Valor econômico, v. 15, n. 3759, 20/05/2015. Finanças, p. C1

 

Crédito fraco leva bancos a ter folga de capital

 

Por Carolina Mandl | De São Paulo

 

Ana Paula Paiva/ValorLuiz Carlos Angelotti, do Bradesco: "Entendíamos que o crédito cresceria mais"

Até recentemente bastante preocupados com seus níveis de capitalização, os bancos já começam a respirar mais aliviados. Itaú Unibanco e Bradesco, os dois maiores bancos privados do país, começam inclusive a discutir qual destino darão aos recursos em excesso que têm no balanço.

É uma mudança e tanto em relação às previsões feitas pelas próprias instituições financeiras. Cerca de um ano atrás, os principais bancos do país buscavam alternativas para fortalecer seu capital, como venda de ativos e mudanças no pagamento de dividendos.

Em outubro de 2013, com a entrada das regras de Basileia 3, os reguladores começaram a demandar mais recursos de melhor qualidade das instituições, como dinheiro dos acionistas ou títulos de dívida sem muitos privilégios aos credores. Até 2019, essas exigências ficarão mais altas ainda.

A recente sensação de mais conforto se deve largamente à desaceleração do empréstimo, produto responsável pela exigência de mais de 80% de capital. "Entendíamos que o crédito cresceria mais e isso não se concretizou", diz Luiz Carlos Angelotti, diretor de relações com investidores do Bradesco.

Em suas projeções para capital até 2019, o Bradesco previa uma evolução do crédito entre 10% e 15% ao ano até 2019, quando as regras de Basileia 3 estarão 100% implementadas.

Até agora, porém, a expansão tem sido bem mais lenta no banco. Em 2014, o saldo de empréstimos avançou 6,5%, e, para este ano, a previsão é de 5%. Pelo menos até 2016 o banco não espera que o estoque volte a aumentar a mais de 10%. Situação semelhante se repete em Itaú, BTG Pactual e Santander, sendo que os dois últimos já registram folga de capital há mais tempo.

Em 2019, o Banco Central exigirá que os bancos tenham entre 8,5% e 11% de seus ativos em capital de nível 1, o de qualidade mais alta. Em março, o Bradesco já tinha 12,1% e, por suas projeções, encerraria 2018 com 13,5%.

Com cálculos feitos de uma forma diferente, o Itaú mostra que, se as regras de Basileia 3 estivessem integralmente em vigor hoje, o nível 1 de capital estaria em 11,4%. O número não leva em conta lucros que devem ser acumulados no período, e que, portanto, engordarão o capital, nem a expansão do crédito, que consumirá recursos.

Não foi apenas o crédito mais lento que reforçou os índices de capitalização dos dois maiores bancos do país. O retorno sobre o patrimônio acima de 20% também teve um papel importante. "Nosso foco na constante busca por eficiência no atendimento dos nossos clientes permitiu ganhos operacionais, que contribuiram para o aumento da nossa rentabilidade", afirma Marcelo Kopel, diretor de relações com investidores do Itaú Unibanco.

Entre os outros elementos que contribuíram para a situação mais confortável estão a guinada que os bancos deram para modalidades de empréstimo de mais baixo risco, como imobiliário e consignado, que demandam menos capital, e o crescimento das receitas de serviços. "A combinação desses fatores propiciou um aumento do resultado, com um consumo de capital que cresceu em velocidade menor", afirma Kopel.

 

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Até quem estava em situação mais delicada também já está mais tranquilo. É o caso de Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal. Além de já terem desacelerado a expansão do crédito, ambos os bancos contaram com uma ajuda do controlador: transformaram dezenas de bilhões de títulos de dívida em capital no ano passado.

Segundo o Valor apurou, simulações têm mostrado que o BB até 2017 estará em situação mais cômoda de capital. Por conta disso, o banco teria alternativas suficientes para não vender ações até 2019. Em recente entrevista sobre o resultado do primeiro trimestre, o banco também descartou mudanças no dividendos.

Mesmo assim, para alguns analistas é quase inevitável que o BB tenha de reduzir o patamar de pagamento de dividendos, hoje em 40%. Tito Labarta, do Deutsche Bank, considera o atual nível de 8,68% de capital principal do BB baixo. Um patamar ideal, para ele, seria de 10%. Por isso, Labarta avalia que, a depender da lucratividade alcançada, o banco ainda precise levantar recursos com a venda de novas ações.

