Título: Três perguntas para Jorge Kalil
Autor: Cotta, Carolina
Fonte: Correio Braziliense, 06/08/2011, Ciência, p. 28

Professor da Faculdade de Medicina da USP, diretor do laboratório de imunologia do Instituto do Coração (Incor) e diretor do Instituto Butantan

O Brasil tem muita pesquisa básica, mas apenas cerca de 300 patentes, contra mais de 45 mil dos Estados Unidos. Por que o processo é tão complicado por aqui? Trata-se de um problema cultural, de base. Nos EUA, ao se descobrir algo, pede-se uma patente. No Brasil, não temos essa cultura, nem estamos preparados para isso. A Lei das Patentes veio só em 1996. Não há estrutura de patentes em todos os institutos de pesquisa. O pesquisador quer publicar logo o seu trabalho e demora para conseguir a patente, em um longo e burocratizado processo. Nossa pesquisa básica cresceu muito, proporcionalmente à de outros países. Há 20 anos, era menos de 0,5%, e hoje estamos chegando a 3%. Não há, entretanto, contrapartida no número de patentes para ganharmos em competição internacional. E não adianta só fazer a patente. O grande problema é licenciar para alguém desenvolver.

O desenvolvimento de novos medicamentos nos países de primeiro mundo é feito em esfera industrial e, no Brasil, em nível universitário. O que é necessário para atuarmos mais? As empresas brasileiras são de cópia. Copiam genéricos, aquilo que já existe no exterior. Só mais recentemente começaram a investir em inovação. Os produtos vendidos pela indústria brasileira são commodities. Um único produto de patente de uma multinacional vende cinco vezes o que vende toda uma indústria nacional grande. Existe muito valor agregado quando há propriedade intelectual por trás e os outros laboratórios não podem comercializar. Precisamos fazer com que nossa pesquisa se transforme em patentes e facilitar que as indústrias as absorvam.

Qual é o impacto de a grande indústria farmacêutica estar comprando nossos laboratórios de genéricos? Acho muito perigoso. Nossa chance de desenvolver medicamentos novos era que a indústria de genéricos se capitalizasse e fizesse investimentos em pesquisa. Com isso, vamos matar esse mercado incipiente. Apesar de o fato de fazer genéricos não ser inovação, seria o princípio para um desenvolvimento de ponta.