O globo, n. 29878, 27/05/2015. País, p. 8

Em derrota de Cunha e do PMDB, deputados rejeitam o distritão

ISABEL BRAGA E JÚNIA GAMA

Proposta de tornar constitucional doação empresarial também não é aprovada

Apesar da pressão do PMDB e do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, sobre partidos pequenos, a mudança no sistema eleitoral com a criação do chamado distritão, que elege os candidatos mais votados independentemente dos partidos, foi derrotada. A proposta teve 210 votos a favor e 267 contra. O PT e o PSDB se uniram contra o distritão. A Câmara também rejeitou o voto em lista e o sistema distrital misto. A votação da reforma política deve continuar hoje na Casa. -BRASÍLIA- Mesmo com fortes ameaças aos deputados de partidos pequenos e médios, o PMDB, capitaneado pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), foi derrotado na noite de ontem na votação do chamado distritão, pelo qual os partidos perderiam força e seriam eleitos os candidatos a deputado mais votados nos estados, independente dos votos que as legendas recebessem. A adoção do sistema tinha como principal defensor, desde 2011, o vice-presidente Michel Temer. Com a derrota, foi mantido pela Câmara o sistema atual de votação, no qual o voto dado a um candidato também ajuda a eleger outros nomes de seu partido ou coligação. Eram necessários 308 votos para aprovar o distritão, mas a proposta recebeu apenas 210 sim; 267 parlamentares votaram contra e cinco se abstiveram. O resultado deixou clara a rejeição da Casa à mudança do sistema eleitoral brasileiro.

AILTON DE FREITASEuforia. Marcelo Castro (ao centro), relator da reforma política destituído por Cunha, comemora a derrota do distritão

Em outra tese de Cunha frustrada, os parlamentares rejeitaram a proposta de tornar constitucional doações de empresas a partidos e candidatos. Já no início da madrugada, a proposta teve maioria de 264 votos, mas não os 308 exigidos para aprovar uma emenda constitucional. Há ainda uma nova chance de os parlamentares aprovarem emenda constitucional prevendo a doação privada apenas para partidos, como indica a proposta do novo relator da matéria, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ).

A doação de empresas a campanhas eleitorais está sendo questionada no Supremo em ação da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). O julgamento foi interrompido, por um pedido de vista do ministro Gilmar Mendes, quando seis ministros já tinham votado a favor do fim da doação de empresas. A intenção dos defensores da emenda é tornar o julgamento sem efeito com a inclusão desse tipo de financiamento na Constituição.

NOVO RELATOR TENTOU APOIO AO DISTRITÃO

Logo após a derrota do distritão ser anunciada, deputados do PT, com plaquinhas, comemoraram gritando: “não, não, não, não ao distritão”.

— A Casa se manifestou, ela não está querendo mudar nada. Nenhuma proposta de acrescer texto à Constituição passou e me parece que nenhuma vai passar — disse Cunha. — Vai cair a máscara daqueles dizem que querem reforma e não votam.

Deputados favoráveis ao distritão tentavam justificar a derrota, alegando que o tema polêmico gerou insegurança entre os parlamentares que preferiram não mudar a regra que os elegeu. Outros fatores, como a disputa contra a postura de Cunha e sua atitude de inviabilizar a votação na comissão especial, expondo o relator destituído da reforma, Marcelo Castro (PMDB-PI), também foram citados.

Na busca de apoio ao distritão, Rodrigo Maia fez concessões e reduziu a exigência da cláusula de desempenho dos partidos. Atraiu o apoio do PCdoB, que votou fechado pelo distritão, e de outras siglas pequenas e médias. A promessa era de que, mesmo em caso de derrota do distritão, não haveria apoio ao fim das coligações, temida por siglas pequenas. Antes do resultado, porém, peemedebistas deixavam claro que traições poderiam resultar em prejuízos para os dissidentes. Segundo parlamentares, o próprio Cunha sinalizou para o baixo clero.

A cláusula de desempenho obriga os partidos a eleger um número mínimo de deputados federais para que a sigla possa ter acesso à verba do Fundo Partidário e ao horário eleitoral gratuito. Como os pequenos partidos têm dúvidas se conseguirão passar essa barreira, tentam evitar a todo custo a aprovação da medida. O líder do PMDB, Leonardo Picciani (RJ), que circulava pelo plenário para angariar votos para o distritão, reforçava a ameaça:

— Eu vou cumprir o acordo, mas a bancada vai olhar a lista. Se não houver cumprimento de um lado, fica difícil cumprir do outro.

Apesar da pressão, 13 deputados do PMDB votaram contra o distritão, e 48 foram favoráveis. A luta contra o distritão mobilizou líderes de vários partidos. O presidente do PSDB, senador Aécio Neves ( MG), favorável ao distrital misto, defendeu posição contra o distritão e enviou mensagem de WhatsApp para os deputados. Acabou virando votos que eram favoráveis à medida. O líder da bancada, Carlos Sampaio (SP), liberou a bancada, que se dividiu, dando 26 votos contra o novo sistema e 21 a favor.

O PT votou fechado contra a mudança no sistema, dando 62 votos contra e apenas uma abstenção — de Weligton Prado (MG), o mesmo que votou contra as medidas do ajuste fiscal. O PSD, de Gilberto Kassab, que de manhã anunciava o voto contra o distritão, também liberou sua bancada, assim como o PROS. Encaminharam a favor, além do PMDB, PP, PTB, PSC, SD, DEM e PCdoB. Contra o distritão, PT, PR, PSB, PRB, PDT, PV, PPS e PSOL.

Antes do distritão, o plenário analisou outros dois sistemas eleitorais: o voto na legenda, com lista de candidatos oferecida pelos partidos recebeu só 21 votos sim. Na segunda votação, o PSDB conseguiu mais adesões para o sistema de voto distrital misto: 99 deputados a favor, mas 369 contra.