Valor econômico, v. 15, n. 3743, 25/04/2015. Política , p. A8

 

Diminui apoio a Dilma no Congresso

 

Por Raymundo Costa | De Brasília

 

Jin Lee/BloombergTemer: aumento da tensão dificulta missão do novo coordenador político

A mudança radical no núcleo da coordenação política do Palácio do Planalto, tirada do PT e entregue ao PMDB, pode ser a última e desesperada cartada do governo Dilma Rousseff para tentar domar um Congresso que se mostra mais hostil a cada ano de mandato da presidente da República. Os números não deixam margem a dúvidas. Entre fevereiro de 2011 e dezembro de 2014, o apoio médio a Dilma, na Câmara dos Deputados, foi de 48,19%, resultado inferior à média de apoio que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva teve tanto no seu primeiro mandato (55,75%) quanto no segundo (51,18%).

O panorama é semelhante no Senado, onde a presidente Dilma encontrou uma situação bem mais favorável que seu antecessor, ao assumir o mandato. A média de apoio ao governo no Senado, em 2011, primeiro ano do primeiro mandato de Dilma, foi de 57,87%. A presidente chegou em 2014, último ano do primeiro mandato, com o apoio médio de 55,17%. Mas teve anos piores, como 2013, quando a média da aprovação de matérias de interesse do governo federal bateu em 53,96%.

O Senado Federal parece um território menos hostil à presidente, apesar da oposição do presidente da Casa, Renan Calheiros, e da queda do apoio médio ao governo ao longo dos quatro anos do governo Dilma. "O diálogo com o Senado tende a ser mais facilitado pelo fato de haver menos fragmentação partidária", diz o cientista político Cristiano Noronha, da empresa de consultoria Arko Advice, responsável por um dos mais completos levantamentos sobre o desempenho do governo Dilma no Congresso - os percentuais de apoio referem-se a todo o Congresso, inclui ausências e abstenções e leva em conta tanto os partidos da oposição como os da chamada base aliada.

No primeiro mandato de Dilma, eram 22 os partidos representados na Câmara. Hoje, chegam a 28. No Senado, segundo a Arko Advice, eram 16. A negociação a ser conduzida por Michel Temer, o novo homem forte da política do governo, pode ser facilitada no Senado pelo menor emaranhado das siglas, mas também será difícil, como demonstra a tensão na relação entre Executivo e Legislativo, nos primeiros meses do segundo mandato, e que levou Dilma a entregar a coordenação política ao PMDB.

"No primeiro mandato, Dilma tinha uma expectativa de poder e uma popularidade alta", diz Cristiano Noronha. "Também tínhamos um Congresso mais colaborador com o governo do que o temos hoje". Mesmo assim, destaca o cientista político, "ela teve uma adesão mais modesta que a de Lula". Noronha reconhece rapidamente ritos e símbolos do poder na corte brasiliense: "Sem perspectiva de poder, com popularidade em baixa e um Congresso mais independente, a dificuldade será maior (no segundo mandato). E já estamos vendo isso. Se está assim neste início, imagine-se quando a sucessão entrar para valer na agenda política, a partir de 2017".

 

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Na Câmara dos Deputados, a marca maior de apoio ao governo se deu justamente no primeiro ano de mandato (54,5%). "Nos anos seguintes, ficou em torno de dez pontos abaixo", registra o estudo da Arko Advice. "Essa queda fica também evidente quando se olha a taxa de sucesso do governo em cada ano: em 2011, o governo saiu derrotado em apenas uma das votações analisadas. Em 2012, esse número subiu para 9, em 2012, chegou a 12 e encerrou 2014 com 13 derrotas". Entre outras, o governo perdeu votações relacionadas ao Código Florestal e à distribuição dos royalties do petróleo.

No levantamento específico em relação aos aliados da presidente, o PT foi o partido que apresentou o maior nível de adesão ao governo de Dilma, no primeiro mandato. Mas o resultado é inferior ao verificado nos dois mandatos de Lula. Em segundo lugar está o PCdoB, com 63,48%, seguido do PDT (55,60%). "O PMDB ficou com 52,89%, percentual similar ao do primeiro mandato de Lula", diz o estudo.

A Arko Advice, porém, registra que no "primeiro ano desse mandato de Lula o PMDB não participava formalmente do governo. Hoje, o PMDB tem a vice-Presidência da República". Entre os aliados, o mais infiel é o donatário do Ministério dos Transportes, no governo Dilma - o PR (47,97%). "No primeiro mandato do ex-presidente Lula, a legenda mais alinhada com o Planalto foi o PT (77,58%); no segundo mandato, o posto foi assumido pelo PCdoB (78,92%)".

É interessante a comparação do desempenho dos governos Lula e Dilma no Senado. O ex-presidente, como se recorda, enfrentou grandes dificuldades entre os senadores, a ponto de se dedicar, na eleição de 2010, a eleger uma bancada mais confortável para Dilma. "Lula teve dificuldade para aprovar projetos no Senado durante os seus dois mandatos em virtude de um equilíbrio de forças entre governo e oposição", destaca a Arko. "Em média, sua base era formada por 50 senadores. Os demais eram classificados como oposição ou independentes". Na votação da CPMF, quando o governo teve 45 votos favoráveis (eram necessários pelo menos 49), "ficou evidente com quem realmente o governo poderia contar no Senado".

Já a "presidente Dilma Rousseff teve um cenário mais favorável. Sua base era formada por 61 senadores. A oposição somava 16 votos e cinco se classificavam como independentes". A média de apoio aos projetos de interesse do governo, consequentemente, também foi maior (56,64%). Um resultado bem mais expressivo que os 48,66% verificados no segundo mandato de Lula. "Apesar de o melhor resultado ter sido verificado no primeiro semestre do ano, o percentual esconde uma informação importante. Enquanto em 2011 aconteceram 44 votações relevantes de interesse do Poder Executivo, em 2014 foram apenas 16, muitas das quais eram matérias sem muita resistência entre os senadores, como a Proposta de Emenda à Constituição que prorrogou os benefícios da Zona Franca de Manaus por mais 50 anos".

Matérias polêmicas também foram adiadas e migraram do primeiro para o segundo mandato da presidente Dilma, caso do projeto que muda o indexador da dívida dos Estados e municípios com a União e daquele que trata do fim da guerra fiscal entre os Estados. São propostas que estão na ordem do dia do Congresso. O projeto sobre a renegociação da dívida de Estados e municípios avançou e talvez já nesta semana haja decisão sobre a votação. O desafio da presidente e de sua nova coordenação política é o de tentar inverter a tendência de o governo perder ainda mais apoio à medida que se aproxima do fim e que a perspectiva de poder mude de endereço.