Câmara é irresponsável ao alterar previdência

 

Parece até o jogo em que anda uma casa para frente e dependendo de onde se chega volta-se duas. Foi o que a Câmara dos Deputados fez na noite de quarta-feira ao aprovar a medida provisória 664, a que define novas regras para futuros pensionistas do regime geral de previdência social (INSS). A pensão passará a ser um benefício vitalício apenas para dependentes com mais de 44 anos de segurados que contribuíram para a previdência pelos dois anos anteriores, ao menos. Para os dependentes mais jovens, o benefício será temporário, variando com a idade do pensionista.

Não faz sentido que nesse sistema a pensão por morte seja um benefício vitalício para quem teve a infelicidade de enviuvar muito jovem, mas em idade suficiente para reconstituir a vida. A regra que prevalecerá no Brasil, se ratificada pelo Senado, é semelhante à adotada pela maioria dos sistemas previdenciários no mundo. O Brasil era uma exceção, injustificável diante do imenso rombo das previdência no Brasil, coberto pelo Tesouro com recursos de todos os contribuintes.

Mas, tal qual o jogo que anda para frente e para trás, na mesma votação a Câmara dos Deputados, como se houvesse esquecido do que acabara de aprovar, incorporou à medida provisória uma emenda que modifica o fator previdenciário, que tem sido fundamental para atenuar o rombo do sistema. Decisão insana, pois aumenta os gastos num momento de ajuste. Num comportamento contraditório, aprovou-se o corte e, depois, abriu-se o cofre. Não faz sentido.

Na reforma proposta pelo governo de Fernando Henrique Cardoso, a Câmara rejeitara, por apenas um voto (e com forte oposição do PT), a emenda constitucional que introduzia a exigência de idade mínima para requerimento de aposentadoria no INSS, em qualquer hipótese.

Assim, como as aposentadorias precoces continuaram a ser permitidas, a única maneira de contrabalançar o valor total dos benefícios foi a adoção do fator previdenciário. Para quem se aposenta precocemente, é aplicado um redutor sobre o valor mensal do benefício, calculado com base na expectativa média de vida dos brasileiros, apurada pelo IBGE. O fator diminui e se anula à medida que as mulheres se aposentam aos 60 anos e os homens aos 65.

Irresponsavelmente, por pequena margem de votos — entre os quais do PSDB e DEM, partidos que haviam votado a favor da reforma do governo FH, diga-se de passagem —, a Câmara decidiu estimular novamente as aposentadorias precoces, diminuindo em cinco anos as idades em que o fator se torna nulo.

Na verdade, a votação refletiu apenas um jogo político, sem preocupação efetiva com as finanças do país. É o que demonstra o fato de tucanos votarem contra o que sempre pregaram. Espera-se que o Senado conserte essa insanidade. Se isso não acontecer, cabe à presidente Dilma vetar a mudança no fator previdenciário.