Entre a inflação e o desemprego

 

Indicadores econômicos divulgados ontem surpreenderam negativamente e deixaram clara a situação limite em que se encontra a economia do país: a inflação aumentou, a atividade econômica encolheu, e as empresas demitiram mais — tudo isso numa intensidade maior do que previam governo e analistas. O cenário mostra bem quão complicada é a tarefa do Banco Central (BC). Precisa aumentar os juros e segurar preços que não param de subir, mas não pode ignorar a desaceleração da atividade econômica, que já chegou ao ponto de engolir milhares de empregos. Assim, crescem as dúvidas sobre os rumos dos juros nos próximos meses.

Há quem acredite que a taxa básica, a Selic, hoje em 13,75% ao ano, será elevada a mais de 14,5%. Um dos fatores que mais preocupa os economistas é a combinação entre inflação alta e ritmo fraco da economia. Segundo o IBGE, o IPCA-15 de junho — espécie de prévia da inflação oficial, medida pelo IPCA — chegou a quase 1%. Ao mesmo tempo, o IBC-Br, conhecido como o “PIB do BC”, caiu 0,84% em abril, sinal de que o segundo trimestre deve ser de PIB fraco. Para completar o cenário, o Ministério do Trabalho informou que o Brasil fechou 115.599 vagas formais em maio.

— O dilema é estarmos nesse momento de recessão e ao mesmo tempo o BC ter de subir juros. Mas, se não elevar, o custo pode ser maior no futuro — avalia Marcel Balassiano, economista da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV), que espera que a Selic chegue a 14,5% em setembro.

PARA ECONOMISTA, ‘MAL MAIOR É O DESEMPREGO’

José Márcio Camargo, economista da Opus Gestão de Recursos e professor da PUC-Rio, acredita que o Copom possa ir além. Já o banco ABC Brasil, em relatório, prevê um cenário menos apertado, com a Selic subindo até 14,25% em julho e parando por aí.

— Nossa previsão é de alta de até 14,5%, mas se a inflação continuar acelerando, o BC não vai conseguir parar em setembro — afirma Camargo.

Júlio Miragaya, vice-presidente do Conselho Federal de Economia (Cofecon), acredita que subir juros não é a solução ideal para combater a inflação, mas não indica uma alternativa para conter os preços. Para ele, o que mais preocupa no cenário atual é a piora no mercado de trabalho.

 A inflação é um mal menor. A expectativa é que a taxa do segundo semestre anualizada fique em 5,4% , próxima da meta. O mal maior vai ser o desemprego — avalia Miragaya.

 

PREÇOS TÊM MAIOR ALTA PARA JUNHO EM QUASE 20 ANOS

A inflação acelerou neste mês e trouxe um novo recorde negativo. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo-15 (IPCA-15), que funciona como uma prévia do IPCA, usado nas metas do governo, registrou alta de 0,99% em junho, bem acima do avanço do 0,60% visto no mês anterior, informou ontem o IBGE. Trata-se da maior escalada de preços num mês de junho desde 1996 (quando foi de 1,11%) — ou seja, em quase 20 anos.

O IPCA-15 acumulou nos últimos 12 meses alta de 8,80%. Segundo o IBGE, o resultado de junho foi pressionado, principalmente, pelo aumento dos preços de alimentos e despesas pessoais. Entre os maiores vilões, destacaram-se artigos como a cebola, 40% mais cara, e o tomate, 13%— além dos jogos de azar. A tradicional fezinha dos brasileiros ficou nada menos que 37,77% mais cara no mês, maior impacto individual no IPCA-15. Respondeu por 0,14 ponto percentual do índice.

Os resultados complicam o esforço do governo de manter sob controle as expectativas de inflação.

 

MAIS DE 115 MIL EMPREGOS COM CARTEIRA SOMEM NO MÊS

O Brasil perdeu 115.599 vagas de empregos formais em maio, de acordo com dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) divulgado pelo Ministério do Trabalho. Foi a primeira vez em 23 anos que as demissões superaram as admissões em um mês de maio. O saldo negativo do mês passado foi resultado de 1.464.645 admissões contra 1.580.244 demissões no mercado de trabalho. Dos grandes setores da economia, só houve geração de vagas na agricultura, com acréscimo de 28.362 postos de trabalho. Indústria (-60.989), serviços (-32.602) e construção civil (-29.795) eliminaram empregos formais.

Para o ministro do Trabalho, Manoel Dias, o mau desempenho do mercado de trabalho é reflexo de uma “crise política e não econômica”. Segundo ele, com os ajustes que estão sendo feitos pelo governo federal, é possível uma retomada da geração de empregos ainda este ano. Dias, contudo, não quis especificar quando isso ocorreria:

— Não dá para dizer em que momento.

 

ECONOMIA ENCOLHE 0,84%, ESTIMA BANCO CENTRAL

A economia brasileira dá sinais de que a recessão é mais forte do que a esperada até agora. Segundo o Banco Central, a queda da atividade em abril foi de 0,84%: mais que o dobro da previsão dos analistas para o chamado “PIB do BC”. O índice da autoridade monetária — IBC-Br — mexeu com as expectativas dos economistas do mercado financeiro, que começam a admitir que a economia pode encolher até 2% neste ano. E já há quem preveja resultado negativo também em 2016.

Os dados revelam ainda que o tombo da economia em março foi maior do que o calculado inicialmente: passou de -1,07% para -1,51%. Com isso, no primeiro trimestre, o PIB encolheu 0,9%, em vez de 0,81% como estimado antes pelo BC. E os números já contaminam as projeções para o ano que vem.

— A preocupação maior agora é com 2016. Estamos, por enquanto, prevendo queda de 0,1% do PIB em 2016, mas provavelmente será pior do que isso — diz Sérgio Vale, da MB Associados.