Valor econômico, v. 15, n. 3743, 25/04/2015. Empresas, p. B5

 

Incertezas marcam plano de venda de ativos da Petrobras

 

Por Cláudia Schüffner | Do Rio

 

Ana Paula Paiva / ValorPaula, do Itaú BBA, avalia que faz mais sentido vender áreas onde não começaram a fase de desenvolvimento da produção

A esperada venda de ativos da Petrobras ainda está cercada de indefinições. A estatal anunciou um programa de venda de ativos de US$ 13,7 bilhões, dos quais US$ 3 bilhões a serem obtidos este ano, mas a decisão chega em um momento de restrições de liquidez no mercado mundial de óleo em gás em função da queda dos preços do petróleo no mercado internacional. Com menos geração de caixa, a tendência é de fusões e aquisições como a da BG pela Royal Dutch Shell, ao invés de uma temporada de compras.

Já no Brasil, os efeitos econômicos da Operação Lava-Jato, que levou a Petrobras a colocar 27 grandes empresas fornecedoras na lista de bloqueio cautelar, não leva a grandes apostas de que os ativos tenham compradores dispostos a pagar o valor que a Petrobras estará pedindo.

Os analistas do HSBC lembram que em reação à queda de 50% dos preços do petróleo, nos últimos meses, as petrolíferas cortaram em 30%, em média, os investimentos previstos para 2015. "Para nós isso destaca que o apetite por risco foi dramaticamente reduzido, o que tende a diminuir o preço e apelo dos ativos de exploração e produção da Petrobras", informa o HSBC.

Essa avaliação é compartilhada por outros agentes do mercado. O que se prevê é que a estatal terá mais facilidade de vender ativos de grande porte, no pré-sal ou campos maiores do pós-sal, desde que aceite abrir mão da operação. Contudo esse não é o histórico da companhia, que tem perfil monopolista. Ainda não existe uma lista de ativos conhecida, apesar de vários bancos terem recebido mandatos da Petrobras. Os bancos que estariam envolvidos são muitos: Bradesco, Santander, Citigroup, BNP Paribas, Itaú BBA, Bank of America.

A companhia já anunciou que vai oferecer campos de petróleo já em produção, blocos exploratórios, termelétricas, participações acionárias em distribuidoras estaduais de gás e gasodutos reunidos na Transportadora Associada de Gás (TAG).

Para a BR Distribuidora, que tem a maior participação no mercado de distribuição de combustíveis do país, a expectativa é que a Petrobras possa fazer uma oferta pública, nos moldes do que foi feito na Brasil Seguridade. Em entrevista ao Valor na semana passada, o presidente da Petrobras, Aldemir Bendine, disse que a ideia é "compartilhar risco e capital".

O executivo de uma grande empresa afirmou que a estatal ainda não sabe o que quer vender e nem o modelo. "No caso das térmicas, eles querem continuar acionistas majoritários tendo apenas um sócio investidor", disse. Segundo a fonte, a Petrobras não garante a oferta de gás para todos os compradores e ele observa que quem compra uma térmica a gás quer garantia de suprimento do combustível. "Eles estão sinalizando com um arrendamento, em que a Petrobras continua operando e paga aluguel para o comprador."

Os bancos que estão assessorando a Petrobras, diz a fonte, aguardam uma maior definição dentro de três a quatro semanas. Entre os interessados nos ativos de geração estariam a Cemig, GDF Suez e EDF, enquanto a Mitsui quer ao menos "olhar" as distribuidoras de gás.

Se aceitar vender a operação de campos de petróleo e gás de maior porte, é possível que o negócio chame a atenção das grandes empresas do setor, como a Exxon, Chevron, Total e Repsol que no Brasil é sócia da chinesa Sinopec.

Outras chinesas que mostraram no passado apetite pelo Brasil são a Sinochem, CNOOC e CNPC. As duas últimas são sócias da Petrobras no campo de Libra, o primeiro leiloado em partilha de produção, e a Sinochem é sócia da Statoil no campo de Peregrino. Já para ativos de menor porte, em terra ou águas rasas, a lista de potenciais interessados é menor.

Além do risco de esbarrar em questões relacionadas à operação das áreas, as regras de conteúdo local podem ser vistas como um problema para os potenciais compradores. Isso porque alguns dos campos da Petrobras, notadamente os do pré-sal, têm compromisso com conteúdo local elevado, de até 65%.

O percentual já era elevado para os padrões internacionais e agora a situação é mais crítica porque várias fornecedoras tradicionais da Petrobras estão proibidas de fazer negócios com ela. Alguns são processadas pelo Ministério Público Federal e outras negociam acordos de leniência com a Controladoria Geral da União (CGU). Isso sem contar as que entraram em recuperação judicial, como Schahin, OAS e Alumini.

Alterar o conteúdo local, contudo, é uma questão complexa que precisa ser levada ao governo. O compromisso com aquisição de bens e serviços produzidos no Brasil é firmado nos contratos de concessão assinados com a Agência Nacional do Petróleo (ANP).

O time de analistas do Itaú BBA, liderado por Paula Kovarsky, observou na semana passada que faria mais sentido para a Petrobras vender áreas descobertas que ainda não começaram a fase de desenvolvimento da produção, transferindo a operação para os parceiros. O operador de um consórcio pode liderar as decisões de investimento, a engenharia da exploração e aquisição de equipamentos. "No nosso ponto de vista, a [transferência da] operação aumentaria a atratividade para os grandes 'players' internacionais, possivelmente permitindo a aceleração do desenvolvimento [dessas áreas]", avalia o Itaú BBA.