O globo, n. 29876, 25/05/2015. Opinião, p. 15

Um encontro para valorizar a ciência

WANDERLEY DE SOUZA Wanderley de Souza é professor da UFRJ
 

O evento nos brindou com a emocionante conferência de Ada Yonath, do Instituto Weizmann de Israel, ganhadora do Prêmio Nobel de Química de 2009

Em um momento em que a ciência é praticada com intensidade crescente, com cerca de dois milhões de artigos publicados em revistas especializadas por ano, é praticamente impossível se manter atualizado. Faço esta introdução para comentar o encontro organizado pela Academia Brasileira de Ciências-ABC, abordando o tema “O valor da ciência”, inspirado em Henry Poicaré, matemático, físico e filósofo francês (1854-1912).

A programação do evento foi de altíssimo nível. Iniciou com Étienne Ghys, importante matemático da École Normale Supérieure de Lyon, que nos mostrou, com exemplos simples, a beleza da Matemática. Fernando Galembeck, do Laboratório Nacional de Nanotecnologia de Campinas, nos levou ao mundo nanométrico atual, onde as nanociências buscam, em exemplos da natureza, novas associações de átomos, que levam à formação de nanoestruturas com propriedades fantásticas e que já começam impactar a vida real. Os exemplos vão desde a obtenção de materiais de maior resistência ao carreamento de drogas com fins terapêuticos, passando por tintas com maior durabilidade e resistência, bem como novas formas de apresentação de cosméticos. Marcos Pimenta, da Universidade Federal de Minas Gerais, continuou no mundo nano, mas agora com diferentes arranjos dos átomos de carbono que conduzem à obtenção de novos materiais altamente resistentes e às nanoagulhas. Estas permitem a injeção de ácidos nucleicos no interior da células, podendo interferir de forma planejada no funcionamento celular. Alexandre Kelner, dinâmico “caçador de dinossauros”, que coordena importantes estudos paleontológicos, nos falou da deficiente preservação dos sítios arqueológicos brasileiros e do pouco-caso com que tratamos os museus, a começar pelo Museu Nacional do Rio de Janeiro, legado de Dom João VI.

Ao final, destaco duas conferências de dois detentores do Prêmio Nobel. Jules Hoffmann, da Universidade de Estrasburgo, mostrou como estudos simples sobre pequenas moléculas peptídicas, produzidas por células de insetos, defendem de infecções. Mostrou ainda os caminhos à identificação de novos receptores que ajudaram a entender a resposta imunológica inata. Por seus estudos, ganhou, em 2011, o Prêmio Nobel de Medicina. O encontro nos brindou com a emocionante conferência de Ada Yonath, do Instituto Weizmann de Israel, ganhadora do Prêmio Nobel de Química de 2009, pela determinação da estrutura do ribossomo, estrutura celular envolvida na formação das proteínas. De forma simples, mostrou como o estudo comparativo de ribossomos abre possibilidades de descoberta de novos e potentes antibióticos, bem como pode minimizar o processo de resistência bacteriana. Emocionou a todos ao finalizar sua conferência, mostrando, lado a lado, seus principais troféus: o Nobel e uma curta e carinhosa mensagem de sua neta. Aplaudida de forma prolongada por todos, ficou surpresa e emocionada, deixando timidamente escapar algumas lágrimas. A reunião da ABC constituiu momento de enriquecimento cultural e científico.