Valor econômico, v. 15, n. 3743, 25/04/2015. Brasil, p. A2

 

Deterioração de expectativa responde por 40% da alta do IPCA, calcula consultoria

 

Por Arícia Martins | De São Paulo

O processo de deterioração das expectativas respondeu pela maior parte da inflação de 6,41% registrada pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) em 2014, segundo estudo da MCM Consultores. Para o Banco Central, essa variável teve papel secundário no IPCA do ano passado. Cálculos feitos pela MCM, no entanto, mostram que as estimativas para o indicador 12 meses à frente explicaram 2,56 pontos percentuais do índice oficial de inflação no período, ou 40% do total.

Para chegar a esse resultado, a consultoria usou metodologia alternativa à do BC para decompor a alta dos preços. Tanto para estimar a contribuição da inércia quanto das expectativas sobre a inflação corrente, o BC inclui em seu modelo somente a parcela de variação do IPCA que excede o centro da meta de 4,5%. Esse cálculo foi usado na Carta Aberta de 2002. Nela, o então presidente do BC Arminio Fraga explicava a Pedro Malan, ministro da Fazenda na época, por que o IPCA havia estourado o teto da meta de 6,5% no ano.

 

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A equipe da MCM avalia que esse método é útil para identificar os motivos do desvio do IPCA em relação à meta em determinado ano, mas, para analisar a herança da evolução passada dos preços na inflação presente, assim como o impacto das expectativas, o correto seria usar os "índices cheios".

Com essa mudança, as expectativas passariam a explicar 2,56 pontos da inflação de 2014, ao invés do 0,69 ponto apontado pelo BC, ou apenas 11% do total. Para a inflação de cada trimestre, a consultoria considera a influência das estimativas para o IPCA 12 meses à frente contidas no boletim Focus, assim como os efeitos defasados da expectativa passada.

Em 2013, as expectativas responderam por 10,1% da inflação no cálculo do BC, fatia que aumenta para 40,9% na metodologia da consultoria. O BC destaca que esse fator ganhou participação na dinâmica inflacionária de 2012 a 2014, uma vez que as expectativas para o IPCA nos próximos 12 meses fecharam 2012 em 5,5%, ultrapassaram 6,2% em outubro de 2013 e subiram mais em 2014, terminando o ano acima de 6,6%.

"Como as expectativas foram se deteriorando a partir de 2011, é natural que seu peso na inflação aumente", diz Mauro Schneider, economista da MCM, para quem uma combinação de fatores está por trás dessa trajetória. Em primeiro lugar, Schneider menciona o ciclo de relaxamento monetário entre agosto de 2011 e outubro de 2012, que levou a Selic de 12,5% para 7,25% ao ano. "Daquele processo, ficou uma sensação de que a redução dos juros era um objetivo em si. Isso foi revertido, mas o estrago já havia sido feito", afirma.

Naquele momento, lembra Schneider, a autoridade monetária parecia estar conformada com a ideia de que a inflação seria elevada por período mais longo, o que teve repercussão negativa sobre as expectativas. Mesmo depois que o ciclo de queda da Selic foi revertido, a partir de meados de 2013, o BC estava "enxugando gelo", porque a política fiscal expansionista caminhava em sentido contrário ao aperto monetário, diz. Além disso, afirma Schneider, no período mais recente, a recomposição de preços administrados e a alta do dólar também afetaram as expectativas para a inflação futura.

"Quando há algum crescimento econômico, como nos últimos anos, os agentes econômicos olham para a norte das expectativas para reajustar seus preços, que no nosso caso foi sendo elevado a cada ano em que o governo não conseguia cumprir a meta de inflação", afirma Schneider.

Fazendo um paralelo com 2002 e 2003 - quando, de acordo com a medição do BC, as expectativas foram responsáveis por 1,7 ponto do IPCA nos dois anos - o professor Luiz Roberto Cunha, da PUC-Rio, observa que a variável ganha peso na inflação quando as incertezas sobre a economia aumentam. O ano passado, diz Cunha, foi de incertezas elevadas. A partir de 2016, a tendência é que as expectativas tenham influência menor no processo inflacionário, mas caso o ajuste fiscal fracasse, pode haver nova deterioração.

