O globo, n. 29872, 21/05/2015. Rio, p. 11

Um cartão-postal marcado pela insegurança

Ciclistas e corredores circulam em grupo e sem objetos de valor. PMs começam a fazer patrulhamento a cavalo

Iluminação e poda de árvores deficientes, aumento da população de rua e policiamento escasso. A Lagoa Rodrigo de Freitas, um dos endereços mais nobres da cidade, enfrenta problemas que estão embaçando sua beleza e levando estresse para o dia a de moradores e frequentadores. Além disso, todos esses fatores fazem aumentar o sentimento de insegurança, já que contribuem para o crescimento dos casos de assaltos — em um mês, quatro pessoas foram esfaqueadas por ladrões na região. Apesar de todas as queixas, só ontem, depois da notícia da morte do cardiologista, a PM posicionou viaturas em alguns pontos da orla da Lagoa, que tem cerca de 7,5km, e deu início a um novo esquema de policiamento, com homens a cavalo.

— Há trechos mal iluminados, árvores que precisam de poda, parques sem manutenção, com brinquedos quebrados. Perto do heliponto, moradores de rua lavam roupas, tomam banho e fazem churrasco — lamentou o presidente da Associação de Moradores do Jardim Botânico, Heitor Welgmann, que tem entre os associados moradores de um trecho da Lagoa. — Agora, vão colocar mais policiais. Semana que vem, não haverá mais ninguém.

O comandante do 23º BPM (Leblon), coronel Joseli Cândido da Silva, que assumiu o cargo horas antes do assassinato do médico, diz que o policiamento foi reforçado na área. Ontem, PMs a cavalo já eram vistos na Lagoa.

— Os cavalos dão uma visibilidade maior. O policial fica num plano superior. Será bom — avaliou o coronel.

Segundo Silva, bicicletas e veículos elétricos também serão empregados pelos policiais. Outra medida será a realização de revistas em ônibus que circulam pela área. Ele também criará um grupo de WhatsApp para que donos de quiosques se comuniquem diretamente com o batalhão.

TREINOS SÃO PREJUDICADOS

Ultimamente, caminhar ou andar de bicicleta pela Lagoa tem despertado outro tipo de sentimento nos cariocas: medo. Para driblar o perigo, frequentadores começaram a adotar diferentes estratégias — vale desde pedalar em horários alternativos, andar em grupo e até apelar para um aparelho celular velho e uma bicicleta detonada, que não chamem a atenção de bandidos. Ontem à noite, apesar da temperatura amena, poucas pessoas passeavam ou praticavam esporte no local.

A dona de casa Roberta Ribeiro, de 58 anos, que caminha diariamente na Lagoa, conta que mudou de hábitos após os ataques. Recentemente, ela viu um atleta ser esfaqueado na área:

— Saio de casa quase sem nada. Não trago celular e coloco apenas um dinheirinho no bolso de trás do short.

O ciclista Felipe Hachiya diz que a sensação de insegurança mudou a rotina dos treinamentos de sua equipe, a Fox:

— O treino está sendo muito prejudicado. As pessoas estão com medo de sair de casa. Temos que orientar para que todos andem em grupo.

É o que já faz o consultor financeiro Rogério Oliveira, que costuma pedalar às 4h e faz parte de um grupo com quase cem esportistas. O pelotão conta com o apoio de algumas motos, que dão segurança aos ciclistas.

Os atletas do ciclismo investem em modelos mais caros, que podem custar até R$ 30 mil, mas os ladrões normalmente não sabem o valor da bicicleta — levam o que for mais fácil, diz Rogério Oliveira, que presta assessoria financeira à loja Renato Estrella Bicicletas, na Barra:

— Os criminosos levam todos os modelos, não só os melhores. Já vi um ladrão roubar uma bicicleta de velocidade, muito cara, e abandoná-la cem metros depois porque não conseguiu andar. Em seguida, pegou outra, que valia um décimo da primeira.

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Em quatro meses, 167 feridos a faca no Rio

Casos são de pacientes atendidos em quatro hospitais da cidade

Nos primeiros quatro meses deste ano, 167 vítimas de arma branca foram atendidas nas quatro principais emergências de hospitais municipais do Rio. No Hospital Lourenço Jorge, na Barra, foram 73 internações de pessoas feridas a faca; no Souza Aguiar, no Centro, 43; no Miguel Couto, na Gávea, 37; e no Salgado Filho, no Méier, 14. Os dados são da Secretaria municipal de Saúde.

Na Lagoa, em 19 de abril, o francês Victor Didier teve os dois pulmões perfurados, próximo ao Jardim de Alah, onde Afonso Arinos também foi ferido no dia 25. Na mesma data, no Corte do Cantagalo, o remador Felipe Schuchmann, de 14 anos, foi atacado. Os três tiveram as bicicletas roubadas.

A turista vietnamita Tran Vu Ha foi esfaqueada em 17 de maio, na Praça Quinze. No dia 8, uma mulher não identificada levou facadas em Laranjeiras. Em 1º de maio, o “Jornal Nacional”, da TV Globo, mostrou um homem sendo ferido na Avenida Rio Branco.

Em fevereiro, o turista alemão Fred Nicfind morreu, ao ser esfaqueado, no Centro. Em 10 de outubro, Carlos Henrique Pereira teve o pulmão perfurado quando pedalava na Avenida Epitácio Pessoa, na Lagoa.