Valor econômico, v. 15, n. 3744, 28/04/2015. Legislação e Tributos, p. E1

 

 

STF julgará incidência de IR sobre juros de mora

 

Por Beatriz Olivon | De Brasília

O Supremo Tribunal Federal (STF) vai analisar a incidência de Imposto de Renda (IR) sobre juros de mora incidentes sobre verbas salariais e previdenciárias pagas em atraso. Os ministros reconheceram recentemente a repercussão geral do tema, que continua na pauta do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

No caso que será julgado pelo STF, um médico contratado como celetista por um hospital em Porto Alegre (RS) firmou um acordo na Justiça do Trabalho para receber parcelas salariais que não haviam sido pagas. Ao constatar a incidência do Imposto de Renda, o médico entrou com uma nova ação para questioná-la.

No STF, o relator do processo é o ministro Dias Toffoli. Ele explicou que o STF havia declarado inexistência de repercussão geral em um agravo de instrumento que trata dessa mesma matéria, considerando a discussão infraconstitucional. E que agora aplicou entendimento firmado pela Corte em questão de ordem - de que mesmo diante de uma anterior negativa de repercussão geral, a declaração de inconstitucionalidade de norma por Tribunal Regional Federal (TRF) constitui circunstância nova suficiente para justificar o caráter constitucional de matéria e o reconhecimento da repercussão geral.

No caso, o TRF da 4ª Região considerou inconstitucionais os dispositivos legais que classificam como rendimentos de trabalho assalariado os juros de mora e outras indenizações pagas pelo atraso no pagamento de remuneração salarial. A União recorreu da decisão argumentando que o TRF decidiu em desacordo com a interpretação dada pelo STJ em julgamento de recurso repetitivo.

Em 2011, a 1ª Seção do STJ julgou um repetitivo e decidiu, de forma ampla, que não incidiria IR sobre juros de mora de ações trabalhistas. Por não ter delimitado a natureza da discussão - indenizatória ou remuneratória -, advogados consideraram que a decisão englobaria todas as verbas.

O entendimento foi questionado pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN). A partir do recurso da Fazenda, o STJ esclareceu que a isenção só seria válida para verbas trabalhistas indenizatórias - abono de férias e aviso prévio, por exemplo - decorrente de condenação judicial.

Mas ao analisar um novo caso sobre o mesmo assunto, no fim de 2012, a 1ª Seção estabeleceu que os juros de mora são tributados, exceto quando o funcionário é demitido ou quando a verba recebida na rescisão do contrato de trabalho é isenta do IR, como o FGTS. Ainda está pendente, porém, o julgamento de um outro recurso repetitivo sobre o tema.

"O Supremo vai decidir se no conceito constitucional de renda existe ou não a necessidade de tributar esse tipo de juros. O STJ deu a decisão à luz do Código Tributário Nacional e de legislação específica. O STF vai analisar com base na Constituição", explica Fábio Pallaretti Calcini, do escritório Brasil Salomão & Matthes Advocacia.

Justiça é contrária a empresas em disputas sobre IR

 

Por Adriana Aguiar | De São Paulo

 

Aline Massuca/ValorJanssen Murayama: tribunais mais benevolentes nas discussões de pessoas físicas

Os tribunais superiores, na análise de temas sobre a cobrança do Imposto de Renda (IR), têm sido mais simpáticos às teses de pessoas físicas do que das empresas. A constatação é de um levantamento do escritório Murayama Advogados, que elencou as dez principais discussões sobre o tema no Judiciário - metade de pessoas físicas e a outra de pessoas jurídicas, julgados entre 2007 e 2014.

Os tribunais foram desfavoráveis às empresas em todos os casos. Nas discussões sobre pessoas físicas, das cinco teses consideradas de maior impacto, quatro foram aceitas. O levantamento não considerou discussões que podem ser aplicadas tanto às pessoas físicas quanto jurídicas e julgamentos ainda não concluídos.

O advogado Janssen Murayama, que coordenou o levantamento, afirma que os tribunais costumam ser mais benevolentes nas discussões que envolvem pessoas físicas, do que das pessoas jurídicas.

