Depósito milionário separa sócios

 

 

BRASÍLIA - Muito conhecidos em Brasília, os advogados Eduardo Ferrão e Paulo Baeta Neves romperam uma sólida sociedade financeira depois de se desentenderem por causa de um depósito milionário recebido pelo escritório que mantinham numa casa no Lago Sul, na capital federal. Em setembro de 2008, Ferrão identificou o depósito de R$ 5,7 milhões na conta do escritório. Seria uma propina relacionada a um acordo entre a Petrobras e o Sindicato dos Práticos. O dinheiro teria como origem a entidade que representa os profissionais de orientação naval, e um dos destinatários seria o deputado Aníbal Gomes (PMDB-CE). Ele é um dos investigados pelo Ministério Público em inquéritos autorizados pelo Supremo Tribunal Federal (STF) para avaliar suspeitas de ligação com o escândalo da Petrobras.

Em um dos depoimentos da delação premiada, o ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa, um dos responsáveis pelo acordo com os práticos, apontou Aníbal como representante do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), naquela e em outras negociações na estatal. Costa disse que receberia R$ 800 mil se ajudasse na correção da tabela dos práticos e que as cifras dos demais seriam ainda maiores. O pagamento seria feito por meio do escritório de advocacia, que trabalhava para o sindicato.

 
 

Ferrão e Baeta se desentenderam quando os práticos já comemoravam o acordo de R$ 40 milhões com a Petrobras. Em 23 de setembro de 2008, Ferrão cobrou explicações do sócio e do contador sobre o depósito de R$ 5,7 milhões e logo depois descobriu que a transação tinha como origem o acordo do Sindicato dos Práticos. O negócio teria sido conduzido por Baeta e o também advogado Paulo Ornelas com a ajuda de Aníbal.

Com receio de ser arrastado para o centro de um escândalo, Ferrão exigiu que o sócio retirasse imediatamente o dinheiro da conta dele. Dois dias depois, em 25 de setembro de 2008, os R$ 5,7 milhões foram transferidos para uma conta de Baeta. Nos dois meses seguintes, os dois concluíram a separação do escritório e não voltaram mais a falar sobre o assunto. O caso só reapareceu nos depoimentos da delação premiada de Costa e do doleiro Alberto Youssef.

Num dos interrogatórios, ao explicar como passou a receber apoio político do grupo de Renan em troca de dinheiro, Costa falou sobre a propina vinculada ao acordo dos práticos. O ex-diretor disse que, numa das conversas reservadas que manteve com Aníbal, o deputado combinou de repassar a ele, por intermédio do escritório de advocacia, R$ 800 mil como recompensa pelo acordo. O ex-diretor disse, no entanto, que o deputado “passou a perna” nele e, depois do acordo, ignorou a dívida. Costa não soube dizer qual o percentual que seria destinado ao grupo político representado por Aníbal.

Procurado pelo GLOBO, Ferrão disse que desfez a sociedade com Baeta e que nada tem a ver com as operações financeiras relacionadas ao Sindicato dos Práticos. Aníbal Gomes confirmou o lobby em favor do acordo, mas negou que tenha recebido dinheiro ou prometido propina para Costa. Ele diz que apenas apresentou Baeta ao ex-diretor da Petrobras e mencionou o interesse dos práticos no acordo.

O GLOBO tentou, sem sucesso, contato com Baeta. Segundo um de seus filhos, o advogado tem tido sérios problemas de saúde e não poderia dar entrevista. Ornelas não foi localizado. Segundo amigos, ele estaria em Londres. A assessoria do Senado disse que Renan não autorizou Aníbal ou qualquer outra pessoa a falar em nome dele. O senador também nega ter recebido qualquer vantagem das pessoas que participaram do acordo. O sindicato não se manifestou.