O globo, n. 29867, 16/05/2015. País, p. 4

Cunha pressiona Planalto contra Janot

SIMONE IGLESIAS E PAULO CELSO PEREIRA 
 

Deputado tenta evitar que procurador que o investiga tenha novo mandato; parlamentar nega

“Indicá-lo (Janot) não é atribuição minha e sim da presidente da República”

Investigado na Lava-Jato, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, tem dito a aliados que o governo “conhecerá o inferno” se Janot for reconduzido ao cargo de procurador-geral da República. Cunha nega. Alvo da Operação LavaJato, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha ( PMDB- RJ), disse a aliados ter mandado um recado duro à presidente Dilma Rousseff na semana passada. Em conversa com o ministro Aloizio Mercadante (Casa Civil), o deputado teria pedido que ele informasse à presidente que se ela der novo mandato ao procurador-geral da República, Rodrigo Janot, o governo irá “conhecer o inferno” na Câmara — que já anda beligerante com as pautas propostas pelo governo.

Cunha declarou guerra ao procurador desde que Janot pediu a abertura de inquérito sobre ele por supostamente ser um dos beneficiados pelo bilionário esquema de corrupção na Petrobras. Depois de tentar, sem sucesso, arregimentar apoio entre seus aliados na Câmara para aprovar uma PEC que impede a recondução dos procuradores, Cunha articulou com seus aliados para convocar Janot para a CPI da Petrobras. Um requerimento com este fim foi apresentado pelo deputado Paulo Pereira da Silva (SD-SP) na comissão, mas não houve apoio dentro da CPI e sequer foi posto em pauta.

Nos relatos que fez a pessoas próximas, Cunha deixou claro que não poupará Dilma caso ela decida indicar novamente Janot para o cargo. O mandato dele na Procuradoria Geral da República vencerá em setembro. A eleição para o mandato 2015- 2017 deve ser realizada na primeira semana de agosto, e a presidente terá até o mês seguinte para definir o nome de sua preferência entre os três primeiros colocados.

APURAÇÃO “AVANÇANDO”

Cunha não especificou como transformaria a vida do Planalto em “um inferno”, mas, segundo os aliados, isso passaria, principalmente, pela votação de temas na Câmara que têm objeção da presidente Dilma.

Janot chegou ao cargo em 2013 após ser o mais votado entre os candidatos a procuradorgeral. A cada dois anos, a PGR apresenta ao governo uma lista tríplice com os três primeiros colocados na eleição interna para o cargo, na qual todos os procuradores da República no país têm direito a voto. Desde que Lula chegou ao poder em 2003, o primeiro colocado da lista tem sido o escolhido. Segundo um integrante do governo, a tendência é que a presidente Dilma mantenha a tradição e escolha o primeiro colocado.

Apesar de sua movimentação

Eduardo Cunha

Presidente da Câmara contra Janot, a situação de Cunha não é simples. Em sua delação premiada, o doleiro Alberto Youssef afirmou que Cunha teria usado requerimentos da Câmara para pressionar o executivo Júlio Camargo a pagar propina para o lobista Fernando Soares, o Baiano, que seria o operador do PMDB — e de Cunha — na estatal. O deputado negava a acusação, mas O GLOBO revelou a existência de dois requerimentos da então deputada Solange Almeida (PMDB-RJ), aliada de Cunha, nos quais ela fazia o que foi descrito por Youssef.

O advogado de Cunha, Antônio Fernando de Souza, vem afirmando que o deputado está “absolutamente tranquilo” em relação às acusações do PGR. Um dos investigadores do caso, no entanto, diz que a apuração está “avançando muito bem”.

Procurado, Cunha disse que não fez qualquer gestão para que Janot não seja reconduzido e que não tem “interlocução dessa natureza com o governo”:

— Indicá-lo não é atribuição minha e sim da presidente da República. Da mesma forma que eu defendo a independência da Câmara, defendo também a independência dos outros Poderes — argumentou.

O ministro Aloizio Mercadante também afirmou ao ser procurado que jamais tratou desse assunto com Cunha ou recebeu recados dele nesse sentido. ( Colaborou: Jailton de Carvalho)