Valor econômico, v. 15, n. 3759, 20/05/2015. Empresas, p. B5

 

Setor vive pior crise desde 2009 e pode cortar mais oferta

 

Por Ivo Ribeiro e Renato Rostás | De São Paulo

 

Clayton de Souza/AEVista geral da usina de aço da Usiminas em Cubatão (antiga Cosipa), que terá um alto-forno desligado a partir do dia 31

A decisão da Usiminas, tomada na sexta-feira à noite, de desligar dois altos-fornos para ajustar sua produção à fraca demanda do mercado de aço no país, retrata o agravamento da crise no setor. A avaliação é de que o momento é o mais crítico já vivido pelas siderúrgicas desde 2009, quando a crise global retraiu as economias de países mundo afora.

O setor já vinha operando com elevada ociosidade em seus fornos e aciarias - na média, da ordem de 30%. Havia empresas, como Usiminas, em que o índice já beirava 40%. A capacidade instalada do parque siderúrgico do país é de 49 milhões de toneladas - nos últimos 12 meses, até abril, produziu 34,1 milhões de toneladas.

Segundo apurou o Valor, a fabricante de tubos Vallourec & Sumitomo Brasil (VSB), com usina em Jeceaba (MG), também está tomando a decisão de parar seus alto-forno, com capacidade de 1 milhão de toneladas ao ano, por dois meses: junho e julho.

A parada na Usiminas, que não tem data prevista para retomar as duas unidades, significa um corte anual de oferta de cerca de 1,5 milhão de toneladas de aço bruto.

A crise do setor já vem sendo alertada pelos dirigentes do Instituto Aço Brasil, que reúne todas as empresas de aço no país, apontando para a desindustrialização, aumento das importações, em especial da China, excesso de oferta global de aço, impactos na cadeia de produção (setores consumidores, como automotivo, de bens de capital e outros) e a perda de competitividade para exportar.

Em entrevista ontem para comentar os números de abril, Carlos Loureiro, presidente do Instituto Nacional dos Distribuidores de Aço (Inda), disse que essa é a pior crise do setor, ao menos desde meados de 2009. O consumo aparente, por exemplo, que agrega produção interna e importações, que foi de 852 milhões de toneladas em abril, deve recuar ao nível de seis anos atrás neste mês. Ele lamentou o desempenho do setor durante o mês passado.

As vendas de aço plano por distribuidoras caíram 17,2% em abril, para 295,9 mil toneladas, na comparação de um ano atrás. As compras chegaram a 299,6 mil toneladas, recuo de 19,3%. As projeções iniciais apontavam baixa de 5% nos dois casos, mas Loureiro informou que os últimos dez dias do mês pioraram além do previsto, impactando os números. "Nossa certeza mesmo é que o crescimento mais relevante, também por causa da base de comparação baixa, virá só em 2016", afirmou.

Ontem, as ações da Usiminas desabaram na BM&FBovespa e arrastaram consigo o setor. Os papéis preferenciais de classe A, que compõem o principal índice, recuaram 3,66%, para R$ 5,25. A CSN figurou na terceira maior baixa do Ibovespa, com perda de 5,53%, a R$ 7,17. Já as ações PN da Gerdau caíram 3,37%, a R$ 9,45.

Segundo informações, o alto-forno menor da CSN pode ser também paralisado para ajuste de produção. Questionada, a assessoria da empresa informou que não há nenhum plano de desligamento na usina da empresa, em Volta Redonda (RJ). A Gerdau, em comunicado, disse que "o percentual de utilização da capacidade instalada da Operação de Negócio Brasil está entre 70% e 75% e não tem como antecipar medidas futuras de redução de produção de aço e de laminados". No ano passado, o grupo fez ajustes no Paraná e Bahia.

A ArcelorMittal Tubarão, em Serra (ES) está operando com a capacidade ocupada graças a exportações de placas para unidades do grupo nos Estados Unidos e outros países. Já a CSA, no Rio, vem atendendo contratos de placas no exterior. "O cenário é muito ruim", disse um executivo do setor. O Instituto Aço Brasil não se pronunciou, pois disse ser ações das empresas.

