Projeto sobre redução de maioridade é atenuada

Correio braziliense, n. 19007, 10/06/2015. Política, p. 2

André Shalders

Julia Chaib

O relator da PEC da Maioridade Penal, deputado Laerte Bessa (PR-DF), apresentará hoje em seu relatório uma versão atenuada da proposta original. O texto de cerca de 40 páginas mantém a redução da idade penal para 16 anos em todos os crimes, mas propõe que os menores de 18 anos cumpram pena em unidades diferentes dos estabelecimentos dos maiores. Mesmo com a alteração, o texto sofrerá oposição do governo e da bancada do PT, contrários à redução, e também do PSDB, que defende a mudança apenas em casos de crimes de sangue e hediondos. Desde a semana passada, o governo procura lideranças do PSDB na tentativa de construir um consenso no tema, que evite a alteração constitucional. A expectativa é de um dia tenso na Comissão Especial que analisa o tema. As mudanças no relatório de Bessa foram antecipadas pela coluna Eixo Capital, no site do Correio.

Ontem à tarde, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), se reuniu com o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, para tratar do tema. E hoje Cardozo se encontra com o senador tucano José Serra (SP). Os dois parlamentares tucanos são autores de propostas sobre o tema. Na noite de ontem, Cardozo também discutiu a redução da maioridade com o vice-presidente da República, Michel Temer, e com outros líderes da base. “A reunião tinha opiniões favoráveis e contrárias. Portanto, o espírito é de entendimento. É uma questão que diz respeito fundamentalmente à sociedade brasileira, precisamos ter cautela e vamos buscar o entendimento, inclusive com o presidente (Eduardo) Cunha, de hoje para amanhã”, disse o líder do governo, José Guimarães (PT-CE), depois do encontro.



Em Brasília, Alckmin participou de reunião da bancada tucana na Câmara, em companhia do líder, Carlos Sampaio (SP), e do presidente do PSDB, senador Aécio Neves (MG). O partido decidiu apoiar a proposta formulada pelo senador Aloysio Nunes (SP), que prevê a redução para 16 anos em casos de crime hediondo e de sangue. Para que o menor possa cumprir pena como adulto, o Ministério Público terá de formular pedido nesse sentido, que será analisado pelo juiz do caso. Além disso, os tucanos defenderão como medidas complementares às formuladas por Alckmin e Aécio. A proposta do mineiro consiste em ampliar dos atuais quatro anos para 12 anos a pena de quem usa menores para cometer crimes. E a de Alckmin prevê a ampliação da pena máxima do ECA, dos atuais três anos para oito anos.

Falando sobre a proposta de Alckmin, Cardozo indicou ontem que não concorda com o aumento da pena para todo e qualquer crime hediondo. O ministro é contra aumentar o tempo de internação para o caso do tráfico de drogas, por exemplo. Cardozo disse ainda que há a possibilidade de a proposta do governo ser encaminhada na forma de emendas aos projetos dos tucanos. “Depende do nível de consenso e diálogo que for colocado. Vamos imaginar que consigamos avançar numa discussão em relação ao projeto de lei do senador José Serra. Se houver entendimento, por que não somarmos as nossas forças?”

“Existem hoje dois campos políticos que já se manifestaram. Um que é a favor da redução linear da maioridade para 16 anos. Nós não somos a favor dessa proposta. E um outro que quer manter as coisas exatamente como estão. O que defendemos é justamente aquilo que nós defendemos durante a campanha eleitoral: a PEC do Aloysio”, disse Aécio.

Tensão
Deputados contrários ao relatório de Bessa anteciparam que tentarão impedir a votação do relatório na tarde de hoje. “Vamos argumentar com o relator para que a comissão tenha mais tempo para discutir. Nós não fizemos nenhuma diligência (visita in loco), por exemplo. Não solicitamos os dados necessários para esse debate”, disse Erika Kokay (PT-DF). Ela também criticou o relatório. “Dizer que vão se construir novos estabelecimentos para esses adolescentes é um engodo, uma farsa. Hoje nós já não conseguimos cumprir a Lei de Execução Penal por falta de infraestrutura”, apontou.



Como vota?
Algumas forças políticas já têm posição definida sobre a redução da maioridade penal. Veja o que cada um defende:

Governo - Desde a semana passada, trabalha na construção de uma proposta alternativa à redução. Projeto poderá prever aumento da pena para maiores que usem menores, segundo ministros

PT - É historicamente contrário à redução, mas boa parte dos parlamentares defenderão proposta intermediária do governo. Há ainda um grupo capitaneado por Maria do Rosário (RS) formulando uma proposta de aumento de tempo de internação conforme a gravidade do delito

PMDB - Maioria dos parlamentares do partido é favorável à redução para 16 anos. Eduardo Cunha, por exemplo, já se pronunciou nesse sentido em várias ocasiões. Há divergências na bancada, como o grupo do deputado Darcísio Perondi (RS)

PSDB - Defenderá proposta de Aloysio Nunes, de redução em caso de crimes hediondos e graves. Defende também outras propostas complementares, como as de Aécio Neves e de Alckmin, mas é contra a redução tal como se encontra na PEC.

PP - Maioria dos parlamentares é favorável à redução da maioridade penal, mas há exceções. Esperidião Amin (SC), por exemplo, defende redução só para homicídios e crimes hediondos

PSB, PCdoB, PPS e PSOL - As bancadas são contrárias à redução da maioridade penal, seguindo diretivas dos partidos.

Situação de pobreza
Relatório da Fundação Abrinq-Save The Children a ser divulgado hoje compila uma série de dados a respeito das crianças e adolescentes que mostram que 20,43 milhões de jovens de até 14 anos, vivem em situação de pobreza — com até um salário mínimo — 45% do total de pessoas nessa situação. Deles, 8,2 milhões são extremamente pobres, 18% da população vivem nessas condições, ou seja, em casas com renda de até meio salário mínimo. Os dados são de 2012. Segundo o estudo, que é uma espécie de “guia de bolso”, 18% das mortes por homicídios foram em pessoas entre zero e 19 anos. O levantamento reúne dados de pesquisas já divulgadas e também traz argumentos contrários à redução da maioridade penal.