Valor econômico, v. 15, n. 3737, 16/04/2015. Política, p. A6

 

PT afasta Vaccari e começa disputa pelo cargo

 

Por Cristiane Agostine | De São Paulo

 

Chello Fotógrafo/Futura Press/FolhapressRui Falcão: em nota, presidente do PT disse que Vaccari solicitou afastamento "por questões de ordem prática e legal" e elogiou conduta de ex-tesoureiro

O afastamento de João Vaccari Neto da tesouraria do PT foi decidido após um almoço de três horas entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o presidente da sigla, Rui Falcão, no Instituto Lula, em São Paulo.

A decisão foi comunicado por meio de uma nota, assinada por Rui Falcão e distribuída na sede do partido. O dirigente disse na nota que a prisão foi "desnecessária", reafirmou ter "total confiança" na inocência de Vaccari e demonstrou solidariedade ao tesoureiro. Na nota, Falcão diz que Vaccari pediu o afastamento do cargo, por "questões de ordem "prática e legal".

Segundo o documento, Vaccari " desde o início das investigações se colocou à disposição das autoridades para prestar qualquer esclarecimento que lhe fosse solicitado". A nota diz que o partido confia na inocência de Vaccari, "não só pela sua conduta à frente da Secretaria Nacional de Finanças e Planejamento, mas também porque, sob a égide do Estado Democrático de Di- reito, prevalece o princípio fundamental de que todos são inocentes até prova em contrário".

O PT deve definir até sexta-feira o novo tesoureiro do partido. O grupo majoritário da sigla, Partido que Muda o Brasil, articula-se para manter o cargo, apesar da resistência de parte da legenda. O nome deve ser escolhido na reunião da Executiva do PT, hoje, ou no máximo no encontro do Diretório Nacional, na sexta-feira, ambos em São Paulo.

Segundo o secretário de comunicação do PT, deputado estadual José Américo Dias (SP), o partido "não pode ficar sem tesoureiro". O nome tem de ser escolhido entre os integrantes do diretório ou da executiva.

O grupo Mensagem, do ex-governador Tarso Genro e do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, reivindica a tesouraria. A tendência petista defende também que todos os investigados pela Operação Lava-Jato deixem seus cargos no partido, como o líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE). Integrante da tendência PMB, o secretário de organização do PT, Florisvaldo Souza, tentou minimizar a prisão do tesoureiro e disse que "não há nenhum fato novo" para justificar a detenção. "A nossa vida continua normal", disse Florisvaldo.

 

"Dilma está muito distante disso", diz Wagner

 

Por Andrea Jubé, Thiago Resende, Vandson Lima e Virgínia Silveira | De Brasília e do Rio

A orientação interna no Palácio do Planalto é tratar com "normalidade" a prisão do tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, no âmbito da Operação Lava-Jato, e mostrar que o governo continua trabalhando. Ministros foram orientados a evitar levar o problema para dentro do palácio.

Há divisão interna no governo entre os ministros do PT, que defendem, individualmente, que a direção do partido deveria ter convencido Vaccari a se licenciar do cargo há mais tempo, e outros que acreditam ser preciso apoiá-lo. Vaccari foi afastado da direção da sigla na tarde de ontem, após um encontro em São Paulo entre Lula e Rui Falcão, presidente nacional do PT.

Valor PRO, serviço de informações em tempo real do Valor, apurou que pelo menos dois ministros petistas defenderam recentemente a representantes da direção nacional do PT que Vaccari se licenciasse do cargo, com assento na Executiva Nacional da sigla, enquanto durassem as investigações. A avaliação dos auxiliares de Dilma é que esse gesto contribuiria para aliviar a temperatura política. Um deles lembrou que, em 2006, em meio ao escândalo do "dossiê dos aloprados" - que atingiu a campanha do então senador Aloizio Mercadante ao governo de São Paulo - o então presidente do PT, Ricardo Berzoini - hoje ministro das Comunicações - afastou-se do cargo.

O ministro da Defesa, Jaques Wagner, foi escalado para falar oficialmente pelo grupo petista do governo sobre o assunto, o que fez após solenidade de que participou, no Rio. Disse que a prisão do tesoureiro do PT não era motivo suficiente para afastá-lo do cargo. "Não é por conta de uma suspeita que a gente vai logo se livrando de alguém", afirmou em coletiva de imprensa no Rio de Janeiro.

O temor do governo é que, como tesoureiro e arrecadador de verbas para campanhas eleitorais, Vaccari possa arrastar consigo os candidatos do partido, entre eles a presidente Dilma Rousseff, e o tesoureiro da sua campanha, o atual ministro da Secretaria de Comunicação Social (Secom), Edinho Silva.

Questionado sobre de que forma este novo fato pode pressionar o governo da presidente Dilma Rousseff, Wagner disse que isso não está acontecendo. "A presidente está muito distante disso, até pela sua história pessoal e da sua vida política. Essa estratégia de tentar colocar pecha de envolvimento dela não cola", ressaltou. Wagner foi buscar a solução novamente na reforma política. Para o ministro, é preciso levantar a bandeira da reforma política. "A máquina de fazer política está viciada. Precisamos preparar um ambiente mais sadio para o exercício da política em nosso país".

Foi seguindo essa orientação que o ministro do Desenvolvimento Agrário, Patrus Ananias, evitou repercutir a prisão de Vaccari e a crise que atinge o PT em entrevista coletiva concedida no Palácio do Planalto para tratar da reforma agrária. Fundador do PT e quadro histórico do partido, ele disse que só falaria dos assuntos tratados na reunião da Confederação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar (Contag) com a presidente.

O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, minimizou os fatos de ontem. "Um governo que apoia investigações jamais fica preocupado com elas", disse, ao ser questionado sobre a investigação envolver doações eleitorais. Cardozo evitou falar sobre a prisão. " Eu não comento ordens judiciais", afirmou. Ele revelou que foi informado sobre a detenção do tesoureiro do PT por volta das sete da manhã pelo diretor-geral da Polícia Federal, Leandro Daiello. E, logo informou a presidente Dilma Rousseff a respeito da prisão preventiva.

"Apenas digo que há um desejo de que tudo seja esclarecido, que a verdade venha à tona; e todos que praticaram atos ilícitos, sejam punidos; os que não os praticaram, sejam absolvidos", declarou durante entrevista coletiva para anunciar a repatriação de aproximadamente R$ 60 milhões que estavam bloqueados em instituição financeira localizada na Suíça.

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que também participou do evento no Ministério da Justiça, afirmou que a investigação relacionada aos inquéritos abertos no Supremo Tribunal Federal (STF), que apura o envolvimento de políticos no suposto esquema de corrupção na Petrobras, "não é curta, será demorada".

A Polícia Federal pediu mais prazo para realizar as diligências - ações de investigação, como acesso a dados sigilosos - solicitadas pela Procuradoria-Geral da República (PGR) ao ministro Teori Zavascki, relator no Supremo dos processos relacionada à Operação Lava-Jato.

Cardozo disse que essa é uma situação de praxe. Janot concordou: "É uma rotina na tramitação dos inquéritos". A tendência será conceder mais prazo para a Polícia Federal realizar as ações, informou Janot. "As investigações estão seguindo o curso normal. Tem caso que vamos precisar fazer perícia, em alguns quebra de sigilo, tem caso que vamos depender de cooperação internacional. Então depende do inquérito", completou o procurador-geral.

Ele, no entanto, não quis comentar sobre a prisão de Vaccari. Janot frisou que a prisão do tesoureiro do PT está relacionada a uma ação que não está sob sua direção, e sim na Justiça Federal do Paraná.