Supremo autoriza buscas em gabinete de Eduardo Cunha

Talita Fernandes

 

O ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal, autorizou esta semana que um oficial de Justiça fosse ao gabinete do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), para apreender um documento que pode trazer novos indícios de que o parlamentar foi beneficiado com recursos desviados da Petrobrás. A autorização é parte das diligências solicitadas pela Procuradoria-Geral da República. Cunha está entre os 50 investigados pela Procuradoria com inquéritos abertos no Supremo. 

Pessoas próximas às investigações informaram ao Estado que um oficial foi destacado na segunda para cumprir o pedido no gabinete do deputado. A autorização foi assinada por Zavascki, que é relator da Lava Jato no STF, após pedido do procurador-geral da República, Rodrigo Janot. 

 

O presidente da Câmara, Eduardo Cunha

O presidente da Câmara, Eduardo Cunha

 

O que fundamenta o pedido é o fato de a Procuradoria ter tomado conhecimento da existência de um documento no gabinete de Cunha que poderia comprovar que partiu dele a participação em dois requerimentos que podem reforçar indícios contra o presidente da Câmara. 

Procurada, a assessoria da presidência da Casa nega que um oficial de Justiça tenha estado no gabinete para cumprir a ordem de apreensão. 

Os dois requerimentos foram feitos na Câmara em 2011 e oficialmente são de autoria da ex-deputada federal Solange Almeida (PMDB-RJ), hoje prefeita da cidade de Rio Bonito, no Estado do Rio de Janeiro. 

Investigadores suspeitam que as representações tenham sido arquitetadas por Cunha, com base em depoimento do doleiro Alberto Youssef, um dos delatores da Lava Jato. 

De acordo com o delator, o presidente da Câmara seria um dos beneficiários das propinas vindas do esquema envolvendo um contrato de aluguel de um navio-plataforma das empresas Samsung e Mitsui. Ele teria encomendado os pedidos de auditoria dos contratos entre Mitsui, Samsung e Petrobrás como uma “ameaça”, após o pagamento de propina ter sido suspenso. 

Cunha tem negado qualquer relação com o esquema de corrupção e desvios investigados pela Lava Jato. 

Depoimento. Em depoimento prestado à Polícia Federal, no âmbito das investigações, Solange diz que “não se lembra” das motivações que a fizeram assinar os requerimentos apresentados à comissão – ela afirma que o tema de tal requerimento envolvendo a Petrobrás “não se inseria em suas pautas de atuação parlamentar”. 

Disse ainda que “suas pautas principais eram a saúde pública, havendo fundado a frente parlamentar em defesa dos hospitais universitários”. 

A prefeita de Rio Bonito nega ainda que Cunha tenha pedido que ela formulasse o requerimento sobre a Petrobrás e diz não se recordar de que o parlamentar tenha falado com algum outro congressista sobre a elaboração do requerimento. 

Prorrogação. Na segunda, o ministro Teori autorizou também a prorrogação da investigação de Cunha por mais 60 dias. A decisão ocorreu logo após Janot ter escrito em parecer encaminhado ao STF que existem “elementos muito fortes” para que o presidente da Câmara seja investigado. A manifestação do procurador aconteceu em resposta ao pedido da defesa de Cunha, de arquivar o processo contra ele. 

Na mesma decisão em que prorrogou o prazo das investigações, Zavascki determinou que tramite em “procedimento autônomo” um pedido do peemedebista para arquivar as investigações. Com isso, é permitido que o plenário do STF julgue o recurso da defesa sem interromper o andamento das investigações. 

 

Doleiro passou nomes para citar em depoimento, diz Careca

 

O agente da Polícia Federal Jayme Alves de Oliveira Filho, o Careca, disse à Justiça Federal no Paraná, base da Operação Lava Jato, que o doleiro Alberto Youssef lhe passou nomes e endereços que deveria citar em seu primeiro depoimento à força-tarefa, em novembro de 2014.

