Valor econômico, v. 16, n. 3754, 13/05/2015. Brasil, p. A2

 

Clima da economia atinge o pior nível em 26 anos, aponta pesquisa

 

Por Alessandra Saraiva | Do Rio

Incertezas em relação à condução da política econômica, emperrada por problemas de articulação política no Congresso, levaram o clima da economia brasileira a atingir o nível mais baixo em 26 anos. O Índice de Clima Econômico (ICE) do Brasil, feito em parceria do instituto alemão Ifo com a Fundação Getulio Vargas, passou de 57 pontos para 49 pontos de janeiro a abril - recuo de 14% e o pior patamar do indicador, cuja série teve início em janeiro de 1989.

A pesquisadora do Instituto de Economia da FGV (Ibre) Lia Valls não descartou a possibilidade de continuidade na trajetória descendente do indicador, calculado a partir da Sondagem Econômica da América Latina, com base em entrevistas com 1.092 especialistas em 115 países.

De acordo com Lia, a desempenho negativo brasileiro foi tão intenso que ajudou a reduzir a confiança dos analistas em relação à economia de toda a América Latina. O Indicador de Clima Econômico da América Latina (ICE), indicador síntese da sondagem latino-americana, registrou queda de 5,3% entre janeiro e abril, de 75 para 71 pontos. Ao detalhar os dois subindicadores componentes do ICE, Lia informou que houve recuo de 11% no Indicador de Expectativas (IE); e o Indicador da Situação Atual (ISA) avançou 3,4% no período.

A economista explicou que o ICE brasileiro foi afetado negativamente pela avaliação do momento por que passa o país. Enquanto o IE caiu 9,5%, para 76 pontos, o ISA caiu 27% no período, para 22 pontos, o mais baixo desde janeiro de 1993 (20 pontos). "Quem tem patamar em torno de 20 pontos na situação atual é a Venezuela. E a Venezuela não é um bom exemplo", disse.

Ela comentou que, na sondagem, há um quesito que apura os maiores entraves ao crescimento econômico de cada país. No caso do Brasil, a falta de confiança na política econômica ocupou a primeira posição entre os fatores limitantes do crescimento.

Quando questionada sobre os fatores que elevaram a desconfiança dos analistas em relação a esse quesito, no Brasil, Lia lembrou que, nos últimos meses, houve embates entre os poderes Executivo e Legislativo, com dificuldade para o governo aprovar suas medidas no Congresso.

Isso acaba por afetar a avaliação da condução de política econômica. Embora tenha considerado como voltadas para a "direção certa" as ações anunciadas nesse campo - como as de ajuste fiscal, por exemplo -, Lia reconheceu que o governo não está conseguindo "aprovar o que quiser, sem problemas" no Congresso, como já foi no passado. "Estamos em uma situação inusitada", afirmou.

Para ela, é possível que o ICE brasileiro continue a cair. Isso porque o indicador tem forte aderência aos indicadores de crescimento econômico - e o mercado, atualmente, prevê PIB negativo para 2015.

Na avaliação dela, a única possibilidade de melhora seria nas expectativas relacionadas ao Brasil, nos próximos meses, impulsionadas por ambiente internacional mais favorável. "Pode ser que melhore, e ajude a elevar um pouco o ICE", considerou. Mas acrescentou não saber com certeza se isso seria suficiente para tirar o indicador do atual recorde negativo, registrado ao término de abril.

 

Queda da indústria em março se concentrou em cinco locais

 

Por Alessandra Saraiva | Rio

O cenário regional da produção da indústria em março mostrou quedas em poucos lugares. Cinco dos 14 locais pesquisados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostraram retração, em relação a fevereiro. No entanto, esses recuos atingiram as regiões mais relevantes para o resultado nacional. Um dos aspectos mais preocupantes é a trajetória do Nordeste, cuja produção apresentava sinais de estabilidade até fim de 2014; mas começou a cair em seu acumulado em 12 meses a partir de 2015, e mostra recuo de 2,2% até março - o mais forte em três anos. A localidade foi influenciada por piora no desempenho das indústrias de bens não duráveis, preponderantes na região; além de problemas técnicos em seu parque de refino.

Os dados constam da Pesquisa Industrial Mensal - Produção Física Regional (PIM-PF Regional) de março, divulgada ontem pelo IBGE. Para especialistas, a queda expressiva em 12 meses da produção nordestina, quase 10% da atividade nacional, abre mais uma perspectiva negativa para o futuro da indústria. Silvio Sales, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), já aposta em nova queda para produção em 2015, mais forte do que a de 2014 (-3,2%).

 

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Entre os locais de peso na indústria nacional que tiveram queda, em março ante fevereiro, está São Paulo (-0,8%) - 35% da produção do país. A atividade paulista caiu 6,8% em 12 meses até março, devido a recuos no setor automotivo.

Outro aspecto preocupante é a trajetória da variações nas produções industriais dos estados de Ceará, Pernambuco e Bahia que compõem a Região Nordeste do IBGE. De dezembro de 2014 a março de 2015, a taxa em 12 meses, no caso do Ceará, saiu de -2,9% para -4,3%, no período; na Bahia, foi de -2,8% para -5,4%; e Pernambuco, de 0,3% para -1%.

Abritta explicou que o resultado do Nordeste, nesse começo de ano, foi prejudicado por problema sazonal. Houve parada em unidade de refino por problema técnico, afirmou ele. Segundo noticiário da época, em janeiro, ocorreu explosão na Refinaria Landulpho Alves, da Petrobras, na Bahia.

Porém, o gerente da coordenação de indústria do IBGE, André Macedo, admitiu que esse fator não foi o único. A economia mais fraca, e menor cadência na demanda, também afetam a indústria nordestina. Mas, até então, a produção na localidade não mostrava, por conta desses fatores, recuos tão intensos. "Ela [a indústria do Nordeste] vinha ligeiramente positiva até o fim do ano passado, e fechou em estabilidade", afirmou. "Mas, agora, mostra viés de baixa", admitiu.

Nem mesmo a manutenção de bons resultados em 12 meses no Centro-Oeste, como Mato Grosso (3,3%) e Goiás (1,9%), observados em março, poderiam ajudar a equilibrar possível trajetória negativa sustentável na indústria nordestina, avaliou Macedo. "O Centro-Oeste é muito forte em agroindústria, soja por exemplo, com recordes de safra esse ano", lembrou. "Mas o peso da região na indústria nacional é de 4,5%, metade do Nordeste".

Já o consultor do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV/Ibre) Silvio Sales não descarta a possibilidade de a indústria nordestina ser afetada por piora na renda do trabalhador esse ano. Embora a região tenha forte presença de usuários de programas de transferência de renda considerou que qualquer fator negativo na renda do trabalho diminui poder aquisitivo. Com orçamento apertado, compras em itens não-duráveis cuja produção é forte no Nordeste - como calçados, vestuário -, são desestimuladas. "A primeira constatação é que os três principais estados [do Nordeste] pioraram seus resultados", disse. "Agora, se temos evidência de que o mercado de trabalho, e o rendimento está pior, e se o comércio estiver vendendo menos, isso afeta a indústria", comentou.