Título: Debate sem consenso
Autor: Mariz, Renata
Fonte: Correio Braziliense, 07/08/2011, Brasil, p. 12

O peso da clandestinidade em cima da mulher pobre não tem sido suficiente para que o país enfrente um debate há décadas postergado. Mas nem mesmo entre os especialistas em direito, que argumentam mais com base nas doutrinas jurídicas e menos por convicções pessoais, há consenso sobre a criminalização do aborto. Vice-presidente de direitos humanos da Associação dos Magistrados do Brasil (AMB), Renata Gil defende a mudança no Código Penal para retirar a tipificação de crime do aborto. "Vemos historicamente que nada muda. Não importa se há legislação criminalizando. Estamos falando de uma situação de comportamento presente no Brasil e no mundo. Precisamos, então, que a lei e a jurisprudência dos tribunais se adequem a isso", afirma a juíza criminal do Rio de Janeiro, destacando que a pesquisa da UnB e da Anis "seguramente" reflete uma realidade nacional.

Embora defenda uma revisão na lei, para ampliar as possibilidades do aborto legal, o jurista Luiz Flávio Gomes não considera viável a descriminalização total da prática no Brasil devido a instrumentos jurídicos internacionais assinados pelo país. "O artigo 4º da Convenção Americana diz que ninguém pode ser privado da vida arbitrariamente. Então, se a mulher não tem justificativa para matar um feto, tem de ser responsabilizada", explica o especialista em direito constitucional. "Mas sou plenamente favorável a uma ampliação das hipóteses de aborto, como a situação financeira ou problemas psicológicos graves. Assim, ficaria a cargo do juiz analisar caso a caso." (RM)