CPI da Petrobras pouco esclarece e deputados veem risco de pizza

 

Criada para avançar nas investigações da Operação Lava-Jato, a CPI da Petrobras está longe desse propósito. A um mês de seu encerramento — se não for prorrogada — a comissão sequer ouviu os parlamentares que respondem a inquérito no Supremo Tribunal Federal (STF), não fez acareações entre os delatores envolvidos e virou um palco de bate-boca entre PT e PSDB. O risco de tudo acabar em pizza já está nos discursos dos próprios membros da CPI.

A semana que passou foi pródiga em desperdício de sessões. O maior exemplo de desvio de foco ocorreu quando o presidente da CPI, Hugo Motta (PMDB-PB), lançou a proposta de exumar o corpo do ex-deputado José Janene (PP-PR). A ideia não vingou, diante dos protestos da família de Janene e irritou parlamentares, como Júlio Delgado (PSB-MG), que alertou para o risco de o trabalho da comissão não dar em nada, o que foi citado por outros parlamentares.

DISPENSA DE DEPOIMENTO

Um dia depois, na quinta-feira, o risco de pizza voltou às citações dos parlamentares, que, dessa vez, estavam indignados com a atitude de Motta em dispensar o depoimento do empreiteiro Gerson Almada, ex-vice-presidente da Engevix, investigada na Operação Lava-Jato. Alguns deputados atacaram Motta, que, em resposta, disse que seus críticos buscam o palco político:

— A expressão pizza já está no imaginário das pessoas — discursou João Gualberto (PSDB-BA).

 

CPI encerra seus trabalhos em 25 de junho. Motta antecipou que pedirá ao presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), a prorrogação por mais dois meses. Há 111 requerimentos de convocação aprovados e centenas aguardando na pauta. Ivan Valente (PSOL-SP) dá pouco importância a esse número:

— Não adianta aprovar 300 requerimentos. É preciso ter um roteiro de esclarecimento. Há uma expectativa na sociedade. Pessoas estratégicas para a CPI avançar não estão sendo chamadas — disse Valente.

Motta se incomoda com o risco de a CPI terminar sem uma conclusão e promete indiciar os culpados.

— A CPI não vai acabar em pizza. Reconheço que temos que ter produtividade. Estamos trabalhando muito, igual ou até mais que o plenário. Vamos, no final, indiciar políticos, empreiteiros, ex-diretores da Petrobras e quem mais for necessário — anunciou Motta.

O relator da CPI, Luiz Sérgio (PT-RJ), que fará o parecer indicando indiciamentos ou não, também reagiu às acusações de inação da comissão:

— Tenho certo descontentamento em relação à palavra pizza — disse o relator.

As sessões são marcadas pelas trocas de acusações entre petistas e tucanos.

— O PT obstrui todas as sessões. Assim não anda — irritou-se Izalci (PSDB-DF).

— Se o Corinthians perde, a culpa é do Lula. Se o Palmeiras ganha, é da Dilma. Não dá — reagiu Jorge Solla (PT-BA).

Toda vez que as sessões descambam para o bate-boca, o presidente da CPI lamenta:

— Estou exercitando minha paciência. Quem está vendo em casa, também.

 

No alvo da Lava-Jato, Petrobras triplica as apurações internas

Estatal intensifica investigações e contribui com trabalho da Lava-Jato

POR THIAGO HERDY

SÃO PAULO — Desde o ano passado no centro do escândalo de corrupção desencadeado pelas investigações da Operação Lava-Jato, a Petrobras intensificou a instalação de Comissões Internas de Apuração (CIA), segundo balanço da estatal obtido pelo GLOBO. Em 2014, quando os ex-executivos Paulo Roberto Costa e Pedro Barusco revelaram à Justiça os caminhos da propina na estatal, a Petrobras instaurou 100 procedimentos internos, volume três vezes maior que a média de comissões criadas entre 2000 e 2013: 29 por ano. Os dados foram solicitados por meio da Lei de Acesso à Informação. A empresa preferiu não informar o número de funcionários afastados em função das apurações.

Originalmente, os procedimentos buscam indícios de atos incompatíveis com os regulamentos internos, e não provas de eventuais crimes cometidos por servidor. Do total de comissões instaladas no último ano, 87 foram concluídas até dezembro. Processos dos quatro primeiros meses de 2015 já alcançam a média dos últimos anos: 28 até agora.

SERVIDORES DEPÕEM À JUSTIÇA

Parte do trabalho das comissões tem ajudado os investigadores da Lava-Jato. Servidores responsáveis pelo trabalho têm sido convocados, inclusive, para prestar depoimentos à Justiça. Ao mesmo tempo, entre as investigações concluídas no último ano está a criada para apurar o pagamento de propinas pela SBM Offshore a executivos da Petrobras, que terminou sem que a estatal encontrasse “fatos ou documentos que evidenciassem pagamento de propinas".

Um ex-funcionário da SBM denunciou o pagamento de US$ 139 milhões a executivos entre 2007 e 2011. O ex-gerente da Engenharia da Petrobras Pedro Barusco admitiu ter recebido US$ 22 milhões, mas ainda não se sabe quem recebeu o restante. Além da PF, a Controladoria-Geral da União (CGU) também apura o episódio a a partir de listas de funcionários citados em investigações na Holanda, reveladas pelo GLOBO em dezembro passado.

 

Segundo interlocutores da Petrobras junto a investigadores da Lava-Jato, enquanto a PF avançava na apuração de crimes, novas comissões eram instauradas internamente para apurar desvios de procedimento. Entre os alvos estão contratos relacionados aos maiores projetos da empresa, como o da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco; o do Comperj, no Rio de Janeiro; e o da Refinaria Presidente Getúlio Vargas (Repar), no Paraná.

Três funcionários que atuam na comissão de investigação do caso da Repar prestaram depoimento nesta semana à Justiça do Paraná, onde revelaram irregularidades descobertas na apuração. Entre elas, a inclusão de concorrentes no processo licitatório quando ele já estava em curso e a aprovação de fornecedores que não atendiam a critérios de seleção. Os técnicos identificaram situações em que licitações ocorreram sem que o projeto básico estivesse pronto, abrindo margem para discussões sobre custo e, consequentemente, pagamento de propina.

— Desde o início (da Lava-Jato) a empresa entrega toda as informações solicitadas pela Polícia Federal, porque é vítima e quer colaborar. Antes, isso ocorria nos bastidores. Agora, essa postura está escancarada — conta um dos colaboradores da Petrobras com a Lava-Jato, que pede para não ser identificado.

Para Gilberto Souza Esmeraldo, um dos acionistas minoritários da Petrobras que integra a Associação dos Analistas e Profissionais de Investimentos do Mercado de Capitais (Apimec-Rio), a mudança de postura veio tarde:

— É correta a mudança. Muda a diretoria, muda como lidam com o problema. Mas essa reação demorou muito.