O globo, n. 29854, 03/05/2015. País, p. 11

Proposta divide até parentes de vítimas de crimes

JULIANA CASTRO e LETICIA FERNANDES
 

Irmã de economista morto por rapaz de 14 anos diz que redução é ‘hiprocrisia’, mas sua mãe afirma ser a favor

Escurecera há pouco quando o economista Fernando Soares Martins, de 38 anos, voltava do banco onde trabalhava pela Avenida Rebouças, no bairro Jardim Paulista, em São Paulo. Parou num sinal na esquina com a Groenlândia, rua onde morava, com o vidro aberto. De longe, um grupo viu que ele usava um Rolex na mão esquerda. Abordaram o carro ordenando que ele passasse o relógio, mas, enquanto ele o entregava, fez um movimento brusco que assustou Cléverson, então com 14 anos, que segurava uma pistola. O menino, conhecido como “Dedo Mole”, deu um tiro na boca do economista, que teve morte cerebral. Era 4 de agosto de 1993. O menor passou três anos na Febem e saiu em 1996. Participou de outro assalto que terminou com a morte de duas pessoas. Foi assassinado anos depois.

A discussão sobre a redução da maioridade penal para 16 anos — proposta que já foi considerada constitucional pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara — é tão delicada que divide até membros da mesma família. Para a publicitária Maria Luisa Martins, de 50 anos, irmã de Fernando, é “hipocrisia” querer que um menor de idade seja preso:

— Num país como o nosso, eu não acredito (que a redução seja eficaz). Prender não vai adiantar, eu preferia que eles gastassem esse dinheiro melhorando as instituições para reabilitar esses jovens. A Febem não adiantou porcaria nenhuma, o menino entra de um jeito e sai pior.

Já Mariza Martins, de 84 anos, mãe de Fernando, é a favor da proposta. Ela conta que ficou “horrorizada” quando soube que o assassino de seu filho voltou a participar de crimes quando saiu da Febem:

— Sou a favor porque fui terrivelmente atingida. A polícia sabia que nessa esquina onde meu filho morreu tinham meninos assaltando e não fez nada.