Valor econômico, v. 16, n. 3765, 19/05/2015. Brasil, p. A2

 

Vacina contra a dengue não deve vir antes do verão de 2018, diz ministro

 

Por Assis Moreira | De Genebra

 

Regis Filho/ValorO ministro da Saúde quer ser mais incisivo nas negociações com fornecedores

O governo vai fazer negociações bem mais 'renhidas' com o setor privado nas compras públicas na área de saúde, no rastro do aperto da situação econômica, sinalizou ontem o ministro da Saúde, Arthur Chioro, em Genebra, onde participa da Assembleia Mundial da Saúde.

O ministro negou ainda dificuldades para a aprovação de vacinas contra dengue. Disse que mandou a Anvisa priorizar as avaliações sobre as vacinas apresentadas. Mas avisou: "Não teremos vacina para o verão de 2017. Talvez na melhor hipótese só no verão de 2018". E ainda assim precisará avaliar custo, proteção, tamanho da produção e prioridade de quem vai ser atendido. Para Chioro, a arma que resta é mesmo um esforço de 15 minutos semanais que cada família pode fazer em checar seu quintal contra o mosquito.

Para o ministro, a escassez de chuvas em várias regiões contribuiu com o aumento de casos de dengue, inclusive onde não havia a doença. A explicação é que muitas pessoas fizeram armazenamento inadequado. Além disso, notou que o problema no abastecimento de água eleva várias enfermidades, como diarreia, hepatite A etc.

Ele admitiu que, com a alta do desemprego, a tendência é de redução do número de pessoas com acesso a planos de saúde, o que aumenta a procura pelos serviços do Sistema Único de Saúde (SUS). "O sistema está preparado, mas sem dúvida haverá aumento da sobrecarga de um sistema que já é subfinanciado e com sérias limitações para conseguir garantir acesso com qualidade que é assegurado pela Constituição", disse Chioro.

O ministro ressalvou, no entanto, que uma parte dos usuários que ascenderam à classe C e têm planos de saúde contratados já fazem o uso combinado desses serviços com os do SUS. Ele estima que no ano passado o ressarcimento do setor privado para o SUS alcançou R$ 1,4 bilhão. Antes a cobrança era feita só para internação, e foi ampliada para procedimentos de alta complexidade, como transplante e quimioterapia.

O ministro diz não ter ideia de quantas pessoas podem perder o acesso a planos de saúde, até porque "não sabemos qual o tamanho do impacto da crise, em quanto tempo será reativada a economia", como destacou Chioro. Mas lembrou que os acordos coletivos preveem que os demitidos tenham uma cobertura do plano de saúde de pelo menos mais seis meses, na média.

A pressão no setor é exemplificada pelo ministro pela "inflação da saúde", que segundo ele ficou em "17% no mínimo" no Brasil em 2014, ou seja, mais do dobro da taxa normal. Além disso, a mudança do câmbio de R$ 2,40 por dólar no ano passado para cerca de R$ 3 atualmente aumentou as despesas com importações.

Por isso, Chioro não hesita em dizer que "o governo vai ser mais incisivo nas negociações e usar o poder nas compras públicas, que é muito forte". A palavra de ordem, que ele admite ser um chavão já muito usado, é melhorar a qualidade dos gastos. Mas diz que somente nas políticas de Parcerias de Desenvolvimento Produtivo, nos quais o governo federal escolhe um certo número de produtos médicos, a expectativa é de economia de R$ 4 bilhões neste ano. O ministério está iniciando parcerias com prefeituras no Rio de Janeiro para ampliar o poder de barganha nas compras.

Sobre o contingenciamento que o governo deve anunciar esta semana, Chioro diz que só ficará tranquilo quando o decreto for publicado no Diário Oficial, para ter ideia da dimensão do ajuste. Prefere acreditar que os cortes serão de "menor monta", porque existe a proteção de emenda constitucional 29 que determina o valor mínimo de gastos com saúde.

A proposta do ministério é de orçamento de R$ 121 bilhões para 2015, dos quais R$ 111 bilhões são destinados a ações de serviços próprios de saúde. Um corte pode vir nessa diferença, mas tampouco pode ser inteiro pelas obrigatoriedades de pagamentos no setor. Ele acha que restarão cortes em gastos não específicos, como gestão do ministério.

Chioro assegurou que o programa Mais Médicos não será afetado pelo ajuste. Pelo contrário, confirmou que serão contratados mais 4.462 médicos este ano, todos brasileiros, formados no país ou no exterior.

Em discurso na Assembleia Mundial de Saúde, o ministro destacou mudanças importantes no cenário global, como transição epidemiológica, nutricional, social e econômica "que incidem diretamente nas condições de saúde das populações", e que esse cenário "exige capacidade de resposta dos sistemas de saúde".

Ele confirmou que Brasília vai sediar a II Conferência Internacional da OMS sobre Segurança no Trânsito, em novembro. "A epidemia de acidentes com motocicletas é um problema de saúde pública", disse, notando que o Brasil está entre os cinco primeiros países atingidos, em número absoluto.