Valor econômico, v. 15, n. 3737, 16/04/2015. Empresas, p. B2

 

Novo patamar do dólar expõe Petrobras e aéreas, diz Moody's

 

Por Camila Maia | De São Paulo

A Petrobras, além de enfrentar uma crise sem precedentes, precisa lidar com um problema adicional: sua elevada exposição ao dólar. Um relatório da Moody's que será publicado hoje mostra que a estatal está entre as companhias mais prejudicadas pela desvalorização do real, junto com as empresas aéreas, que também têm dívida e custos na moeda americana e receitas predominantemente em reais.

Para a agência de classificação de risco, o real, assim como outras moedas latinas, deve permanecer enfraquecido em relação ao dólar neste ano e em 2016, pressionando as companhias com despesas na moeda e oferecendo vantagens significativas para as empresas exportadoras.

No caso da Petrobras, o problema é significativo, pois a valorização do dólar obriga a empresa a gastar mais para importar combustíveis, além de aumentar o peso da dívida denominada na moeda americana.

A Vale é ganhadora, mas o câmbio ainda não é suficiente para compensar preços baixos do minério

A Petrobras adota a contabilidade de hedge para limitar os efeitos do câmbio, mas continua muito exposta às movimentações cambiais.

"Essa é a estrutura de capital da empresa. Ela tem uma dívida maior em dólar, os próprios investimentos são em dólar, e a receita é basicamente em reais", afirma Barbara Mattos, vice-presidente e analista sênior da Moody's para finanças corporativas, em entrevista ao Valor.

A Moody's lembra que, em setembro do ano passado, a Petrobras tinha US$ 135 bilhões em dívida, sendo que US$ 97 bilhões em dólares. Além disso, 80% das importações e investimentos da companhia são denominados ou atrelados ao real, com 75% da sua receita registrada em reais.

Além desses problemas, há incerteza sobre a capacidade financeira da Petrobras de sustentar flutuações normais de câmbio, devido à situação delicada enfrentada pela estatal.

Para a Moody's, a valorização do dólar pode dificultar o ambiente para captações externas por parte das empresas brasileiras, afirma Bárbara. "O ambiente para captação está difícil, também por causa do aumento da percepção dos riscos no Brasil."

O risco poderia ser ainda maior para as empresas com dívidas com vencimento no curto prazo, mas a Moody's avalia que mesmo as companhias com grande volume de dívida em dólar não têm grandes vencimentos no curto prazo.

As companhias aéreas também estão entre as empresas mais expostas ao risco cambial, na avaliação da Moody's. No Brasil, quem sofre o maior risco é a Gol. Um total de 75% da sua dívida bruta está em dólar e 60% das suas despesas operacionais, incluindo combustíveis, alugueis de aeronaves e manutenção, são pagos na moeda americana.

As receitas da Gol, na contramão, são em reais. A Moody's destaca que a companhia está expandindo o seu "hedge natural" com o aumento da presença em voos internacionais, que permitem uma receita em dólar. Ainda assim, uma desvalorização de 10% no real iria reduzir o resultado operacional da empresa em R$ 350 milhões anuais, além de aumentar o seu nível de endividamento.

Enquanto os efeitos adversos nas empresas com custo e dívida em dólar são mais imediatos, direto nas despesas financeira, as exportadoras, como Fibria, Suzano e JBS, devem ser beneficiadas por um crescimento das receitas. Isso, porém, não necessariamente acontecerá no curto prazo.

"Muitas vezes o custo em dólar não pode ser repassado imediatamente", afirma Bárbara. Isso acontece, por exemplo, no caso de preços controlados, mas a tendência é que os benefícios apareçam.

Ainda que as empresas sejam exportadoras, há também uma série de variáveis que precisam ser consideradas dentro da estrutura de capital.

A Vale ganha porque é uma exportadora com custos predominantemente em reais. A depreciação da moeda doméstica ajuda mais a companhia do que as mineradoras localizadas no Peru e no Chile, "ainda que não seja suficiente para compensar os preços muito baixos do minério de ferro".

"Mesmo ela aproveitando a depreciação da moeda por ser exportadora e ter receita em dólar, o resultado não será necessariamente melhor", afirma Bárbara. Como o preço do minério deve permanecer em patamares muito baixos, os resultados da Vale devem ser mais fracos em 2015, aponta.

Na ponta das empresas mais beneficiadas estão as produtoras de proteínas, como JBS, BRF, Minerva e Marfrig, que podem ganhar mais competitividade na exportação.

O enfraquecimento do real tem ajudado essas empresas desde 2013. A JBS é a que tem a maior proporção da sua receita denominada em dólar: 83% do total. A Marfrig aparece em seguida, com 75%, enquanto a Minerva tem 65% da receita em dólar.

O setor de papel e celulose também é beneficiado pela desvalorização cambial. O cenário, que inclui também aumento da capacidade de produção e das exportações dessas empresas, é bem visto pela Moody's.

"O setor gera grande parte da sua receita em dólares, resultantes das vendas de celulose, compensando qualquer problema que a exposição elevada à divida em moeda estrangeira possa ter e protegendo a empresa de um enfraquecimento dos preços de commodities", afirma a Moody's.