O globo, n. 29867, 16/05/2015. Economia, p. 23

Reação da Petrobras

RAMONA ORDOÑEZ, BRUNO ROSA E DANIELLE NOGUEIRA

Após prejuízo recorde em 2014, estatal lucra R$ 5,3 bi no 1º trimestre, acima do previsto

Com economia fraca, estatal vendeu menos gasolina e reduziu custos, recuperando-se de prejuízo recorde do ano passado

FERNANDO QUEVEDOSem parar. Solange Guedes, diretora de Exploração, ao lado de outros diretores: “Não estamos paralisados. O resultado mostra isso”

Após registrar prejuízo recorde de R$ 21,6 bilhões no ano passado, a Petrobras surpreendeu analistas ao divulgar lucro de R$ 5,3 bilhões entre janeiro e março. O ganho foi só 1% menor que o registrado em igual período de 2014. A queda no preço internacional do petróleo e a redução nas vendas de combustíveis no Brasil, devido à economia fraca, fizeram os custos da Petrobras caírem 17%. A produção de petróleo da estatal aumentou 10,7%. Analistas alertam, porém, que a dívida da companhia, que subiu para R$ 332 bilhões, preocupa. Após o atraso de cinco meses para publicar o balanço auditado de 2014, a Petrobras divulgou ontem os resultados financeiros do primeiro trimestre deste ano, com boas notícias: o lucro líquido, de R$ 5,3 bilhões, veio acima das previsões dos analistas, que variavam entre R$ 2,4 bilhões e R$ 4 bilhões. O número ficou apenas 1% abaixo dos R$ 5,4 bilhões obtidos no mesmo período de 2014.

No ano passado, a estatal registrou um prejuízo de R$ 21,6 bilhões, o primeiro resultado negativo desde 1991. Isso se deveu às baixas relativas aos casos de corrupção da Operação Lava-Jato e ao adiamento de projetos como refinarias, que totalizaram perdas de R$ 50,8 bilhões.

Segundo a Petrobras, o lucro foi influenciado pelo aumento de 50% da geração de caixa operacional, que totalizou R$ 21,5 bilhões — apontado por analistas como o melhor resultado para um trimestre na história da companhia. Segundo Ivan Monteiro, diretor financeiro da estatal, essa alta foi decorrência dos preços maiores dos preços dos combustíveis (gasolina e diesel) vendidos no país em relação ao mercado internacional. Por outro lado, a empresa pisou no freio. Os investimentos caíram 13% no primeiro trimestre, frente ao mesmo período de 2014, e 27% em relação ao fim de 2014, para R$ 17,8 bilhões.

Mario Jorge da Silva, gerente executivo de Desempenho Empresarial da Petrobras, explicou ainda que a queda de 50% no preço do barril do petróleo tipo Brent, referência do mercado, ajudou na redução de 17% dos custos de produtos e serviços vendidos, o que, segundo ele, permitiu ganhos maiores — com isso, gasta-se menos com importação. A produção ainda aumentou 10,7% entre janeiro e março deste ano, para 2,8 milhões de barris por dia, em relação ao mesmo período de 2014.

‘PREÇOS COMPETITIVOS DE MERCADO’

Mesmo com uma maior geração de caixa e a redução nos custos, o endividamento líquido da empresa atingiu R$ 332,5 bilhões no primeiro trimestre, uma alta de 18% em relação aos R$ 282,1 bilhões do fim do ano passado. Porém, a relação entre a dívida e a geração de caixa (a chamada alavancagem) sofreu uma redução, destacou Monteiro. Essa relação caiu de 4,77 para 3,86 entre o quarto trimestre de 2014 e o início deste ano.

— A alavancagem sofreu redução por conta do aumento do Ebitda (geração de caixa operacional). Temos uma preocupação em buscar uma redução (desse número). Isso vai depender de várias iniciativas, e a mais importante delas é a discussão do novo Plano de Negócios, que deve ser a anunciado na primeira quinzena de junho. Há uma tendência de redução desse indicador, mas só teremos uma ideia disso com o novo Plano de Negócios — disse Monteiro.

Perguntado sobre o impacto dos empréstimos realizados com o banco chinês China Development Bank, de US$ 3,5 bilhões, o diretor frisou que os recursos só serão desembolsados ao longo deste segundo trimestre. Por isso, dizem analistas, o nível de alavancagem teve redução. Monteiro ressaltou ainda que a companhia manterá sua política de preços:

— A companhia praticará preços competitivos de mercado o tempo inteiro.

Por isso, analistas acreditam que o bom resultado de caixa e de alavancagem não deverá se repetir nos próximos trimestres. Conforme cálculos do Centro Brasileiro de Infra Estrutura (CBIE), nesta semana a Petrobras já estava vendendo a gasolina 4,2% mais barata que o mercado internacional, enquanto o preço do diesel ainda está 6,5% acima da cotação internacional. Cenário diferente do início do ano, quando o preço interno da gasolina era 20,2% superior ao internacional, e o do diesel, 25,5% maior.

A Petrobras destacou também que, no primeiro trimestre, houve queda de 10% nas vendas de diesel e de 11% nas de gasolina, o que fez com que a receita operacional da empresa recuasse 9%, para R$ 74,4 bilhões. Segundo o diretor Jorge Celestino Ramos, de Abastecimento, essa retração se deveu à queda da atividade econômica e à maior adição de álcool e biodiesel aos combustíveis.

— A perspectiva é de menor importação neste ano para a gasolina. Já o diesel deve ficar em linha. No diesel, as importações devem ficar em torno de 130 mil a 150 mil barris por dia. E gasolina deve ficar em 50 mil barris por dia. Esse foi o volume no primeiro trimestre e está (se mantendo) no segundo. A tendência da gasolina é reduzir a importação por conta da mistura maior com o álcool. A quantidade de queda vai depender do apetite do consumidor por álcool — disse Celestino.

Segundo analistas, houve uma melhora nas margens da companhia, com os preços maiores dos derivados vendidos no país e menores gastos com importação. Assim, diz Flavio Conde, analista independente do blog Whatscall, a estatal registrou a melhor geração de caixa operacional para um trimestre na história:

— Com a retração nas vendas internas, a Petrobras teve de importar menos, a um preço menor. Foram 225 mil barris de petróleo importados no primeiro trimestre, ante 417 mil no primeiro trimestre do ano passado.

EFEITO DA DESVALORIZAÇÃO CAMBIAL

Luciana Nazar, especialista em infraestrutura e sócia da GO Associados, porém, ressalta que a depreciação cambial de 21% no trimestre anulou parcialmente os ganhos:

— A desvalorização da moeda levou ao aumento da despesa financeira, o que anulou boa parte do ganho operacional.

Assim, analistas alertam que a maior geração de caixa não deve se repetir, pois o preço do Brent, que foi tão determinante para o resultado, já vem subindo. No segundo trimestre, o preço médio do Brent está em torno de US$ 60, contra US$ 50 nos três primeiros meses do ano. Por isso, ressaltam, os esforços para reduzir o endividamento devem ser redobrados.

— O que se espera da gestão Aldemir Bendine é que o endividamento caia. Esse será o grande desafio da companhia — disse Conde.

Solange Guedes, diretora de Exploração e Produção, reforçou que a meta de produção para este ano é de 2,796 milhões de barris de petróleo por dia:

—Nós não estamos paralisados. O resultado do primeiro trimestre mostra isso, com capacidade operacional.

Na Bolsa de Valores de São Paulo, as ações da Petrobras fecharam em alta de 1,62% (ON, com direito a voto, a R$ 15,05) e 1,22% (PN, sem voto, a R$ 14,06).