Valor econômico, v. 15, n. 3741, 23/04/2015. Brasil, p. A2
Por Ribamar Oliveira
O governo fez dois movimentos que alteram substancialmente as contas da Previdência Social neste e nos próximos anos. O primeiro foi uma redução expressiva na previsão da receita previdenciária em 2015. O outro foi a adoção de parâmetros macroeconômicos mais realistas - principalmente sobre o crescimento da economia - na avaliação atuarial e financeira do Regime Geral da Previdência Social (RGPS).
Com essas mudanças, o déficit do RGPS cresce no curto e no médio prazo, atingindo 1,14% do Produto Interno Bruto (PIB) neste ano, criando assim dificuldades adicionais para a obtenção da meta de superávit primário. Para 2022, a previsão de déficit de 1,43% do PIB.
Na proposta orçamentária, que o governo encaminhou ao Congresso em agosto passado, a receita previdenciária em 2015 foi estimada em R$ 392,6 bilhões, o que significaria aumento de 16,3% em relação à arrecadação registrada em 2014. Nesse valor está incluída a compensação do Tesouro à Previdência pela perda de arrecadação com a desoneração da folha. As despesas, por sua vez, foram estimadas em R$ 436,3 bilhões, o que resultava em déficit de R$ 43,3 bilhões.
Governo corta estimativa de receita e eleva déficit
Ao fazer novas projeções atuariais e financeiras do RGPS, encaminhadas ao Congresso junto com o projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) para 2016, o Ministério da Previdência Social estimou que a receita neste ano ficará em R$ 365,5 bilhões, o que representa um aumento de 8,3% sobre a arrecadação obtida em 2014 e é mais aderente com os resultados do início deste ano.
Neste valor também está incluída a compensação do Tesouro. As despesas foram estimadas em R$ 432,2 bilhões, o que resulta em déficit de R$ 66,7 bilhões, o equivalente a 1,14% do PIB. Em 2014, o déficit foi de R$ 56,7 bilhões ou 1,03% do PIB.
As novas projeções das despesas foram realizadas considerando os efeitos da Medida Provisória 664/2014, que alteraram as regras de concessão de pensões por morte e de auxílio-doença. O estudo feito pela Previdência adverte que qualquer alteração nas regras estabelecidas na MP, durante as negociações no Congresso, modificará as projeções apresentadas.
A redução na estimativa da receita previdenciária aumenta a dificuldade do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, para alcançar a meta de superávit primário deste ano. A elevação do déficit do RGPS significa mais pressão sobre o Tesouro, que terá que encontrar fontes de recursos para cobrir o rombo.
O déficit previdenciário real é maior, pois os especialistas não consideram no cálculo da receita previdenciária a compensação paga pelo Tesouro, porque a compensação é uma receita da Previdência e uma despesa do Tesouro. Do ponto de vista fiscal, portanto, o resultado é nulo.
Por um lado, Levy empreende luta tenaz para aprovar o projeto de lei que reduz o incentivo fiscal concedido às empresas beneficiadas com a redução da folha. Se o sistema atual for mantido inalterado, o Ministério da Fazenda estima que a renúncia com a desoneração da folha ficará em torno de R$ 25 bilhões neste ano.
Para o ajuste fiscal, o pior dos mundos é o Congresso não aprovar o projeto que reduz a desoneração da folha ou decidir que as novas regras só entrarão em vigor no próximo ano. Se esse cenário ocorrer, Levy terá que encontrar outras fontes de recursos para garantir a meta fiscal de 2015.
O realismo chegou às contas da Previdência Social também porque o governo decidiu abandonar o excesso de otimismo que marcou a gestão passada. As projeções financeiras e atuariais do RGPS feitas em 2014 mostravam trajetória mais benigna do déficit previdenciário, que só alcançaria 1,03% do PIB em 2020. O percentual já foi atingido no ano passado (veja tabela abaixo).
No primeiro mandado da presidente Dilma Rousseff, o governo chegou a comemorar uma trajetória declinante do déficit. Na avaliação financeira e atuarial feita na LDO de 2013, o Ministério da Previdência projetava déficit de 0,86% do PIB naquele ano, de 0,56% do PIB em 2014, 0,37% do PIB em 2016 e de 0,23% do PIB em 2016.
As diferenças nas projeções decorrem, principalmente, da estimativa para o crescimento real do PIB no curto e médio prazo. Na avaliação feita em 2014, o governo utilizou crescimento de 2,5% para o PIB em 2014, 3% para 2015 e 4% para 2016 e 2017. Na avaliação feita agora, o governo adotou números próximos aos usados pelo mercado. Assim, em 2015, o PIB terá encolhimento de 0,92%, e crescimento de 1,3% em 2016, de 1,9% em 2017 e de 2,4% em 2018. A grade de parâmetro foi definida pela Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda no dia 2 de abril.
A avaliação financeira e atuarial mais realista feita pela atual gestão reforça a necessidade de uma reforma previdenciária. Com a MP 664, o governo deu o primeiro passo. Mas certamente ele é insuficiente para evitar a trajetória apontada pela avaliação atuarial e financeira do RGPS, que projeta déficit de 5,96% do PIB em 2050.
Ribamar Oliveira é repórter especial e escreve às quintas-feiras
E-mail: ribamar.oliveira@valor.com.br