Empreiteira já sofre efeitos no mercado de ações

Cynthia Decloedt

 

A prisão do principal executivo e dono da Odebrecht na sexta-feira já se reflete nos negócios com os papéis da dívida externa da empresa. A média diária do volume de negócios com os bônus da Odebrecht está cinco vezes maior do que vinha registrando nos 15 dias anteriores à prisão de Marcelo Odebrecht. Além disso, os papéis chegaram a cair 9,5% ontem no pico de baixa do dia.

Dados repassados por operadores do mercado de renda fixa mostram que os negócios com bônus da Odebrecht somaram ontem US$ 14 milhões contra uma média de US$ 2,7 milhões que vinha sendo registrada. Isso significa que cresceu em cinco vezes as compras e vendas do papel. Já os títulos da Andrade Gutierrez ficaram praticamente estáveis ontem, depois de terem perdido 15% do valor na sexta-feira.

Os volumes acima da média e a queda dos papéis expressam a preocupação dos investidores com os desdobramentos da prisão de Odebrecht. Os investidores temem a perda do grau de investimento, que representa uma nota de crédito de alta confiança na empresa. Mas também estão apreensivos quanto a possíveis multas a serem pagas pela companhia e à falta de acesso ao crédito e a novos contratos que podem afetar sua capacidade de pagamento da dívida externa, segundo profissionais do mercado secundário de dívida externa.

"Os investidores começam a ficar preocupados com o impacto das investigações daqui em diante na atividade da empresa no Brasil e no exterior e em sua capacidade de pagamento, por consequência", disse o vice-presidente de renda fixa da INTL FCStone, Rodrigo Steiner. Ele lembra que a companhia tem muitas operações no exterior e que os eventos aumentam o risco de comprometimento da imagem da empresa também fora do Brasil.

Álibi. O responsável por renda fixa da corretora Andbank, em Miami, Carlos Gribel, acrescentou que, embora muitos dos argumentos que pesam contra os bônus não sejam novos, a prisão do executivo elimina o álibi de que não figurava no grupo de detidos pela Lava Jato, até então utilizado pela Odebrecht para se blindar do escândalo de propina na Petrobrás. "No final das contas, a pressão vendedora é causada pela incerteza quanto à reação das agências de rating, aos montantes de eventuais multas, ausência de funding e o efeito em seu resultado, que certamente será afetado", disse Gribel.

Um ponto positivo da empresa é que, de acordo com Gribel, o maior vencimento previsto com bônus de dívida será apenas em 2025, no montante de US$ 550 milhões. "A companhia alongou e pré-pagou vários vencimentos que tinha anteriores a 2025", afirmou.

Ao todo, a dívida da holding Odebrecht em negociação no mercado secundário chega a US$ 2,5 bilhões, segundo fontes do mercado. Além dos papéis que vencem em 2025, os maiores montantes de bônus emitidos pela companhia estão nos bônus perpétuos, com juro de 7,5%, somando US$ 750 milhões, e nos bônus 2042, que pagam juro de 7,125%, e totalizam US$ 850 milhões.

Os bônus usados como referência de preços são os perpétuos da Odebrecht Finance, braço financeiro da companhia no exterior. Ontem, esses bônus chegaram a ser vendidos por 76% do valor de face, muito próximo do valor a que chegaram quando a Petrobrás, no início do ano, anunciou que a construtora estava na lista das companhias bloqueadas para novos negócios e suspeita de formação de cartel. Chegou ao fim do dia valendo 81,5%.

O valor de face representa um deságio que o investidor compra determinada dívida. Paga 81,5%, mas espera receber 100%. Quanto mais cai esse valor de face, menor é o grau de confiança na capacidade da empresa de honrar suas dívidas. "Os papéis da companhia têm sido negociados em cima das notícias e devem continuar assim, até que fique mais claro o real teor das investigações e suas consequências", observou Steiner.