Valor econômico, v. 16, n. 3750, 07/05/2015. Opinião, p. A10
Uma temporária revoada de capitais para o Brasil
Abril terminou com grandes ingressos de capital externo no Brasil. Ações depreciadas e juros mais altos do mundo foram alvos, em um ambiente de revisão de expectativas exageradamente pessimistas sobre o país, feitas desde pelo menos o último trimestre do ano passado. O fluxo cambial no quadrimestre foi positivo em US$ 17,87 bilhões, com entrada financeira líquida de US$ 14,5 bilhões, o maior volume desde 2011. No maior saldo em dois anos, a bolsa recebeu R$ 7,6 bilhões no mês passado. A forte atração de capitais externos, porém, não é uma tendência. Há incertezas demais no horizonte doméstico e internacional, como mostraram os mercados financeiros ontem, em um ambiente de elevação dos juros do Tesouro americano, alemão e de outros da zona do euro.
Ainda que a perspectiva de o Brasil viver sua pior recessão em mais de duas décadas não tenha mudado, vários sinais positivos foram captados pelos investidores externos. O ajuste fiscal, apesar de enfrentar dificuldades, está sendo perseguido com determinação pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, com o apoio da presidente Dilma. A Petrobras apresentou um balanço com alta revisão de perdas, com chances de encerrar um capítulo trágico de sua história. Diminuíram a probabilidade da perda de grau de investimento do país e de um racionamento de energia. Houve esforço para melhorar a coordenação política do governo, entregue ao vice-presidente Michel Temer. O clima de animosidade dos líderes da Câmara e do Senado em relação ao governo persiste, mas em tom menor em relação ao do início da legislatura. O Planalto acena com novo programa de concessões.
O preços de ativos brasileiros estavam subavaliados em relação à nova visão. A contínua elevação dos juros, com o Brasil sempre na contramão do mundo, deu um estímulo extra aos investidores em busca de altos retornos. E, depois de algum tempo observando o real se valorizar, o Banco Central indicou que deverá reduzir o porcentual de rolagem dos swaps cambiais, sinalizando que não está à vista novo ciclo de valorização da moeda, que contribuiria para a repressão da inflação. Como reduziu espaço para ganhos com os swaps, decorrentes da apreciação do real, o BC precisa defensivamente diminuir sua exposição.
O ingresso de capitais de curto prazo, mais voláteis, são necessários para cobrir o déficit no balanço de pagamentos, que deixou de ser feito com os recursos dos investimentos diretos e robustos saldos comerciais. No entanto, sua intensidade deverá arrefecer, diante dos frequentes surtos de insegurança nos mercados. A presidente do Fed, Janet Yellen, disse ontem que a valorização das ações americanas está " muito alta" e que os juros dos bônus poderão dar saltos quando o banco começar finalmente a subir os juros.
O fato é que os juros mais longos começaram a subir nos dois lados do Atlântico, por vários motivos - e isso retira um pedaço da atratividade do Brasil. O preço do petróleo subiu cerca de 50% desde janeiro, tendendo a elevar a inflação nos EUA e eliminar a ameaça deflacionária com que se debate a zona do euro, cuja perspectiva de crescimento melhorou. Para o Banco Central Europeu, a alta dos juros é uma boa e má notícia. Significa confiança no relaxamento monetário lançado em janeiro, mas também um revés, porque as compras de títulos do programa visam justamente a baixar os juros longos.
Para o Fed, uma inflação maior tornaria mais próxima a data de início da elevação dos juros, se os demais fatores em jogo se mantivessem constantes. O mau desempenho da economia americana, que cresceu apenas 0,2% no primeiro trimestre na primeira estimativa, que deve ser revista para baixo na próxima, colocou de novo em questão a solidez da retomada. Mais sinais ruins vieram com o maior déficit comercial desde 2008 e com contratações abaixo das expectativas. Como em 2014, a perda de fôlego pode ser atribuída às condições climáticas, mas não há certeza sobre isso. O que há de certo é a produtividade negativa de 2% dos EUA, com aumento de emprego, indicando que os reajustes dos salários, mesmo baixos, podem pressionar a inflação.
Diante de pressões contraditórias, tanto é possível que o Fed nada faça, como que aja antes do esperado. Na primeira hipótese o Brasil ganha mais tempo para arrumar a casa. Na segunda, haverá mais turbulências e pressões cambiais.