Valor econômico, v. 15, n. 3755, 14/05/2015. Brasil, p. A3

 

México e Brasil devem selar acordo de investimentos

 

Por Daniel Rittner e Fernando Exman | De Brasília

 

Ruy BaronMeade, do México, diz que país quer ampliar acordo de preferências tarifárias que dá descontos mútuos na importação

Os governos do Brasil e do México devem firmar um acordo de promoção e facilitação de investimentos, durante visita da presidente Dilma Rousseff ao país, no dia 25. Ao todo, Dilma e o colega Enrique Peña Nieto se preparam para assinar de cinco a sete convênios, em áreas que envolvem intercâmbio acadêmico e cooperação em questões agroindustriais, além de dar um impulso nas negociações para a ampliação dos setores cobertos por descontos nas tarifas de importação.

"Esse conjunto de acordos reflete a amplitude das nossas relações", afirmou ao Valoro chanceler mexicano, José Antonio Meade, em rápida passagem por Brasília, onde se reuniu com autoridades brasileiras para acertar detalhes da viagem de Dilma. Será uma visita de Estado, a mais importante no simbolismo diplomático, por tratar-se de convite reservado a não mais do que dois líderes estrangeiros a cada ano.

Meade disse que o objetivo do México é pelo menos duplicar, em dez anos, a atual corrente de comércio bilateral. Em 2014, ela foi de US$ 9 bilhões. Apesar do histórico liberalizante, os mexicanos querem uma postura realista nas discussões com o Brasil.

Por isso, o chanceler deixa claro que não pretende entrar em conversas imediatas sobre um acordo de livre comércio com o país e prefere seguir um caminho mais prático: ampliar o atual acordo de preferências tarifárias, de 2002, que dá descontos mútuos nas alíquotas de importação. Hoje, segundo o Ministério do Desenvolvimento, 792 produtos são cobertos pelos descontos.

"Os dois países manifestam disposição para encontrar, setorialmente e de forma gradual, esquemas que permitam uma relação comercial mais profunda", frisou Meade. Nessa área, não deve haver anúncios concretos na visita de Dilma, mas a expectativa é de que sejam destravados obstáculos para iniciar negociações. "Essa visita permitirá aos dois presidentes e às suas delegações saber quais são os horizontes e oportunidades existentes."

 

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Um seminário de negócios deve reunir pelo menos 80 empresários brasileiros e mexicanos durante a visita. O evento está sendo organizado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) e por sua congênere mexicana, em parceria com o Ministério das Relações Exteriores e com a Apex Brasil. Têxteis e confecções, brinquedos, químicos, construção, alimentos, aeronaves, autopeças, tecnologia da informação, produtos de metal, eletroeletrônico e cosméticos são os principais setores envolvidos.

O acordo de investimentos com o México, uma espécie de versão "light" dos tratados firmados na década de 1990 com países europeus, será o primeiro do Brasil com um parceiro da América Latina. Dois acordos foram assinados pelo governo brasileiro, em março, com Angola e Moçambique - nenhum deles com a dimensão do convênio prestes a ser firmado. O Brasil é o maior destino de investimentos estrangeiros do México na região. Empresas mexicanas como América Móvil (dona da Claro), Femsa (distribuidora da Coca-Cola) e Bimbo (fabricante de pães) têm operações consolidadas no país.

Nos acordos de promoção e facilitação, foram abandonadas cláusulas do passado, hoje tidas como inaceitáveis pela diplomacia brasileira. Não há mais a exigência de indenização à vista e em dinheiro no caso de eventuais desapropriações. Nem a possibilidade de que o investidor que se sentir prejudicado possa recorrer a um tribunal independente - como a Câmara Internacional de Comércio, em Paris, ou o Banco Mundial - contra um Estado nacional.

Na nova versão, um comitê conjunto de implantação e monitoramento do acordo é formado por autoridades e empresários, com o objetivo de prevenir conflitos. Cria-se a figura de um "ombudsman" para responder dúvidas e receber queixas dos empresários. Além disso, passa a haver tratamento igualitário aos investimentos - ou seja, qualquer tipo de vantagem às companhias locais precisa ser automaticamente estendido. "Queremos reforçar o nosso marco jurídico no campo econômico", observou Meade.

Questionado sobre a Aliança do Pacífico, que tem sido chamada reservadamente de "puro marketing" por autoridades brasileiras, o chanceler fez uma defesa ardorosa do bloco - formado por México, Colômbia, Chile e Peru.

Meade lembra que nem todos tinham acordos de livre comércio entre si, mas hoje 92% das tarifas entre esses países já foram zeradas. Também cita uma "primeira geração de acordos muito positivos" em áreas como mobilidade de pessoas e de capitais. Um deles permite que ações de empresas cotadas nas bolsas de valores de qualquer um dos sócios possam ser compradas por cidadãos de países do bloco. Outro convênio eliminou a exigência de vistos para turismo. Com isso, segundo ele, o fluxo de turistas peruanos no México aumentou 50% e os colombianos saltaram de nono para quinto na lista de visitantes.

