Valor econômico, v. 15, n. 3759, 20/05/2015. Brasil, p. A5

 

Produtividade industrial cai e reforça visão do Banco Central

 

Por Denise Neumann, Ligia Guimarães e Robson Sales | De São Paulo e do Rio

O ajuste do mercado de trabalho está sendo mais intenso sobre o emprego industrial do que sobre o salário médio. De acordo com a Pesquisa Industrial Mensal de Emprego e Salário (Pimes), divulgada ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o emprego e as horas trabalhadas na indústria de transformação recuaram 3,9% e 4,6% nos 12 meses encerrados em março, percentuais inferiores à queda da produção, que foi de 6,1%. O dado mostra uma piora da produtividade da indústria, que havia se recuperado no ano passado.

Tais números reforçam o que vem afirmando o Banco Central, que vê "distensão no mercado de trabalho", mas de forma ainda "insuficiente" para a segurança da política monetária. Junto com os dados de demissão, a pesquisa do IBGE mostra que os salários subiram mais que a inflação e a produtividade nesse período, quadro que cria pressões de custo na indústria de transformação e, por consequência, traz riscos de inflação.

 

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Na comparação de 12 meses, a queda da produtividade foi de 1,5% e o salário real na indústria cresceu 1,1%. Tal situação mostra que, apesar do ajuste já feito no emprego, subiu o chamado custo unitário do trabalho (o quanto custa para produzir uma caneta, uma calça jeans, um automóvel), o que mantém a inflação pressionada. "A variável chave para o ajuste é o salário real. É ele que precisa cair para levar a uma redução de custos na indústria", observa a economista-chefe da XP Investimentos, Zeina Latif. Ela pondera que já há uma moderação dos ganhos salariais, mas insuficiente para tornar a indústria mais competitiva. "Por enquanto o que vemos é um ajuste mais forte pelo lado do emprego. Se ele fosse mais forte pelo lado do salário, seria melhor para a economia", diz ela, acrescentando que o quadro de queda da produtividade associada ao aumento do custo do trabalho é uma "desgraça".

Embora a retração do emprego na indústria brasileira não seja um processo novo - os dados do IBGE apontam que o emprego industrial vem encolhendo há 42 meses seguidos - os números de março mostram que ainda há espaço para piora em 2015, na visão de José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do Banco Fator. "A trajetória de queda é um pouco pior do que parecia, mas o ajuste da indústria ainda está acontecendo. Quando o rendimento continua crescendo é porque você não chegou na pior parte", diz.

O pior momento na indústria virá, segundo Gonçalves, quando as demissões derrubarem a folha de pagamento, que vinham caindo mês a mês, mas em níveis próximos da estabilidade, com alta de 0,1% em março, após recuos em fevereiro (-0,6%) e janeiro (-0,7%). Com o efeito das demissões, o valor da folha de pagamento real na indústria caiu 2,8% no acumulado em 12 meses até março, foi o mais intenso desde janeiro de 2004

O indicador do número de horas pagas pela indústria, que vem se deteriorando no acumulado em 12 meses e registrou baixa de 4,6% em março, sinaliza que as demissões devem se intensificar ainda este ano, diz Gonçalves. "São um indicador antecedente porque mostram, em tese, que há gente sobrando", diz.

Essa avaliação é partilhada pela Rosenberg & Associados. Segundo a consultoria, o recuo no emprego industrial tem sido mais rápido que o previsto e acompanha a queda "surpreendente", em sua avaliação, da produção do setor. Para a Rosenberg, a forte desaceleração do varejo e dos serviços também influenciam de forma negativa este cenário, assim como o desemprego em geral, "que está crescendo mais rápido do que se imaginava", diz a equipe de analistas da consultoria.

Em um cenário recessivo, em um ano de ajuste, em que as desonerações concedidas a alguns segmentos da indústria devem ser revistas pelo governo, a tendência é que as demissões no setor ganhem intensidade, em especial naqueles intensivos em mão de obra, diz Gonçalves.

Barreiras que impediram até aqui as decisões de mais cortes por parte dos empresários, como o custo de demissão e de treinamento de funcionários, perdem peso em um cenário recessivo. "Quando se vai para a recessão, o empresário fala: se eu não demitir, quebro. Eu não tenho dúvida que isso é uma coisa para 2015", acrescenta o economista do Fator.

Na opinião de Luiz Martins de Melo, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o desempenho ruim evidenciado nos dados de março é só um "aperitivo" do aperto pelo qual a economia brasileira passará em 2016. Melo vê no ano que vem a perspectiva de mais esforço fiscal e retração econômica para evitar que o país tenha sua nota rebaixada pelas agências de classificação de risco. "Em 2016 é que virá o arrocho".

Uma boa notícia trazida nos dados de março da Pimes foi a queda no custo unitário do trabalho em dólar, mas o efeito real dessa correção ainda vai depender do comportamento futuro do câmbio (cuja taxa de abril já foi menor que a de março) e da inflação doméstica. O custo unitário do trabalho nominal em dólar recuou em março expressivos 23,1% sobre igual mês do ano anterior, após cair 13,4% em fevereiro. Em relatório, o Fator destaca que o câmbio fechou fevereiro a R$ 2,84 e se depreciou até R$ 3,20 no final de março. "Embora não seja tão evidente assim, o custo está caindo", diz, ponderando que, se o dólar voltar para baixo de R$ 3, tal vantagem se desfaz rapidamente.

