Princípio indiscutível

1 jun 2015

Armar a população como resposta à violência tem o efeito de incrementá- la, e não de reduzi- la

Entre 1980 e 2003, o número de homicídios por arma de fogo cresceu no país a uma taxa média de 8% ao ano. A partir de 2004, o percentual entrou numa curva decrescente, até se estabilizar, de 2012 para 2013, numa faixa de incremento, desse tipo de crime, inferior a 1% ao ano. Isso não quer dizer que a violência criminal esteja em níveis aceitáveis. Ao contrário, a relação de pouco mais de 20 assassinatos por grupo de 100 mil habitantes, vigente no Brasil, com picos regionais de até 60/ 100 mil ( Alagoas), é mais que o dobro da taxa ( 10/ 100 mil) a partir da qual a Organização Mundial de Saúde ( OMS) considera que a violência se torna endêmica.

Mas o panorama podia ser pior. Estima- se que a redução de oportunidades de homicídio decorrente de uma política de endurecimento com a circulação de armas de fogo tenha poupado 160 mil vidas entre 2004 e 2012. São dados do Mapa da Violência.

O Instituto de Política Econômica Aplicada ( Ipea) tem uma estimativa mais conservadora ( 120 mil vidas poupadas, o dobro do número de soldados americanos mortos no Vietnã), mas, ainda assim, um número impressionante. Segundo o Ipea, houve no período uma queda de 12,6% na taxa de homicídios no país.

O que estes dados têm em comum é a convergência no ano de 2003. Não é por acaso. Data daí a adoção no país do Estatuto do Desarmamento. A relação é direta entre a melhora dos indicadores de homicídios por arma de fogo e a vigência dessa lei orgânica, que se assenta num inquestionável princípio de pacificação — reduzir ao mínimo possível o número de armas em circulação, seja pelo enrijecimento das regras para o porte, seja via redução do arsenal em posse da população. No primeiro caso, o Estatuto logrou diminuir em 40%, entre 2003 e 2013, o número de pessoas que compram armamento no país, segundo o Ipea. E, no segundo caso, é nítida a importância das campanhas de entrega voluntária de armas. É inquestionável, portanto, que a guerra contra a violência passa, necessariamente, pela providência de desarmar a sociedade. É um pressuposto óbvio, mas, ainda assim, há movimentos, inclusive no Legislativo, que procuram desconstruir o Estatuto. Também jogam contra o princípio pacificador da lei propostas estapafúrdias que pregam, contra a violência dos bandidos, não o desarmamento, mas o seu contrário — ainda que não pela flexibilização em relação a revólveres e semelhantes, mas pela permissão do uso de engenhocas supostamente de defesa pessoal ( armamento não letal, sprays de pimenta etc.).

São iniciativas que, implementadas, teriam consequências deletérias. Até porque, mesmo com a redução de armas em circulação, ainda é grande o número delas fora dos limites estabelecidos pelo Estatuto. Nisso reside uma das razões de os indicadores de criminalidade, mesmo tendo sido reduzidos, ainda se manterem em patamares inaceitáveis. Ampliar o leque de artefatos liberados só agrava esse quadro.

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Nem o Exército chinês...

1 jun 2015

RICARDO BALESTRERI 

Há no mercado equipamentos como spray de pimenta e arma elétrica. Na Inglaterra funciona assim, com sucesso.

Diante do uso cada vez mais comum de facas nos crimes praticados particularmente no Rio, faz- se urgente a discussão da liberação do uso do spray de pimenta pela população, prática já adotada em vários países. E também o necessário, e fundamental, apoio das guardas municipais às polícias militares dos estados.

Pois se é humanamente impossível que haja policiamento capaz de manter a vigilância em tantos lugares ao mesmo tempo, que ao menos se dê uma alternativa ao cidadão para se proteger. Haverá quem diga que os bandidos passarão a usar spray para assaltar. Devolvo o argumento com uma pergunta: entre ser assaltado com um spray de pimenta ou uma faca, qual seria a sua opção?

Paralelamente a essa providência, outras medidas devem ser tomadas, claro, mas aqui não tratarei das óbvias questões sociais. Atenho- me tão somente à questão da segurança. E, nesse sentido, entro no meu segundo ponto: a urgente necessidade de as guardas municipais se integrarem ao trabalho das PMs no patrulhamento das áreas de lazer.

Para se ter uma ideia da grave violência que ora atemoriza o Rio de Janeiro, números do Instituto de Segurança Pública ( ISP) mostram que apenas no ano passado 225 pessoas morreram no estado vítimas de crimes praticados com armas brancas. Foram 2.183 os casos de mortes ou ferimentos causados por facas, estiletes ou canivetes. E a legislação é leniente nesse sentido: permite que qualquer cidadão ande nas ruas com essas armas.

Portanto, a parceria da Guarda Municipal com as forças de segurança do estado é fundamental para a garantia da lei e da ordem e para melhorar a sensação de segurança da população do Rio. Seu potencial ofensivo deve ser menor, claro, mas não inexistente. A GM precisa estar autorizada a portar armas, mas não armas de fogo. Há uma infinidade de equipamentos no mercado, do spray de pimenta à arma elétrica. Na Inglaterra funciona assim há anos, com sucesso.

Lei autorizando a Guarda Municipal do Rio a usar armas não letais dormita há tempos na Câmara de Vereadores. E não são poucos os casos de guardas agredidos por cidadãos cada vez mais estressados nas ruas, como ocorreu recentemente quando um grupo de guardas municipais cariocas tentava retirar barracas irregulares numa feira e foi brutalmente agredido. A atuação da PM seria mais adequada ( e prioritária) no policiamento ostensivo, patrulhamento de ruas, nas manifestações em que se esteja colocando em risco o patrimônio público e privado, e nas UPPs. Sem a ajuda da guarda e sem que o cidadão tenha um meio de se defender de ataques de armas brancas, nem mesmo o Exército chinês dará conta de proteger toda a população do Rio de Janeiro.