Delator diz que negociou propina de R$ 1 milhão direto com Lobão

 

Segundo Pessoa, acordo sobre Angra 3 beneficiou outros políticos do PMDB

29 jun 2015

VINICIUS SASSINE

-BRASÍLIA- O dono das construtoras UTC e Constran, Ricardo Pessoa, disse em sua delação premiada que fechou diretamente com o senador Edison Lobão (PMDB-MA) o repasse de R$ 1 milhão em propinas e que o acerto, segundo ele, incluía atender com atenção especial a pedidos de doação eleitoral feitos pela cúpula do PMDB no Senado. Lobão era ministro de Minas e Energia e, conforme Pessoa, a suposta propina milionária serviria para garantir contratos de consórcio integrado pela UTC nas obras da usina nuclear Angra 3, em Angra dos Reis (RJ).

JORGE WILLIAM/14-2-2013Na berlinda. Edison Lobão: acusado de receber propina quando ocupava o cargo de ministro de Minas e Energia

Um consórcio formado por UTC, Camargo Corrêa, Andrade Gutierrez e Odebrecht — todas investigadas na Operação Lava-Jato e suspeitas de integrarem o “clube do cartel” — executa as obras. O grupo venceu uma concorrência no fim de 2013 para obras em Angra 3, no valor de R$ 3,1 bilhões. Por ter saído vencedor, o consórcio optou por um pacote de obras que inclui edificações não nucleares, no valor de R$ 1,75 bilhão.

Com o êxito da contratação, o dono da UTC disse ter interpretado que o acordo da suposta propina a Lobão deveria estender benefícios aos caciques do PMDB no Senado. Os registros das doações no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) corroboram o que Pessoa afirmou na delação. A direção do PMDB em Alagoas, controlada pelo presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), recebeu um repasse da UTC de R$ 500 mil em agosto e outro de R$ 500 mil em setembro de 2014. O filho de Renan, Renan Filho (PMDB), foi eleito governador de Alagoas. Já a direção do PMDB de Roraima — controlado pelo senador Romero Jucá — foi financiada com três repasses de R$ 1,5 milhão ao todo, também em agosto e setembro de 2014. A direção do PMDB na Bahia ganhou R$ 300 mil da UTC, conforme os registros do TSE, e a direção nacional do partido, mais R$ 500 mil.

Ainda conforme a delação, Pessoa afirmou que repassaria às demais empreiteiras do consórcio a necessidade de ratear a suposta propina a Lobão e de dar atenção especial a doações aos demais representantes do PMDB no Senado. Pessoa enxergava em obras de usinas nucleares um filão para garantir à UTC a presença no grupo das maiores empreiteiras do país. Na delação, ele citou outros pagamentos para a participação em Angra 3: o advogado Tiago Cedraz, filho do presidente do Tribunal de Contas da União (TCU), Aroldo Cedraz, recebeu R$ 50 mil mensais para influir em processos do tribunal, mais R$ 1 milhão sobre um processo de Angra 3, conforme o empreiteiro.

O advogado de Lobão, Antonio Carlos de Almeida, diz que “delações em série perderam a confiança”. Segundo ele, depoimentos do doleiro Alberto Youssef e do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa já se contradiziam sobre um suposto repasse de R$ 1 milhão em propina.

Jucá disse ao GLOBO não saber o que Lobão e Pessoa trataram sobre doações ao PMDB:

— Em Roraima, houve doação tanto para o PT como para o PMDB. Alguém do PMDB nacional tratou do assunto, e houve doações para o partido nos estados. Conheço Pessoa, mas não tratei de doações com ele.

O GLOBO procurou a assessoria de Renan, que não deu retorno até o fechamento desta edição.

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MPF: advogada da Odebrecht foi ‘desrespeitosa’

 

Ao GLOBO, defensora de empreiteira disse que juiz da Lava-Jato viola direitos humanos

29 jun 2015

GERMANO OLIVEIRA 

-CURITIBA- Os procuradores da República que atuam na força-tarefa da Operação Lava-Jato divulgaram ontem uma nota em defesa do juiz federal Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba, para contrapor declarações da advogada da construtora Odebrecht, Dora Cavalcanti, em entrevista publicada sábado no GLOBO. Ao defender que a prisão do presidente da Odebrecht, Marcelo Odebrecht, é ilegal, ela disse que estuda denunciar o juiz federal Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba, por “violação aos direitos humanos”.

A nota do Ministério Público Federal (MPF) diz que Dora “parece desconhecer” os vários recursos e instâncias à disposição de investigados. Chama de “acusações vagas, desrespeitosas e infundadas” as declarações da advogada sobre Moro.

Os procuradores dizem ainda que, ao cogitar recorrer à Corte Internacional, Dora sugere que não só Moro, mas os delegados, procuradores, desembargadores e até ministros do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal “estão mancomunados para violar direitos humanos dos seus clientes, o que é de uma total irresponsabilidade, senão desespero”. Em outro trecho, dizem que “não se deve pretender que a Justiça seja cega para os crimes praticados por ricos e poderosos, mas sim cega na diferenciação entre ricos e pobres, pessoas com ou sem influência”.

Os procuradores rebatem, ainda, as críticas da advogada aos acordos de delação premiada, esclarecendo que são de responsabilidade do MPF e não do juiz. No sábado, o desembargador João Pedro Gebran Neto, relator da Lava-Jato no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), negou o pedido de habeas corpus feito pelos advogados de Marcelo Odebrecht, preso desde o dia 19. Na decisão, alegou que Marcelo teria plena ciência do esquema investigado na Petrobras.