Valor econômico, v. 16, n. 3768, 02/06/2015. Brasil, p. A5

 

Maioridade opõe Dilma a Cunha

 

Por Thiago Resende e Andrea Jubé | De Brasília

 

Pedro Ladeira/FolhapressCunha: presidente da Câmara defende referendo para que a população opine

O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e a presidente Dilma Rousseff entraram em rota de colisão por causa da proposta de redução da maioridade penal de 18 para 16 anos. Contrário à medida, o governo anunciou ontem a criação de um grupo interministerial para discutir alternativas - um dia depois de Cunha declarar que o texto será votado pelos deputados ainda em junho. A reação do Palácio do Planalto, segundo ele, não "esvazia" a intenção de colocar o projeto em análise.

Empenhada em se reaproximar da esquerda, Dilma assumiu publicamente posição contrária à redução da maioridade penal. Na sexta-feira, em ato político do PCdoB em São Paulo, a presidente voltou a criticar a proposta de redução da maioridade penal, que atribuiu a um "conservadorismo muito perigoso" na sociedade brasileira.

Dois dias depois, o presidente da Câmara, usando seu perfil na rede social Twitter, escreveu que colocará a proposta (PEC 171/93) em votação pelo plenário apesar da resistência o PT, que "não quer a redução da maioridade e acha que todos têm que concordar com eles". Ontem, ele reforçou a posição, justificando que esse é assunto da sociedade, e não de governo.

Diante da repercussão, ontem, o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), pediu calma e cuidado em relação a esse texto, pois "violência não se resolve com pressa". O ministro da Secretaria de Comunicação Social, Edinho Silva, anunciou a criação de um grupo com Casa Civil e Ministério da Justiça para sugerir penas maiores aos adultos que cooptam menores para o crime. Além disso, o governo quer aprimorar as políticas de inclusão social, educação complementar para diminuir a criminalidade entre os jovens.

Essa iniciativa não impedirá que a Câmara vote a proposta, avisou Cunha. "Se for essa a intenção, de repente, pode ser um tiro na água", disse. Para ele, esse grupo deveria ter sido criado há 22 anos, quando foi apresentada a proposta de redução da maioridade penal de 18 para 16 anos. "Não é culpa desse governo. É de todos os governos. [...] Os deputados serão soberanos para decidir sim ou não", ressaltou.

Em um ponto, Dilma e Cunha concordam. Eles não acreditam que jovens com idade inferior a 18 anos deixarão de cometer crimes mesmo se a medida for aprovada. "Então, penalize-se o adulto, a violência não será resolvida internando o menor em prisões tradicionais", discursou a presidente na semana passada. "Não vai acabar a delinquência de menor de idade", avaliou o pemedebista.

Cunha, no entanto, diz que essa é uma questão de isonomia de direitos e obrigações, já que jovens de 16 anos podem votar. "Se alguém está elegendo o presidente da República, ele está fazendo o ato mais responsável que pode fazer. Ele elege presidente, governadores, prefeitos, o Congresso, se ele pode isso tudo ele também tem que ser responsabilizado pelos seus atos", alegou.

Apesar de discordar da posição do presidente da Câmara, o Palácio do Planalto compreende que a discussão do corte da idade penal é um "direito" de Cunha. "Cabe a ele criar a agenda de debates legislativos, mas todos sabem que o governo da presidente Dilma tem uma outra posição", disse Silva, que foi escalado para falar com jornalistas após a reunião de coordenação política do governo. Por ser uma alteração constitucional, a proposta de reduzir a maioridade penal precisa passar por dois turnos na Câmara e no Senado.

O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), classificou a ideia como polêmica, mas preferiu não se posicionar. "É importante aguardar a manifestação da Câmara. Essa matéria vai tramitar no Senado, mas é polêmica, conflita e é muito bom que antes de qualquer coisa nós possamos conversar sobre isso."

Também ontem, Cunha voltou a defender um referendo para que a população opine sobre o assunto. "É um tema que se assemelha muito àquela situação do desarmamento. A gente pode aproveitar. Já vai ter eleição ano que vem. Pode começar a criar esse hábito de alguns referendos serem feitos junto com as eleições", disse.