Anteontem, ao ser interrogado pelo juiz Sérgio Moro, o policial contou que o delegado da Polícia Federal Márcio Anselmo lhe disse que se não prestasse nenhuma colaboração "ia ficar preso até o dia da audiência".

Segundo ele, o delegado da Polícia Federal o orientou a falar com o doleiro na Custódia da PF em Curitiba. Ali, os dois, Jayme Careca e Youssef, eram vizinhos de cela.

 

 

 

 

O policial federal Jayme Alves de Oliveira Filho, o Careca, afirmou também no depoimento ao juiz Sérgio Moro que era "apenas um office boy" de Youssef

O policial federal Jayme Alves de Oliveira Filho, o Careca, afirmou também no depoimento ao juiz Sérgio Moro que era "apenas um office boy" de Youssef

 

"Vai que o Alberto (Youssef) vai lhe ajudar a fornecer os nomes. (O delegado) Me forneceu uma carga de caneta e um pedaço de papel. Voltei para a carceragem, no dia seguinte eu ia ser ouvido e assim eu fiz. Fiquei lá, minha cela era ao lado da dele (Youssef), falou endereço tal era fulano, beltrano e tal e eu fui anotando mecanicamente, era tanto, não era tanto...", disse Careca. "Apresentei os nomes que me forneceram, os valores, e passei adiante aquilo."

Em novembro, Careca afirmou ter entregue R$ 1 milhão ao senador Antonio Anastasia (PSDB-MG), a pedido de Youssef. O agente contou ainda ter entregue dinheiro em uma casa, no Rio, que teria como destinatário o presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Na ocasião, por meio de seu advogado, o criminalista Antônio Figueiredo Basto, o doleiro Youssef negou que tivesse mandado entregar R$ 1 milhão para o senador tucano.

Anastasia e Cunha são investigados em inquéritos que tramitam no Supremo Tribunal Federal. Eles rechaçam qualquer relação com o esquema de corrupção na Petrobrás.

Perante à Justiça Federal no Paraná, em depoimento prestado segunda-feira, Careca não citou nomes de parlamentares. Ele voltou a dizer que não sabia a identidade das pessoas a quem entregava "pacotes" por ordem de Youssef.

'Office boy'. O policial federal afirmou também no depoimento ao juiz Sérgio Moro que era "apenas um office boy" de Youssef. Careca é acusado de ser "entregador de malas de dinheiro" a políticos por ordem do doleiro. Ele teria realizado pelo menos 31 entregas em espécie.

Conforme a contabilidade do doleiro, o policial entregou cerca de R$ 13 milhões, além de US$ 900 mil e mais 365 mil. Segundo Careca, Youssef lhe pagava entre R$ 1 mil e R$ 1,5 mil por serviço.

 

Para Costa, 'gênese' dos desvios na estatal são os 'maus políticos'

 

Em seu quarto depoimento em comissões parlamentares para explicar o esquema de corrupção na Petrobrás, o ex-diretor de Abastecimento Paulo Roberto Costa disse nesta terça-feira, 05, que a "gênese" dos desvios está "em Brasília" e não na estatal. Em mais de cinco horas de depoimento, Costa disse que "maus políticos" são responsáveis pelo esquema e que doações oficiais de campanha também são fruto de propina, pois "não existe empresa inocente". O depoimento não havia terminado até a conclusão desta edição.

"Isso aconteceu por atitude de maus políticos. A gênese foi aqui em Brasília. A origem não foi na Petrobrás. A origem veio aqui em Brasília", afirmou Costa, que negou que a corrupção na estatal fosse "institucionalizada", como afirma o ex-gerente da estatal Pedro Barusco.
 
Costa pôs em dúvida as doações eleitorais feitas por empresas. "Não existe doação de empresas que depois essas empresas não queiram recuperar o que foi doado. Se ele doa R$ 5 milhões, ele vai querer recuperar na frente R$ 20 milhões', disse o ex-diretor. "Os valores, sejam valores de doações oficiais ou não, têm restrições. Algumas empresas me falaram isso e agora, nas delações, isso está ficando claro. Não existe almoço de graça". Costa defendeu que os "maus políticos" também sejam punidos.
 
