Valor econômico, v. 16, n. 3753, 12/05/2015. Política, p. A5

 

Patrus defende fim da eleição direta para direção do PT

 

Por Maria Cristina Fernandes | De São Paulo

 

Ruy Baron/Valor - 11/3/2015Patrus: "Perdemos os espaços de discussão política. Às vezes é melhor esse calor"

Um mês antes do 5º Congresso do PT, o ministro do Desenvolvimento Agrário, Patrus Ananias, lançou três ideias para salvar o partido do desmanche.

No texto "O PT na Encruzilhada", disponível na página do seu partido na internet, o ministro propõe a extinção das eleições diretas para a escolha dos dirigentes da legenda, que os petistas chamam de PED, o fim das contribuições de empresas para o financiamento do partido e de seus candidatos e o controle das despesas partidárias pela militância.

As propostas vêm de um ministro que ajudou a por em pé uma das mais sucedidas políticas públicas do PT - o Bolsa Família - mas a credibilidade do que propõe ao partido deriva do que fez fora do poder.

Na entressafra dos mandatos que cumpriu como prefeito de Belo Horizonte, ministro dos governos Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff e deputado federal, Patrus Ananias não se dedicou a consultorias privadas, atividade predileta de ex-ministros petistas.

Voltou para as salas de aula na faculdade de Direito da PUC de Minas, onde é professor, e da Escola do Legislativo da Assembleia do Estado, de onde é funcionário concursado desde 1982.

Suas propostas estão longe de ser consenso no partido, a começar pelo PED. Criado em 2001, um ano antes de o PT chegar à Presidência da República, foi anunciado como capítulo da democratização do partido. Transformou-se em instrumento da ala majoritária do PT, que desde então mudou de nome várias vezes, na busca de unidade para o exercício do poder.

O PT hoje tem o triplo dos filiados (1,5 milhão) da época em que a eleição interna foi instituída sob o comando de José Dirceu, primeiro presidente do partido eleito pelo voto direto. A formação desse colégio eleitoral tornou-se, nas palavras de Patrus Ananias um "instrumento de manipulação".

Os escândalos de corrupção aumentaram a abstenção dos velhos militantes. Muitos dos novos votantes têm pouca identidade com o PT. "Levamos para o interior do partido os mesmos procedimentos condenáveis dos processos eleitorais. Através do uso indevido de recursos financeiros desqualificamos o PED com as filiações massivas de pessoas que muitas vezes nada sabem ou praticam do ideário petista. Eleitores que são conduzidos para votar com práticas que lembram os currais eleitorais e o voto de cabresto", diz o ministro.

Patrus propõe a retomada das pré-convenções partidárias que elegiam delegados a partir dos núcleos locais, passando pelas instâncias municipais e estaduais até chegar ao encontro nacional do partido. Com as eleições diretas a baixar a fervura, os encontros ficaram menos radicalizados. O ministro petista, que pertence à corrente majoritária (Construindo um Novo Brasil), diz, por telefone, que é esse embate que hoje falta ao PT: "Perdemos os espaços de discussão política. Às vezes é melhor esse calor".

Foi sob uma direção eleita pelo voto direto de seus militantes, que o PT atravessou o 'mensalão' sem punir seus dirigentes nem mudar o modo de se financiar e ingressou no 'petrolão'. O ministro do Desenvolvimento Agrário não vê outra saída senão abrir mão do dinheiro.

O discurso em torno do fim do financiamento privado de campanha tornou-se mantra no partido. Como a tese é incluída na reforma política e esta não se faz por decreto, o PT foi acusado de usá-la como escudo. Enquanto a reforma não sai, sempre poderá dizer que tem a solução para higienizar as relações entre o dinheiro e a política mas os outros partidos - e Supremo Tribunal Federal que sentou em cima de uma ação sobre o tema - impedem sua execução.

Depois da prisão do ex-tesoureiro João Vaccari Neto, a direção nacional decidiu proibir doações empresariais para todos os diretórios municipais, estaduais e para o nacional. Patrus defende que o partido estenda a proibição para a disputa eleitoral de 2016.

Não falta quem já indague se o partido, que ruma para uma eleição difícil depois de 'petrolão' e ajuste fiscal, sobreviverá a uma campanha sem dinheiro. "Não dou de barato que haverá perda eleitoral", diz Ananias, que não vê alternativa ao partido senão correr esse risco.

O ministro acha que o partido deve aceitar contribuições de pessoas físicas, ainda que sob limites: "O que quero mesmo é que os militantes ampliem suas contribuições e que a classe média seja estimulada a tirar do bolso para contribuir com uma política melhor".

O histórico recente do partido autoriza ceticismo. A despeito do veto da direção nacional, por exemplo, os comandos estaduais do partido promovem jantares com empresários para fechar o buraco da campanha eleitoral do ano passado. "Há uma situação objetiva que são as dívidas de campanha; temos que saldá-las da forma mais transparente possível para começar em novas bases", diz, com otimismo, o ministro.

Patrus Ananias defende que dinheiro a ser arrecadado em 2016, por mais reduzido que seja, passe a por controles internos de despesa. Quer que o PT aplique, internamente, o orçamento participativo que o partido adotou em algumas de suas primeiras prefeituras, como a de Belo Horizonte, que comandou no início dos anos 1990.

Questiona as campanhas eleitorais como destino quase único da arrecadação do partido. Defende, por exemplo, que o PT retome os cursos de formação política de lideranças locais que marcaram o recrutamento dos quadros do partido no início de sua história e hoje estão restritos à Fundação Perseu Abramo.

O PT fará seu 5º Congresso no momento em que a presidente Dilma Rousseff comanda o pior arrocho da história do partido no poder e sua principal liderança, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, é alvo de panelaços de norte a sul.

O ministro ainda não sabe que partido sairá de um congresso realizado nessa conjuntura, mas, ao apresentar o documento, pelo menos, mostra que tem noção de como a legenda entrará nesse momento de discussão interna: "Algumas vezes ficamos tão encantados conosco mesmos - porque a nossa política era basicamente correta e coerente - que cedemos as tentações de um certo sectarismo em relação aos que pensavam e agiam diferentes de nós. As vezes nos julgávamos donos da verdade e da ética".