Aéreas temem alta de custo trabalhista

Marina Gazzoni

 

Um projeto de lei que altera as condições de trabalho dos pilotos mobilizou as principais companhias aéreas brasileiras nas últimas semanas. As empresas alegam que a mudança pode gerar um novo choque de custo no setor e até inviabilizar algumas rotas novas e atuais. O maior impacto seria sentido pela TAM, que voa para mais destinos internacionais e compete com aéreas estrangeiras. 

A proposta em análise na Comissão de Viação e Transporte da Câmara trata da criação de um sistema de gerenciamento de fadiga pelas empresas aéreas brasileiras, com foco em aumentar a segurança dos voos e melhorar a qualidade de vida dos tripulantes. O texto muda regras trabalhistas em vigor desde 1984, como folgas, jornada máxima diária ou mensal, pagamento de horas extras e disposições sobre voos na madrugada.

Cálculos preliminares da Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear) estimavam um impacto de R$ 2,23 bilhões ao ano no custo das quatro maiores empresas nacionais se o texto em tramitação na Câmara fosse adiante. “Não podemos aceitar uma lei que tira a competitividade das empresas brasileiras em relação às estrangeiras e que inviabiliza a oferta de passagens a preços comparáveis com o ônibus”, disse o presidente da Abear, Eduardo Sanovicz.

 

 

Sindicato quer ampliar de 8 para 12 dias o nĂºmero de folgas mensais 

Sindicato quer ampliar de 8 para 12 dias o número de folgas mensais 

 

O presidente do Sindicato Nacional dos Aeronautas (SNA), que representa pilotos e comissários, Adriano Castanho, diz que os trabalhadores estão dispostos a negociar para evitar o choque de custos e já aceitaram elevar a jornada de trabalho diária em uma hora. “A discussão é sobre segurança. Não queremos que ela tenha impacto econômico para empresas ou trabalhadores”, afirmou. 

Depois de diversas reuniões nas últimas semanas, as empresas aéreas e o sindicato encaminharam, na semana passada, suas propostas à deputada Clarissa Garotinho (PR-RJ), relatora do projeto. Será dela a decisão sobre os pontos divergentes. Clarissa diz que encaminhará o projeto para votação nas próximas sessões da comissão. “As mudanças visam a melhorar a qualidade de vida dos tripulantes e a segurança dos voos. Não queremos inviabilizar a operação das empresas.”

Entre os pontos mais polêmicos estão o número de folgas - o sindicato pede ampliação de 8 dias mensais para 12 -, e as condições de descanso para pilotos nos voos longos. Algumas empresas defendem que a jornada de tripulantes seja definida pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e não pela lei, como ocorre nos EUA. Hoje, a questão trabalhista não é competência da Anac.

Impacto. A TAM estima que teria um aumento de 20% a 35% na sua folha de pagamento. Além disso, a empresa diz que as novas regras inviabilizariam todos os seus voos para a Europa. Pelo tempo de voo, a empresa precisaria ter um equipamento chamado “sarcófago”, um espaço isolado com camas para pilotos.

“Nenhuma das nossas aeronaves tem esse espaço. Simplesmente não poderíamos voar mais para a Europa até a TAM comprar um avião maior. Mas a British Airways, que tem um voo de São Paulo para Londres no mesmo horário e com um avião igual, poderia”, diz a presidente da TAM, Claudia Sender. 

Segundo ela, a TAM aguarda a definição trabalhista para decidir se segue com o projeto de criação de um centro de distribuição de voos (hub) no Nordeste para a Europa, um projeto com investimentos de cerca de US$ 1 bilhão. “O hub não sai se o projeto de lei for aprovado desta forma. Não é ameaça. É realidade. O hub só faz sentido se tivermos custos competitivos com empresas estrangeiras.”

Castanho, do SNA, diz que a proposta no Congresso é flexível e que a TAM poderá fazer o voo para Europa no seu avião desde que “apresente estudos que comprovem que não há risco para a segurança”. 

Na Azul, as primeiras avaliações indicam que a empresa precisaria contratar mais pilotos, mas eles teriam redução de salário, pois voariam menos. “Para dar mais folgas sem reduzir salário, temos de ampliar a jornada”, explica o presidente da Azul, Antonoaldo Neves.

A Gol diz que aguarda uma decisão final para avaliar o impacto das regras na sua malha. “Obviamente, se houver uma alta de custo, alguns voos podem deixar de fazer sentido”, afirma Alberto Fajerman, diretor de relações institucionais da Gol.

Procurada, a Anac disse que acompanha a discussão, mas não quis comentar o tema.