Dilma diz que tem prerrogativa de nomear nas estatais e Renan aponta ‘caixa-preta’

Tânia Monteiro

Ricardo Della Coletta

 

O governo se viu nesta terça-feira, 2, em mais um embate com o Congresso. Agora, as divergências surgiram com a proposta defendida pelos presidentes do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), de dar aos senadores o poder de sabatinar e aprovar ou rejeitar indicações para o comando de estatais como Petrobrás, Banco do Brasil e Correios.

Dilma repudiou o anteprojeto apresentado na segunda pelos peemedebistas e disse que escolher os presidentes das estatais “é uma prerrogativa do Executivo”. Pouco depois, ouviu de Renan que a proposta é “uma resposta do Legislativo ao desalinho das estatais, de todas, inclusive da Petrobrás”. Líderes do PSDB no Senado, em compensação, consideraram a exigência de sabatina um “exagero”.

O anteprojeto que começou a ser discutido por uma comissão de quatro senadores e quatro deputados estabelece uma série de regras para a gestão das empresas públicas e de economia mista. Além de prever sabatina na Casa dos indicados ao comando das estatais, o texto fixa critérios mais rígidos para escolha dos membros de conselhos de administração, como experiência em empresas similares, e proíbe o vínculo dos nomeados com o governo – ministros não poderiam mais compor os colegiados, como Dilma fez na Petrobrás quando chefiava a Casa Civil.

Em entrevista no Planalto, após anunciar o Plano Safra, Dilma afirmou: “Eu gostaria de dizer que nós consideramos que a nomeação de estatais, de ministérios e de autarquias é prerrogativa do Executivo”. “Todos os Poderes no Brasil têm de ser respeitados. A autonomia do Legislativo, a autonomia e a independência de todos os Poderes: Legislativo, o Judiciário e o Executivo.”

Renan rebateu Dilma e disse que a Lei de Responsabilidade das Estatais servirá para abrir a “caixa-preta” dessas empresas. “Não há absolutamente interferência. O que há é um desejo da sociedade que se abra a caixa-preta das estatais”, disse o senador. “O País cobra isso.”

 

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O Planalto classifica a sabatina como “desastre” e “retrocesso”, mas não vai continuar a bater boca publicamente com Renan e Cunha. A estratégia será mobilizar suas lideranças para conversar com todas as correntes do Congresso, inclusive da oposição, para evitar adesões ao texto. Para não alimentar a polêmica, o governo chega a avaliar como positivos pontos referentes à governança e até considera possível negociá-los, mas repudia totalmente a sabatina dos indicados à presidência de estatais. 

Alternativas. Presidente do PSDB, o senador Aécio Neves (MG) concorda com as críticas à gestão das estatais – seja a ligada a esquemas de corrupção, como a da Petrobrás, sejam as atingidas por falta de transparência, como a do BNDES –, mas não apoia a sabatina de indicados ao comando dessas empresas.

Aécio disse que vai apresentar nesta quarta-feira, 3, um projeto de lei alternativo ao texto dos peemedebistas, elaborado por equipe coordenada pelo ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga. O também tucano José Serra prepara projeto de lei semelhante que tampouco prevê sabatina.

“Isso é um certo exagero. Discutir no Senado Federal a qualificação dos nomes tudo bem, mas essa sabatina já é uma certa usurpação de atribuições”, disse Aécio. “Eu acho que o nosso projeto não chega a tanto, nesse caso específico, mas garante a profissionalização dos indicados paras a gestão das estatais.”

 

O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL)

O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL)

 

‘Chantagem’. A proposta de Renan e Cunha preocupa o Planalto e já foi objeto de uma primeira conversa entre Dilma e o vice-presidente Michel Temer, articulador político do governo. Os dois concordam que a proposta não é aceitável na forma como foi apresentada e que se trata de “ingerência política muito grande do Legislativo”.

Há a preocupação no governo de que as sabatinas de dirigentes de estatais se tornem uma “chantagem permanente” ao Planalto. Essa turbulência política poderia inclusive ter efeito sobre o mercado de ações, já que estatais como a Petrobrás têm papéis vendidos em bolsa.

No mês passado, o Senado aprovou em plenário o indicado por Dilma ao Supremo Tribunal Federal Luiz Edson Fachin, após quase 11 horas de sabatina e pela margem de votos mais estreita desde que a petista chegou ao Planalto. No mesmo dia, rejeitou o embaixador Guilherme Patriota para a Organização dos Estados Americanos (OEA).

No Congresso, lideranças governistas já procuram deputados e senadores para discutir o texto. Renan e Cunha disseram na segunda-feira que querem votar o projeto até julho. O líder do governo no Senado, Delcídio Amaral (PT-MS), disse ser contra a sabatina, mas não considera o texto uma retaliação ao governo por parte dos presidentes da Câmara e do Senado. “Não, isso é do jogo. É uma coisa natural.”

Para o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), o Congresso tenta instituir um “parlamentarismo branco”. “Ficar nesse varejo não acho uma boa. Perde o País, o Congresso, o governo.”