Valor econômico, v. 15, n. 3744, 28/04/2015. Política, p. A9

 

Dilma mobiliza aliados para reincluir estatais na terceirização

 

Por Raphael Di Cunto | De Brasília

 

Pedro Ladeira/Folhapress - 8/4/2015Arthur Maia: "É muito injusto excluir a Petrobras desta lei, enquanto outras empresas de petróleo não têm estas amarras"

Com medo de que as empresas públicas e sociedades de economia mista percam competitividade frente às companhias privadas com a regulamentação da contratação de serviços terceirizados, a presidente Dilma Rousseff deve mobilizar sua base aliada no Senado Federal para reincluir as estatais, retiradas do projeto por destaque do PSDB.

Sem a inclusão no projeto, as regras para a contratação de serviços por empresas estatais como a Petrobras, Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil (BB) continuam as previstas em súmula do Tribunal Superior do Trabalho (TST) que proíbe a terceirização da atividade-fim (aquela que caracteriza a atividade principal da companhia).

A jurisprudência é contestada por empresários no Supremo Tribunal Federal (STF) com placar amplamente desfavorável ao TST - seis votos a zero, de 11 possíveis. Se a súmula cair, não haveria nenhuma regulamentação para a contratação de mão de obra terceirizada por empresas públicas e sociedades de economias mistas, além de suas subsidiárias e controladas. já que PL trata apenas das empresas privadas. Dos 446 mil funcionários da Petrobras, 360 mil são terceirizados.

A preocupação com a exclusão das estatais, como revelou na quinta-feira o Valor PRO, serviço de tempo real do Valor, foi externada por Dilma em jantar com o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que relatou a história a pelo menos dois aliados durante a negociação de emendas ao texto.

Segundo estes relatos, Dilma perguntou a Cunha sobre detalhes da proposta, cuja votação ainda não tinha sido concluída pelos deputados, e questionou se não havia alguma forma de reincluir as empresas públicas e sociedades de economia mista no projeto, que ela considerava um erro deixar de fora. Cunha informou à Dilma que, como a Câmara já tinha deliberado sobre este tema, a mudança só poderia ocorrer no Senado.

O relator do projeto na Câmara, deputado Arthur Maia (SD-BA), diz que o governo tinha lhe pedido em 2012 para incluir as estatais no texto e que estranhou o voto do PT pela retirada. "Essas empresas disputam espaço com empresas privadas que têm todas as vantagens da lei e precisam da terceirização para poder competir em igualdade de condições no mercado", afirma. "É muito injusto excluir a Petrobras desta lei, enquanto outras empresas de petróleo não têm estas amarras."

Ao retirar as empresas públicas e sociedades de economia mista do projeto a oposição visava evitar que fosse possível contratar terceirizadas para as atividades principais do governo (também foram excluídas a administração direta e indireta) e de empresas como a Petrobras, o que acabaria com os concursos públicos e aumentaria as indicações políticas nas estatais.

A votação do requerimento do PSDB ocorreu em um ambiente de confusão, em que os líderes partidários, muitos dos quais assumiram a função pela primeira vez na nova legislatura, a menos de dois meses, se confundiram ao orientarem as bancadas. O destaque supressivo usado pelos tucanos serve para retirar um artigo do projeto, mas quem é a favor da exclusão do texto deve votar "não" ao requerimento.

Seis líderes da grandes partidos mudaram a orientação do voto das bancadas ao longo da discussão, em que o presidente da Câmara teve que corrigir por três vezes deputados que anunciavam ser favoráveis à manutenção do texto, mas orientavam a opção errada. O artigo foi suprimido por 360 votos a 47, votação que uniu PSDB e PT. O líder do governo, José Guimarães (PT-CE), liberou a base aliada.

Dias depois, a Câmara aprovou emenda para que os trabalhadores terceirizados que prestarem serviços para a administração pública indireta tenham os mesmos direitos previstos no projeto, mas deputados avaliam que este trecho não ficou claro e, além de não prever os deveres das contratantes, como fiscalizar pagamento de encargos trabalhistas, pode gerar disputas jurídicas.

A posição do governo favorável à reinclusão das empresas públicas e sociedades de economia mista no texto deve contrastar com a postura do PT e do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva de pedirem à Dilma o veto à terceirização ampla e irrestrita e de obstruírem a votação da proposta no Senado, onde contam com apoio do presidente, Renan Calheiros (PMDB-AL), para deixar o projeto parado.

Ontem, a presidente comentou o projeto de lei sobre a terceirização da mão de obra que tramita no Congresso Nacional, ao visitar o município de Xanxerê, no oeste de Santa Catarina. "Existe uma área cinzenta que precisa ser regulamentada, mas isso não pode significar a perda de direitos dos trabalhadores, nem a perda de impostos", afirmou a presidente, ressaltando que a terceirização precisa ser regulamentada com equilíbrio, "sem eliminar as diferenças entre atividade-fim e atividade-meio".

Questionada sobre a relação entre o governo e a base aliada no Congresso, a presidente Dilma minimizou as críticas de que seria refém do PMDB e disse que é normal a existência de conflitos e posições políticas distintas entre partidos diferentes. "O PMDB integra o meu governo e essa unidade tem como base a diversidade", disse.

As cidades de Xanxerê e Ponte Serrada, no oeste de Santa Catarina, foram atingidas por um tornado no dia 20. Em visita a Xanxerê, a presidente anunciou a liberação de R$ 5,8 milhões em caráter emergencial para atender as vítimas do tornado.(Colaborou Dauro Veras, especial para o "Valor", de Xanxerê - SC)