Para o BTG Pactual, o desligamento dos altos-fornos da Usiminas pode aliviar a pressão de custos sobre a siderúrgica mineira, mas o cenário ruim para o setor está mantido. Em relatório, afirmou que o mercado doméstico segue saturado e com pequeno poder de formação de preço. A única esperança de ganhos residiria na desvalorização cambial, que pode impulsionar mais as exportações.

Segundo o BTG, as instalações em Cubatão (SP) e Ipatinga (MG) responderiam por 15% a 20% da capacidade total da empresa. Já o Morgan Stanley, também em relatório, projeta em 13% a redução do potencial de volume produzido em 2015 pela companhia. Os dois bancos apostam que a Usiminas conseguirá conter custos com a medida. Mas o BTG lembra que a decisão só passa a fazer sentido econômico se durar por um período mais longo de tempo.

"Essas ações sugerem que as condições desafiadoras de demanda no setor de aços planos, que ressaltamos há algum tempo, continuam a se deteriorar", dizem Carlos de Alba e Lulica Rocha, analistas do Morgan Stanley.

O Bank of America Merrill Lynch (BofA) comentou em relatório que os fundamentos para o aço continuam fracos e a visibilidade para o setor ainda é limitada.

 

Balanços do 1º trimestre já indicavam piora do mercado

 

Por Renato Rostás | De São Paulo

Os números do primeiro trimestre já davam pistas da piora na situação das produtoras de aço no Brasil. A Usiminas, por exemplo, que anunciou o desligamento de dois altos-fornos para tentar cortar custos e ajustar sua capacidade para a demanda atual do mercado de planos, foi a única a registrar prejuízo nos três primeiros meses de 2015, por conta exatamente das vendas menores no âmbito doméstico e também do endividamento em dólar.

A Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), por sua vez, só conseguiu atingir lucro no trimestre por causa do lançamento de créditos fiscais que reverteram o prejuízo antes de tributos no período. No caso da Gerdau, a forte atuação no mercado dos EUA ajudou a companhia a conter o recuo dos lucros. Ambas também foram pressionadas pelo resultado financeiro por causa das obrigações em moeda estrangeira.

No relatório da administração, a Usiminas informou que suas vendas recuaram 12,6%, frente ao primeiro trimestre de 2014, para 1,26 milhão de toneladas. Só no Brasil, o recuo foi de 13%, para 1,11 milhão de toneladas. Com isso, a receita líquida caiu 14,7% e chegou a R$ 2,68 bilhões. A empresa enfrentou ainda forte salto nas despesas financeiras líquidas, de R$ 18,1 milhões para R$ 360,9 milhões. E a valorização do dólar elevou a dívida na moeda americana, contribuindo para a empresa fechar com prejuízo líquido de R$ 247,5 milhões.

Quanto à CSN, o volume de aço vendido subiu 1,4% até março, para 1,4 milhão de toneladas, mas a demanda interna piorou - a baixa no mercado doméstico foi de 13%, para 881 mil toneladas. A diminuição de 8,3% na receita líquida, para R$ 4 bilhões, só não foi maior porque a siderúrgica destinou mais produtos ao exterior, se beneficiando da taxa cambial.

Por outro lado, o câmbio eliminaria os ganhos da empresa não fosse o lançamento de R$ 502,5 milhões de imposto diferido no trimestre. Com isso, o lucro líquido subiu de R$ 55,3 milhões para R$ 392,1 milhões em 12 meses.

A Gerdau também viu seu resultado financeiro se deteriorar, com despesas líquidas de R$ 898 milhões, o que derrubou o lucro em 26,2%, para R$ 293,1 milhões. A empresa, no entanto, apresentou queda de apenas 1% na receita, para R$ 10,45 bilhões, em grande parte porque apresenta atuação maior no exterior que as demais.

Considerando o aço fabricado no Brasil e vendido no mercado interno, o recuo nas vendas do grupo gaúcho foi de 13,2%, para 1,25 milhão de toneladas. A queda foi compensada pelo crescimento de 96,8% das exportações, para 305 mil toneladas. Os produtos feitos na América do Norte e vendidos por lá totalizaram 1,39 milhão de toneladas, 4,1% a menos.