Costa é acusado de intermediar negócios entre a Petrobrás e empreiteiras, recolhendo propinas e distribuindo o dinheiro a partidos políticos. Ele disse ter recebido recursos de todas as empreiteiras que compunham o cartel que assinava contratos com a estatal. O grupo, segundo Costa, era liderado pelas empresas UTC e Odebrecht.
 
Se dizendo arrependido, Paulo Roberto Costa citou uma série de políticos de PT, PSDB, PP e PMDB. Mencionou os já falecidos ex-governador Eduardo Campos (PSB-PE), ex-senador Sérgio Guerra e ex-deputado José Janene (PP-PR). Costa afirmou conhecer e ter mantido contados no âmbito do esquema de corrupção com nomes como Renan Calheiros (PMDB-AL), presidente do Senado, mas negou envolvimento com o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).
 
O ex-diretor reafirmou aos parlamentares ter recebido do ex-ministro Antonio Palocci pedido de contribuição de R$ 2 milhões para a campanha presidencial de Dilma Rousseff em 2010. Reafirmou também ter se reunido ao menos três vezes, entre 2009 e 2010, com Sérgio Guerra e com o líder do PP na Câmara, Eduardo da Fonte (PE), para que pagasse R$ 10 milhões pelo adiamento de uma CPI para investigar a estatal.
 
Política de preços. Segundo Costa, os malfeitos identificados pela Operação Lava Jato representam "apenas 10% do rombo" total da empresa. Segundo ele, a política de defasagem de preços de derivados de petróleo foi o principal fator de prejuízo da empresa. "O governo manteve os preços congelados e arrebentou com a empresa". "O maior problema é a gestão que fazem na companhia, a gestão política. Lava Jato é 10% do rombo da Petrobrás".
 
Paulo Roberto Costa disse ter solicitado algumas vezes ao então presidente do Conselho de Administração da Petrobrás, o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega, o aumento dos preços dos combustíveis, mas não foi atendido. "Ele, como presidente do Conselho, tinha poder para negar. (...) O ministro Mantega estava representando o governo naquele momento", afirmou o ex-diretor, que fez delação premiada e cumpre prisão domiciliar, após seis meses preso. 
 
Contratos. Sobre a compra da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos, Costa disse que a presidente Dilma Rousseff, que na época presidia o colegiado, sabia de todos os negócios aprovados, mas evitou imputar culpa diretamente a ela. "A responsabilidade (pelo negócio) não é só da presidente do Conselho, é de todos os conselheiros. O Conselho foi responsável", respondeu. No entanto, questionado se a compra teria sido aprovada pelo Conselho caso a presidente se dissesse contrária, ele respondeu: "Não".
 
Já sobre os milionários aditivos contratuais como os da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, Costa afirmou que eles não eram de responsabilidade de apenas um diretor. "Todos os aditivos foram aprovados pela diretoria-executiva da Petrobrás, então responsabilizem toda a diretoria e o presidente da Petrobrás". Segundo o ex-diretor, também houve pagamento de propina nesses aditivos.
 
Lula. Os deputados Onyx Lorenzoni (DEM-RS) e Efraim Filho (DEM-PB) apresentaram requerimento para convocar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva à CPI. Os deputados alegam que tanto o ex-presidente como sua sucessora, Dilma Rousseff, tiveram condições "de adotar medidas concretas no sentido de estancar a série de desvios de vultosas quantias que estavam ocorrendo no seio da Petrobras". Após protocolado, o requerimento precisa ser pautado e aprovado pelos membros da comissão. A próxima reunião deliberativa será nesta quinta-feira, 7.
 
Costa negou que tenha conversado sobre o esquema com Lula ou Dilma. O ex-diretor admitiu ter sido convidado para o casamento da filha da presidente, mas não informou o presente que deu.