No caso da Caixa, a diminuição dos dividendos já está em curso. Alexsandra Camelo Braga, vice-presidente de riscos da Caixa, afirma que o pagamento deste ano para o Tesouro Nacional ficará em torno de 50% do lucro. No ano passado, o percentual foi de 55,6%. "Não vamos ter problema de capital", diz a executiva. "Também não consideramos aporte de capital do controlador."

A redução na velocidade de expansão no crédito também contribuirá. No ano passado, o estoque do banco avançou 22,4%. Em 2015, ficará entre 14% e 17%.

Questionada sobre como a abertura de capital da Caixa Seguros pode reforçar o capital do banco, Alexsandra disse que não poderia comentar o assunto. É fato, porém, que a venda das ações detidas pela Caixa tornará o balanço do banco mais robusto. O banco também tem se desalavancado com a venda de carteiras de crédito.

"A capitalização dos bancos públicos despertava preocupação, mas a conversão dos títulos de dívida resolveu isso", diz Alcir Freitas, vice-presidente de instituições financeiras da Moody's. "Daqui até 2018, a situação é administrável, mas o que vai determinar isso é o ritmo de expansão do crédito."

Com mais folga de capital, os bancos privados recebem perguntas de investidores sobre o destino que darão aos recursos.

Uma das opções avaliadas pelo Bradesco é a distribuição de mais dividendos aos acionistas. Essa é uma alternativa considerada também pelo Itaú, mas Kopel diz que o banco também pode buscar expandir seus negócios ou recomprar suas próprias ações.

Valor apurou que o BTG Pactual considera que uma aceleração na distribuição de dividendos, que teria impacto positivo no retorno, poderia não ser bem vista pelo mercado.

Para Labarta, do Deutsche Bank, não necessariamente os bancos precisam encontrar um destino para a folga de capital agora. "Não há pressa. Dado o cenário macroeconômico, o excesso de capital não é uma característica ruim."

Em breve, o BC também exigirá mais recursos de bancos considerados domesticamente importantes. A quantidade de capital exigida ainda é desconhecida.

 

Santander confirma interesse em filial do HSBC

 

Por Fabiana Lopes | De São Paulo

O presidente do Santander Brasil, Jesús Zabalza, confirmou ontem que o banco estuda a possível aquisição da filial brasileira do HSBC, conforme o Valor já havia adiantado. A instituição, no entanto, ainda não lançou nenhuma proposta pelo negócio.

"Vamos estudar a proposta pelo HSBC. Estamos vendo todas as oportunidades", afirmou o executivo ao ser questionado por jornalistas, durante evento promovido pelo banco para lançar um pacote de produtos e serviços dedicado a pequenas e médias empresas.

Ele também declarou que o custo da transação pode ser um atrativo para a instituição, considerando o valor de US$ 4 bilhões que vem circulando na imprensa. "Quatro bilhões de dólares para um capital como o nosso não é exagerado. Para o tamanho do Santander é perfeitamente acessível", afirmou.

No início do encontro o executivo havia dito, no entanto, que a estratégia atual do Santander se apoia em crescimento orgânico e que o banco tem capital para buscar expansão por meio dos seus clientes. Mesmo assim, ele ressaltou que a instituição tem "responsabilidade de olhar todas as oportunidades de expansão que aparecem no mercado".

Durante a conversa com jornalistas, Zabalza também falou sobre a aposta do banco no segmento de pequenas e médias empresas. O Santander lançou ontem no Brasil um programa de apoio, com oferta de produtos e serviços específicos, além de disponibilizar R$ 15 bilhões em crédito para esse nicho no país. A operação se integrará a uma plataforma já implementada em locais como Espanha, Reino Unido e México.

Atualmente, o Santander tem mais de 4 milhões de clientes nessa segmentação, sendo 700 mil no Brasil. Com o novo programa, o banco diz quer pretende reduzir o prazo de abertura de contas correntes, além de simplificar o processo de concessão de crédito, Promete também a instalação de máquinas de captura de cartões de crédito ou débito (POS, na sigla em inglês) da Getnet em dois dias.

A ideia é também apoiar a capacitação e desenvolvimento dos clientes, além de subsidiar um estagiário por quatro meses em algumas companhias. A expectativa é disponibilizar 500 estagiários em 2015.

Questionado se o banco não temia investir nesse segmento em um período em que o mercado mantém o foco em setores de menor risco, Zabalza disse que o banco tem expertise para conceder o crédito de forma criteriosa. "O ano tem um contexto mais adverso, mas temos confiança de que estamos preparados para enfrentar a inadimplência", afirmou.

O volume de R$ 15 bilhões no crédito não tem prazo para ser concedido e deve ser distribuído conforme a demanda dos clientes.