “Os problemas tendem a se agravar, sem que a terceirização possa promover ganhos de produtividade para as empresas, reduzir a rotatividade ou ampliar o emprego”, resume.

No entender do advogado trabalhista e sócio do L.O. Baptista-SVMFA, Fabio Chong, o projeto é bom para os trabalhadores que já atuam como terceirizados porque regulamenta a categoria. “Mas também deve empurrar quem é empregado hoje para o setor”, avalia. Estimativa do vice-presidente do Conselho Federal de Economia (Cofecon), Júlio Miragaya, aponta que o número de terceirizados, hoje em 13 milhões de pessoas, poderá ser ampliado para 30 milhões em quatro ou cinco anos com a aprovação do PL nº 4330.

Chong contesta, no entanto, a ideia de que os rendimentos dos terceirizados são os mais baixos do mercado. “Tem-se essa impressão porque, por enquanto, a terceirização existe para profissões menos qualificadas. Mas os trabalhadores possuem os mesmos direitos e a tendência, quando ela for ampliada, é que os salários sejam equiparados”, aposta.

Incoerência

O especialista do L.O. Baptista alerta que há uma incoerência na legislação brasileira. “Enquanto o salário é preservado, o emprego, não”, destaca, referindo-se ao impedimento de redução salarial. “Se os empresários pudessem entrar em acordo para diminuir os vencimentos dos empregados em momentos de recessão, talvez o desemprego não avançasse tanto. Mas, como isso é inegociável no Brasil, a saída é a demissão”, lamenta.

No entender do advogado Paulo Souto, do escritório Souto Correa, a grande ameaça da renda em queda e do desemprego em alta é o aumento da inadimplência. As famílias estão superendividadas, comprometendo mais de 46% da renda, conforme dados do Banco Central (BC). “A devolução de bens, como carros e imóveis, já está aumentando pela incapacidade de pagamento”, alerta.