O globo, n. 29901, 19/06/2015. País, p. 4

“Essa é uma solução paliativa. No futuro, o déficit subirá”

GERALDA DOCA

Para o ex- secretário da Previdência, a fórmula do governo não compensa as perdas causadas pelas mudanças no fator

A proposta do governo resolve o problema de sustentabilidade do regime de aposentadoria?

Dentro do cenário político atual, foi o que o governo pôde fazer. Essa é uma solução paliativa, enquanto não se encontra uma solução definitiva. O ideal seria enviar uma PEC ( proposta de emenda constitucional) para acabar com o fator previdenciário, porque as pessoas vão continuar se aposentando por tempo de contribuição, se sujeitando à aplicação do fator. Melhor seria aplicar a fórmula 85/ 95 progressivamente, como regra de acesso, e não como fórmula de cálculo. Outras alternativas seriam aumentar o tempo de contribuição ou fixar idade mínima.

Compensa a perda decorrente da aplicação do fator?

Não. Teria que ser uma fórmula maior e poderia ser mais espaçada, chegar a 100/ 105, em 2050. É melhor do que a proposta aprovada pelo Congresso, mas ainda tem impacto considerável sobre a Previdência. No futuro, o déficit subirá.

O escalonamento mais imediato ajudará nas contas públicas?

Em um primeiro momento, ajuda nas contas públicas porque pode fazer com que as pessoas adiem a aposentadoria, o que vai reduzir as despesas do INSS. Por outro lado, vai ter gente que vai desistir de esperar e vai se aposentar pelo fator.

A proposta é mais vantajosa para os trabalhadores em relação ao modelo atual ( fator)?

É mais vantajoso, principalmente para as mulheres. Os 90 geram um ganho imediato para as mulheres e, no longo prazo, esse ganho será ainda maior. Com o passar do tempo, o fator vai ficando mais pesado porque as pessoas que vão se aposentar daqui a 30 anos terão uma expectativa de vida maior do que as pessoas que estão se aposentando agora. Daqui a 35 anos, por exemplo, essas pessoas vão ter cinco anos a mais, e o fator capta isso.

Acha possível costurar uma proposta definitiva no fórum criado pelo governo com as centrais?

A experiência passada não foi boa. Mas, se o governo der uma grande importância ao fórum, acredito que pode funcionar, sim. Funcionou na Espanha.

As novas regras podem gerar passivos judiciais?

Sim. Mas se o Supremo Tribunal Federal ( STF) mantiver o entendimento que já teve em relação às pensões, os pedidos de revisão serão negados. Neste caso, o tribunal já decidiu que o que vale é a regra vigente no momento da requisição do benefício.

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Levy aceita abrir mão de receita para aprovar lei

SIMONE IGLESIAS

Em negociação com Câmara, governo cede e pode perder R$ 1,87 bi

Na tentativa de aprovar o projeto que aumenta os tributos da folha de pagamentos das empresas na Câmara, o ministro Joaquim Levy ( Fazenda) aceitou ontem abrir mão de R$ 1,87 bilhão de estimativa de arrecadação, cerca de 15% dos R$ 12,5 bilhões previstos para entrar nos cofres do governo com o fim da desoneração de 56 setores. A falta de flexibilidade da equipe econômica, que não queria perder qualquer receita, havia criado um impasse na negociação com os deputados.

A tendência é que seja votado na tarde de hoje um projeto que prevê aumento menor da alíquota para quatro setores: transportes, meios de comunicação, call center e produtos da cesta básica. A proposta original do governo estabelecia aumento do regime especial de tributação de 1% para 2,5%, para a indústria, e de 2% para 4,5%, para serviços. A nova proposta é de alíquotas de 1,5% e 3% para esses quatro setores.