 

País perde espaço nas trocas comerciais com a Europa

 

Por Assis Moreira | De Genebra

A zona do euro acelerou ligeiramente o crescimento no primeiro trimestre, com expansão da França, mas também da Alemanha e Itália. Em meio a essa expansão, porém, o Brasil perdeu terreno e foi superado pelo Canadá como décimo maior parceiro comercial dos europeus.

Estatísticas europeias a que o Valor teve acesso mostram que entre os maiores ganhadores no comércio com os 28 países da União Europeia (UE) estão os canadenses, neste começo de ano. Suas exportações aumentaram 31% para o bloco europeu e suas importações originárias da Europa cresceram 15% entre janeiro e março.

No mesmo período, as exportações brasileiras sofreram contração de 1% para a UE e as importações procedentes da Europa caíram 2,6%. Mas em março as exportações do Brasil cresceram 12% em relação a março de 2014 para o bloco comunitário, ante resultado negativo em janeiro e fevereiro.

Em todo caso, a fatia de produtos brasileiros no total importado pela UE está agora em torno de 1,6% - seu menor nível desde 2003. Em 2011, chegou a 2,3% do que os europeus compravam no exterior. A média era de 2%.

Por sua vez, países como Canadá, Índia e Turquia vêm aumentando sua fatia no total importado pelos europeus.

"Esse resultado não está acontecendo só com a Europa", afirma Luigi Gambardella, presidente da Associação UE-Brasil, que visa estimular negócios bilaterais. "O Brasil exporta sobretudo commodities e, com menos demanda, exporta menos. Com a recessão, o Brasil compra também menos da Europa. O Brasil precisa melhorar a competitividade de sua indústria".

O Brasil era habituado a superávit comercial com os europeus, que atingiu o pico de € 11,6 bilhões em 2007. Desde 2012, porém, o país passou a acumular déficit, que atingiu € 5,8 bilhões no ano passado. No primeiro trimestre de 2015, o déficit acumulado é de € 1,4 bilhão.

Os canadenses derrubaram o Brasil da posição de 10º parceiro europeu com trocas adicionais de € 3 bilhões, dos quais quase € 2 bilhões foram aumento de exportações para o mercado europeu. Suas vendas de peças para o setor aeronáutico, com alto valor agregado, quase quadruplicaram.

No caso do Brasil, o comércio com a UE sofreu contração de € 320 milhões entre janeiro e marco. No período, o Brasil conseguiu aumentar a exportação de café para a UE, assim como minério e aço. E continuou importando mais produtos químicos, por exemplo.

Para Jonathan Loynes, economista chefe para Europa da Capital Economics, a inflação baixa na zona do euro deve continuar a estimular o consumo nos próximos trimestres. E o euro desvalorizado deve ajudar exportações. Mas persistem riscos de que a crise na Grécia afete a recuperação.

Em abril, economistas da Organização Mundial do Comercio (OMC) sugeriram que as perspectivas de expansão das exportações brasileiras eram melhores na UE e nos Estados Unidos do que na China em 2015, por causa da desaceleração chinesa e da melhora da situação nas duas outras grandes economias.

Em 2014, o Brasil teve a maior queda nas exportações entre as grandes economias. O país caiu três posições no ranking de maiores exportadores (de 22º para 25º) e a participação no comércio global baixou de 1,3% para 1,2% do total.

 

Divergência política opõe Brasil ao parceiro

 

Por Daniel Rittner e Fernando Exman | De Brasília

Embora busquem uma aproximação nos temas econômicos e comerciais, Brasil e México mantêm uma divergência no campo político que reflete as dificuldades para a execução de uma reforma na governança dos organismos internacionais multilaterais. Enquanto o Brasil busca uma cadeira permanente no Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas, o governo mexicano defende uma reformulação do modelo de atuação órgão.

Para o chanceler do México, José Antonio Meade, o Conselho de Segurança teria uma maior representatividade se fosse criada uma terceira categoria de membros. Hoje, há os membros permanentes e os temporários. De acordo com a proposta mexicana, os representantes dessa nova categoria teriam mandatos maiores que os integrantes temporários e poderiam se reeleger. Por outro lado, não teriam poder de veto. Assim, argumentou Meade, não seriam replicados alguns elementos que dão "rigidez extrema" ao colegiado.

"Sentimos que um modelo onde se amplie o número de membros permanentes e não permanentes não é a melhor maneira de gerar governança ao conselho", afirmou ele ao Valor, em meio a uma visita a Brasília para preparar a agenda da viagem que a presidente Dilma Rousseff deve fazer ao México no fim do mês.

O tema não deve ocupar lugar central na visita, quando os países devem firmar um acordo de investimentos e buscar entendimentos para avançar a cooperação bilateral. "Claramente o Conselho de Segurança, que faz 70 anos, não reflete a importância que têm os países e o Brasil", disse o chanceler. "Mas sentimos que o modelo de membro permanente tem de maneira inerente vícios que não valeria replicar. Temos que explorar outras fórmulas de participação que corrijam essa falta de representatividade, sem ter as mesmas deficiências."