Adriana Molinari, da Tendências Consultoria, não tem cálculos específicos sobre o tema, mas concorda que as expectativas são o componente de maior peso na formação de preços atualmente, na medida em que foram sendo revistas para cima, mesmo depois que o BC começou a subir os juros. Adriana vê pequena mudança no período recente, já que, segundo o boletim Focus, a estimativa para a alta do IPCA em 2016 se estabilizou em 5,6%, mas destaca que a melhora da comunicação do BC ainda não foi suficiente para ancorar as expectativas em nível mais próximo ao centro da meta.

Para 2017, a projeção mediana dos analistas consultados pelo BC conta com alta de 5% do IPCA, mesmo percentual previsto para 2018. "Se o BC quiser trazer a inflação um pouco mais para baixo, uma das questões mais relevantes é ancorar as expectativas em patamar mais próximo de 4,5%", diz Adriana.

A equipe da MCM avalia que, para vencer a batalha das expectativas, o juro real precisa ficar acima do nível considerado neutro - que permite à economia crescer sem gerar pressões inflacionárias - mesmo em 2016. A consultoria trabalha com corte de apenas um ponto na Selic no próximo ano. Em 2015, a expectativa é que chegue a dezembro em 13,25% ao ano.

Analistas estimam desemprego de 6,1% em março

 

Por Camilla Veras Mota | De São Paulo

Dando sequência à perda de fôlego no mercado de trabalho observada no início do ano, a taxa de desemprego deve crescer em março mais de um ponto percentual em relação a igual período de 2014 e chegar a 6,1%, de acordo com a média de projeções de 13 consultorias e instituições financeiras ouvidas pelo Valor Data. As estimativas para a Pesquisa Mensal de Emprego (PME), que será divulgada amanhã pelo IBGE, variam de desemprego de 5,9% a 6,3%.

Entre janeiro e fevereiro, o indicador avançou de 5,3% para 5,9% devido principalmente ao crescimento das demissões, traduzido na queda de 1% na população ocupada no período. Para Bruno Rovai, economista do banco Barclays, essa dinâmica se repete em março, mais uma vez com queda na variável em relação ao mesmo intervalo do ano passado. Assim, as demissões devem pressionar mais a taxa de desemprego do que a procura por novas vagas - esta visível, por sua vez, no comportamento da população economicamente ativa, que se mantém praticamente estável no bimestre, em relação a janeiro e fevereiro de 2014.

 

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O economista chama atenção para os dados de renda da PME. No confronto com os mesmos períodos do ano anterior, o rendimento médio real aumentou 1,7% em janeiro e recuou 0,5% em fevereiro. "Se continuarmos vendo a combinação de queda na ocupação e renda real negativa, como em fevereiro, as perspectivas para consumo das famílias neste ano devem se deteriorar ainda mais", pondera.

A tendência, diz Igor Valecico, do Bradesco, é que a desaceleração continue nos próximos meses. Isso porque o comportamento dos salários de admissão apurados pelo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) - que têm sinalizado altas cada vez menores nos últimos meses -, afirma o economista, guardam correlação defasada com a renda da PME e, assim, antecipam de certa forma o comportamento do indicador.

O movimento já é visível em fevereiro, quando o rendimento nominal da PME - para o economista, uma medida melhor do que a renda real, comprometida com a inflação acima de 7% no acumulado em 12 meses - subiu 7,3%, a menor alta desde outubro de 2013. No mesmo período de 2014,, a renda nominal subiu 9%.

A MCM Consultores projeta aumento de 0,6% da renda média real em 2015 em relação ao ano anterior, afirma Sarah Bretones, que também ressalta os sinais dados pela desaceleração dos salários de admissão mostrados pelo Caged.