Para Dilma, todos podem criticar, em especial Lula

Ricardo Galhardo

Vera Rosa

 

A presidente Dilma Rousseff amenizou ontem as críticas de seu padrinho político, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ao governo e ao PT. Um dia depois de Lula dizer que o PT está “velho” e “só pensa em cargos”, na esteira de alfinetadas que atingiram o governo, Dilma evitou esticar a polêmica envolvendo “criador” e “criatura”.

“Eu acho que todo mundo tem o direito de criticar. Mais ainda o presidente Lula, que é muito criticado por vocês (jornalistas)”, disse a presidente, em visita ao Rio.

Apesar da declaração pública, Dilma ficou contrariada com as provocações, que denotam falta de unidade. No Palácio do Planalto, a avaliação é de que Lula se movimenta para se afastar dos escândalos de corrupção que abalam o partido e aponta as falhas no governo porque não é ouvido por Dilma. O gesto seria planejado com o intuito de se descolar dos problemas e tentar se preservar para a eleição presidencial de 2018.

As duras críticas de Lula ao PT e ao governo entrarão na pauta da reunião da Executiva Nacional petista, hoje, em São Paulo. Desde a semana passada, a ofensiva do ex-presidente vem ganhando cada vez mais intensidade. Na segunda-feira, ele disse em palestra que o PT envelheceu, está viciado em poder, apegado a cargos e não mobiliza mais multidões.

Dias antes, em reunião com religiosos, Lula já havia afirmado que tanto ele como Dilma estavam “no volume morto” e o PT “abaixo do volume morto”. Em mais uma estocada, chamou a gestão Dilma de “governo de mudos” e admitiu que a presidente não cumpriu promessas de campanha.

O líder do governo na Câmara, José Guimarães (CE), rebateu as críticas do ex-presidente e disse que é melhor aguardar as eleições municipais de 2016 em vez de “ficar apregoando que o PT está no fundo do poço ou está no ‘volume morto’ ou coisa que o valha”. “Lula tem direito de dizer o que quiser e eu não me estresso com essas coisas. Quem ganha eleição é economia, é bolso. Se a economia retomar o processo de crescimento, nós vamos nos sair bem”, afirmou Guimarães, que é um dos vice-presidentes do PT.

Para Alberto Cantalice, outro vice-presidente do partido, as opiniões de Lula refletem a insatisfação generalizada da base petista. “Nas redes (sociais) a militância cobra muito a direção do PT”, afirmou.

O ataque do ex-presidente causou mal-estar no PT e no governo, embora tenha sido bem recebido entre aqueles que pedem mudanças radicais no partido. Petistas acreditam que Lula pode ter sido motivado por questões como insatisfação com seu próprio grupo político - que preferiu garantir o controle da máquina no 5.º Congresso da legenda a aprovar medidas que arejassem o partido -, queda nas pesquisas de opinião e temor em relação aos desdobramentos da Operação Lava Jato.

‘Vanguarda’

Criticado a portas fechadas por Lula, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, foi cauteloso e disse que o ex-presidente adotou “posição de vanguarda” quando constatou que o PT precisa de uma “revolução” interna.

“Eu participo de uma corrente do PT que acha que algumas questões partidárias têm de ser reformuladas”, argumentou Cardozo, numa referência ao grupo Mensagem ao Partido. “Nosso líder maior, ao fazer essa reflexão, induz todos os petistas e simpatizantes a refletirem sobre isso.”

Irritado com o que chama de “passividade” do governo, Lula já disse mais de uma vez, porém, que Cardozo “perdeu o controle” da Polícia Federal.

Para o senador Lindbergh Farias (RJ), “o PT não pode só dizer amém” ao governo Dilma. “Lula está certo ao dar essa chacoalhada”, observou.

Em nota de desagravo ao ex-presidente, a bancada do PT no Senado diz que está em curso uma “sórdida campanha” de desconstrução da imagem dele, ancorada pelo “ódio dos ressentidos”.

“Entendemos perfeitamente que alguns tenham medo de serem derrotados de novo por Lula em 2018. Mas esse medo não pode dar vazão a atitudes pouco republicanas e francamente antidemocráticas”, escreveram os petistas. Para o ex-deputado Paulo Delgado, filiado ao PT, Lula também deveria fazer uma autocrítica. “A impressão que tenho é que ele fala num quarto de espelhos, refletindo o próprio rosto”, disse.