Valor econômico, v. 16, n. 3750, 07/05/2015. Política, p. A8

 

PT busca ajuda de empresários nos Estados

 

Por Cristiane Agostine | De São Paulo

Endividados, diretórios estaduais do PT continuam a receber doações empresariais e organizam eventos com representantes do setor produtivo para arrecadar recursos, apesar de o comando nacional do partido ter proibido há vinte dias o financiamento da legenda por empresas, depois da prisão do ex-tesoureiro João Vaccari Neto. Na propaganda partidária, veiculada em cadeia nacional na televisão e no rádio na quarta-feira, o PT reforçou que já colocou em prática o veto ao recebimento de recursos empresariais.

O diretório da Bahia, no entanto, planeja fazer dois jantares com empresários neste mês, além de outros eventos, para arrecadar recursos e pagar fornecedores da campanha de Rui Costa. O petista foi eleito governador em 2014, mas sua campanha deixou dívida de R$ 13 milhões. Desse valor, foram pagos R$ 500 mil, segundo o presidente do diretório estadual, Everaldo Anunciação.

 

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O dirigente afirmou que não "não há nenhum problema ético nem legal" em buscar doações privadas. "Tenho o compromisso moral de quitar a dívida com fornecedores e estamos buscando contribuições dentro da lei", disse Anunciação. "Não podemos trazer prejuízo aos credores, que nos ajudaram nas eleições". Para Anunciação, mesmo se o PT reforçar a arrecadação de militantes e simpatizantes para pagar as contas partidárias, o valor não será suficiente para quitar a dívida. "Acredito na força da militância, mas não podemos ter hipocrisia nem ingenuidade para falar de um valor tão alto ", disse, referindo-se aos R$ 12,5 milhões que devem ser pagos. "A dívida foi contraída antes da decisão do diretório nacional do partido, de vetar doações de empresas privadas", disse.

No Ceará, o presidente do diretório estadual do PT, Francisco de Assis Diniz, fez a mesma análise. "A decisão de o PT não aceitar mais doações privadas não vale para o que foi contraído em 2014. Vamos olhar para 2016 e 2018", afirmou Diniz. O diretório estadual herdou dívida de R$ 11,1 milhões da campanha vitoriosa de Camilo Santana, primeiro petista a comandar o Ceará. "É uma regra que não é retroativa. É daqui para frente", disse. O diretório pagou R$ 5,3 milhões da dívida, segundo Diniz, mas o restante deverá ser saldado com ajuda de empresários. "Continuamos captando recursos. Temos feito feito reuniões frequentes e recebendo doações lícitas".

O presidente do diretório do Mato Grosso, William Cesar Sampaio, disse que ainda não sabe como pagar os R$ 2,6 milhões que ficaram da campanha derrotada de Lúdio Cabral, depois que o PT nacional proibiu doações privadas. "Não está definido o que vamos fazer, mas certamente os recursos do fundo partidário não serão suficientes", disse.

A situação é semelhante nos 11 diretórios que têm que pagar fornecedores da campanha ao governo do Estado de 2014. Somadas, as dívidas desses candidatos são de R$ 73,3 milhões, mas o valor pode chegar a cerca de R$ 100 milhões se forem contabilizados os restos a pagar dos comitês únicos de campanha.

Em São Paulo, por exemplo, a campanha de Alexandre Padilha deixou dívida de R$ 24,5 milhões e o comitê único de campanha - cujos recursos podem ir tanto para o candidato ao governo quanto para outros postulantes - gastou R$ 21,3 milhões a mais do que recebeu. O rombo terá de ser coberto pelo diretório paulista. É a maior dívida entre todos os candidatos petistas ao governo em 2014. Procurados, nem o presidente do diretório nem o tesoureiro quiseram se pronunciar.

A campanha de Delcídio Amaral ao governo de Mato Grosso do Sul gastou R$ 1,9 milhão a mais do que arrecadou e o comitê único ficou com dívida de R$ 999 mil.

A decisão de o PT vetar as doações empresariais foi tomada pelo Diretório Nacional em 17 de abril, dois dias depois da prisão de Vaccari, investigado na operação Lava-Jato e réu pelos crimes de lavagem de dinheiro e corrupção. O ex-tesoureiro é acusado de participar de um esquema de desvio de recursos da Petrobras para o PT. Desde então, os diretórios municipais, estaduais e o nacional foram proibidos de receber e usar recursos empresariais.

O partido discutirá o que fará com as doações em seu Congresso Nacional, em junho. Entre 2011 e 2013, o partido recebeu R$ 165,5 milhões de empresas, em especial das investigadas na Lava-Jato.

Por meio de sua assessoria, o PT nacional disse que "já não recebe mais" recursos privados e que até o congresso, "os diretórios estaduais podem continuar a receber doações empresariais" - contrariando a decisão registrada em resolução do PT. Procurado, o tesoureiro do PT, Marcio Macêdo, não quis comentar. Macêdo assina a prestação de contas de 2014, entregue ao Tribunal Superior Eleitoral em abril, mas ainda não foi divulgada.