Do ponto de vista da inflação, esse cenário de demissões e desaquecimento na indústria não tem mostrado o efeito desejado sobre os preços e não tem ajudado o Banco Central na tarefa de levar à inflação à meta porque está afetando mais a ocupação do que o rendimento. "Quando se demite muita gente qualificada e se contrata mais barata, a média cai e você caminha para o fundo do poço", conclui o economista do Fator.

 

Desemprego persiste e economistas projetam taxa de 6,3%

 

Por Arícia Martins | De São Paulo

Depois da piora significativa observada nos primeiros três meses do ano, economistas avaliam que abril foi mais um mês de alta do desemprego e criação fraca de vagas formais. Segundo a projeção média de 17 instituições financeiras e consultorias ouvidas pelo Valor Data, a taxa de desocupação em relação à População Economicamente Ativa (PEA) nas seis principais regiões metropolitanas subiu ligeiramente entre março e o mês passado, de 6,2% para 6,3%. Em relação a abril de 2014, no entanto, o aumento deve se mais expressivo, de 1,4 ponto percentual.

As estimativas para a Pesquisa Mensal de Emprego (PME), a ser divulgada amanhã pelo IBGE, vão de 6% a 6,5%. Na sexta-feira, o Ministério do Trabalho divulga o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) referente ao mesmo mês, para o qual dez analistas estimam, em média, abertura de 57,2 mil vagas com carteira assinada. Em igual mês do ano passado, foram criados 105,4 mil postos. Para esse ano, as previsões variam de 35,5 mil a 95 mil novos empregos.

 

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Rodrigo Leandro de Moura, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV), afirma que a sazonalidade do setor agropecuário ajuda o mês de abril a registrar saldos positivos no Caged, mas mesmo assim a expectativa é de um número bem abaixo do observado no quarto mês de 2014. Em seus cálculos, as admissões superaram as demissões em 71,4 mil no mês passado. "Em 2014 a geração de postos em abril já havia sido fraca. Isso mostra que o mercado de trabalho ainda está em processo de desaquecimento, devido à desaceleração da economia", comentou.

Para Moura, a agricultura abriu 27,7 mil postos no mês passado, mas os outros setores mostraram performance mais modesta. A indústria e a construção civil devem ter eliminado, respectivamente, 11,5 mil vagas e 10,8 mil vagas, estima ele, enquanto os serviços contribuíram positivamente com 66 mil novos empregos celetistas. Em abril do ano passado, porém, esse saldo foi bem maior, e chegou perto de 89 mil novas vagas. Em sua avaliação, o cenário de redução da renda e alta no contingente de desocupados está levando as famílias a consumirem menos serviços, ramo da economia que tende a contratar bem menos em 2015 do que nos últimos anos.

Como o mercado de trabalho reage com defasagem à trajetória da atividade econômica, os efeitos da deterioração da ocupação e da renda estão se refletindo agora sobre a procura de emprego, diz Fabio Romão, da LCA Consultores. Segundo Romão, a taxa de desemprego ficou em 6% em abril - 1,1 ponto acima do percentual registrado em abril de 2014 - resultado de retração de 0,7% da população ocupada e de aumento de 0,4% da força de trabalho, na comparação com igual mês do ano passado. "Esse movimento está relacionado à piora da ocupação e da renda, que por duas leituras mostrou perda real numa intensidade forte."

Em março, o rendimento médio real dos trabalhadores nas seis maiores áreas metropolitanas do país diminuiu 3% sobre igual mês do ano anterior. Em abril, o economista da LCA espera nova redução, de 2%. Os reajustes salariais devem permanecer no campo negativo nos próximos meses, de acordo com Romão, uma vez que a inflação pressionada e o ambiente econômico recessivo dificultam a obtenção de ganhos reais. No cenário da consultoria, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) vai se manter acima de 8% em 12 meses ao longo de todo ano, enquanto a renda real dos ocupados vai encolher 1% na média de 2015.

Moura, do Ibre-FGV, alterou recentemente sua estimativa para a variação do rendimento médio real na PME, de um recuo de 0,6% para retração de 1,2% neste ano. "Com a perspectiva de piora do mercado de trabalho e tendência de aumento do desemprego, o poder de barganha dos trabalhadores diminui, e há também a inflação mais alta", diz. No segundo semestre, mesmo que a atividade mostre alguma reação, o mercado de trabalho deve seguir em desaquecimento, afirma Moura, em linha com a piora das expectativas dos empresários contidas nas sondagens da FGV.

Para o Ibre, a taxa média de desemprego medida pela PME vai subir mais de um ponto entre 2014 e 2015, de 4,8% para 6,3%. A LCA estima desocupação média de 5,8% para este ano. Romão explica que o aumento da procura por trabalho não será tão forte porque, nos últimos anos, a PEA diminuiu também por questões estruturais, como o envelhecimento da população.

Já para o saldo de vagas formais, a estimativa do economista da LCA é mais pessimista, e conta com saldo negativo de 104,3 mil postos de trabalho em 2015, considerando apenas as informações enviadas dentro do prazo legal ao MTE. As principais influências negativas, segundo Romão, serão a construção civil e a indústria.