Valor econômico, v. 16, n. 3753, 12/05/2015. Finanças, p. C14

 

 BC só para alta de juro quando assegurar meta

 

Por Claudia Safatle | De Brasília

A disposição do Banco Central é de só concluir o aperto monetário - que começou em abril de 2013 e já elevou a taxa Selic em 6 pontos percentuais - quando estiver seguro de que a inflação caminha firme para a meta de 4,5% em dezembro de 2016 e que se consolidará nesse patamar.

Se o BC fracassar no seu objetivo, o governo avalia que o país poderá cair em um longo período de estagnação econômica.

Não é preciso esperar os resultados efetivos da inflação para se ter essa certeza, mas as expectativas terão que estar ancoradas e bem consolidadas na meta para que a autoridade monetária comece a cogitar a hipótese de reduzir a taxa de juros. Isso se refere não só ao momento adequado, mas também à intensidade da queda da Selic no futuro.

A economia brasileira está em sua pior fase neste segundo trimestre, conforme avaliação de economistas do governo: em recessão e com inflação alta. A expectativa é de que a performance seja ligeiramente melhor, mas ainda no campo negativo, no terceiro trimestre; e que apresente no quatro trimestre algum crescimento. Para o ano, a estimativa do governo é de retração de 0,5%. O relatório de inflação que será divulgado no fim de junho pode aumentar essa previsão.

Convencer os agentes econômicos de que a inflação convergirá para 4,5% em 2016 é uma das principais estratégias do governo para resgatar a confiança de empresários e consumidores que, por enquanto, só caem.

Não há como priorizar a situação recessiva da economia em detrimento do combate à inflação, por que a recessão será ainda mais profunda se a inflação subir e as empresas conseguirem repassar os aumentos de preços aos consumidores. Só a conta de luz está 40% mais cara este ano e se a política de juros não for dura, as pressões inflacionárias serão inadministráveis, podendo chegar a dois dígitos.

As autoridades da área econômica esperam que o mercado se convença de que vão fazer o que estão prometendo nos juros e nas contas públicas e que considera a chance de dar certo. É crucial reconquistar a confiança das empresas para que elas possam voltar a investir e dar início a um círculo virtuoso.

Indícios nessa direção estariam começando a surgir com o crescimento da bolsa de valores e o ingresso de US$ 13 bilhões de recursos externos no país em abril.

A pesquisa Focus do BC, divulgada ontem, registrou uma pequena mas importante queda na expectativa de inflação para o ano que vem. Por quatro semanas estacionada em 5,6%, a pesquisa apontou para inflação de 5,51% em 2016. Predomina, porém, o ceticismo em relação ao cumprimento da meta no próximo ano.

Economistas do governo avaliam e reavaliam os prováveis impactos do aumento do desemprego na inflação de serviços. Esse é um ponto central da desinflação. Como nos últimos anos o mercado de trabalho ficou pressionado, faltam informações sobre o quanto a inflação de serviços - que tem se situado entre 8% e 9% ao ano - pode ceder com a distensão que ocorre com aumento do desemprego.

Este ano é, portanto, de ajuste. No caso da inflação, não há como reduzi-la substancialmente no exercício em curso. Cabe ao BC criar, no mercado, a convicção de que o IPCA vai cair em 2016. A maneira da autoridade monetária fazer isso é ancorando as expectativas. Não é simples, mas considera-se que há mais oportunidade, agora, de fazer a convergência do que no ano passado, quando os preços administrados estavam represados. Isso inviabilizava a estratégia porque na hora que o IPCA caísse e desse uma folga, ela seria usada para corrigir os preços e tarifas administrados. Hoje, esse é um problema praticamente resolvido.

O aperto fiscal e monetário serão na dose necessária para que o IPCA chegue à meta de 4,5% em dezembro do próximo ano. Esse é um caminho sem volta.

Ao dizer e reiterar que o Banco Central tem compromisso inarredável de fazer a convergência da inflação para a meta no fim de 2016, a política monetária terá que ser mais dura do que se a meta fosse chegar a 4,5% no meio do próximo ano. Entre 2009 e 2010, por exemplo, o IPCA bateu na meta de 4,5% no meio do ano mas, por dosagem dos juros, escapou para encerrar 2010 em 5,91%.

O governo prevê que os Estados Unidos vão começar a aumentar os juros em setembro e quer chegar às vésperas desse momento de normalização das condições monetárias americana com as expectativas de inflação ancoradas na meta de 4,5% para dezembro de 2016 e com as contas fiscais bem ajustadas. Assim, e com os agentes econômicos cientes da função reação do BC, espera navegar com mais tranquilidade esse período, que tende a ser turbulento.

Nas últimas semanas começou a aparecer, na cena internacional, o risco de inflação em substituição ao temor de deflação que ainda predominava desde o ano passado. O preço do petróleo no exterior reagiu um pouco e houve um intenso movimento de venda de títulos ("sell off") que intrigou o governo brasileiro. Para a área econômica, o câmbio reagiu inteiramente a essa situação externa. "Está tudo muito fluido e o câmbio aqui é totalmente reflexo disso", explicou um graduado funcionário.

Nesse ambiente, e com a taxa Selic em alta, o BC trabalha com a presunção, colocada no comunicado de março, de rolagem integral dos "swaps". Isso, porém, vai depender das condições do mercado. Em abril houve rolagem integral; em maio o mercado entendeu e o BC não o corrigiu, que rolará 80% das operações vincendas. Só essa percepção fez o dólar voltar para a casa dos R$ 3,00.

O BC tem argumentado que as operações com "swaps" cambiais são um hedge das reservas. Tudo que a autoridade monetária perde nos swaps, ganha duas vezes e meia a mais nas reservas e vice versa.