Entre as teses que as companhias perderam está a discussão, definida pelo Pleno do Supremo Tribunal federal (STF) em 2013, com repercussão geral, na qual os ministros entenderam ser constitucional a Lei nº 9.316, de 1996, que proíbe a dedução do valor da CSLL, para fins de apuração do lucro real, da base de cálculo do IR.

Outro tema em que as empresas saíram derrotadas é a limitação da compensação de prejuízos fiscais. O caso foi analisado pelo Pleno do STF, mas deve voltar a ser discutido em repercussão geral. Por ora, o que prevalece é a constitucionalidade da Lei nº 8.981, de 1995, que vetou a compensação superior a 30% de créditos decorrentes de prejuízo fiscal no cálculo do IRPJ e CSLL.

Em 2009, o STF ainda entendeu que as empresas não podem compensar prejuízos fiscais acumulados em exercícios anteriores à publicação da Lei nº 8.981.

Em outra discussão, a 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) pacificou em 2009 a legalidade da tributação isolada e autônoma do Imposto de Renda sobre os rendimentos das pessoas jurídicas em aplicações financeiras de renda fixa e sobre ganhos líquidos em operações nas bolsas de valores. No julgado, os ministros entenderam que as empresas estão sujeitas ao pagamento do IR mesmo que, no geral, tenha sofrido prejuízos, sendo proibida a compensação.

Em outro exemplo, a 2ª Turma do STF entendeu em 2012 que benefícios fiscais de Imposto de Renda podem ser alterados a qualquer momento.

Com relação às teses bem-sucedidas das pessoa física está a definição pelo STJ, em 2008, que resultou no Enunciado 498, segundo o qual não incide IR nas indenizações por danos morais. Os contribuintes também conseguiram o direito de não pagar IR sobre os juros de mora em reclamações trabalhistas. A decisão em recurso repetitivo, de 2011, é da 1ª Seção.

Em outubro de 2014, as pessoas físicas ainda ganharam uma importante disputa no Supremo. Os ministros decidiram que, ao receberem valores decorrentes de demandas trabalhistas ou previdenciárias, as pessoas físicas devem aplicar as alíquotas do IR vigentes na época em que as verbas deveriam ter sido pagas. O assunto é de grande impacto econômico, e de acordo com o presidente do tribunal, ministro Ricardo Lewandowski, atinge mais de nove mil casos.

A 1ª Seção do STJ ainda entendeu, em 2007, que se houver retenção de Imposto de Renda na fonte pagadora está excluída a responsabilidade da pessoa física que recebeu valores com desconto do tributo. "Esse posicionamento já tem sido aplicado até mesmo pela Receita Federal, razão pela qual existem poucos debates sobre o assunto atualmente", diz Murayama.

O único tema desfavorável às pessoas físicas foi confirmado pela 1ª Seção do STJ em 2014. Os ministros entenderam que a ausência de recolhimento do IR pela fonte pagadora não exclui a responsabilidade do contribuinte pelo pagamento do tributo. "Apesar de a decisão ter sido desfavorável, ela é justa, pois a fonte pagadora não fez a retenção e, caso o contribuinte não fosse responsável, não se pagaria nada", afirma Murayama.

Para o tributarista Eduardo Kiralyhegy, do escritório Negreiro, Medeiros & Kiralyhegy Advogados, é difícil fazer um comparativo entre vitórias e derrotas de pessoa física e jurídica pois muitas vezes são discussões diferentes. "Além disso, como são muitos temas, discussões importantes podem ficar de fora", diz. Contudo, o advogado afirma que "a sensação é que existe um senso de justiça um pouco maior quando há pessoa física".

Já Adolpho Bergamini, sócio do Bergamini e Collucci Advogados, ressalta que não se pode deixar de considerar que o STF, ao analisar a tributação do lucro de controladas e coligadas no exterior, foi favorável às empresas, no caso das coligadas onde o lucro somente será tributado quando reconhecido pela empresa brasileira.

Ele ressalta que o STJ, em 2009, autorizou o pagamento de juros sobre capital próprio retroativo aos contribuintes. "Dito de outro modo, não me parece que o Judiciário tenha atitude tendenciosa. O ganho de causa dos contribuintes não está vinculado ao fato deste ou daquele ser pessoa jurídica ou física, mas sim ao próprio direito discutido."