Por José de Castro e Silvia Rosa | De São Paulo
O real ainda é visto como uma das moedas mais frágeis a eventos de aversão a risco pelos analistas, em especial ao esperado aumento de juros nos EUA - isso mesmo com o ajuste fiscal em curso e a desvalorização de mais de 16% da moeda brasileira neste ano.
Apesar do movimento recente de queda do real estar em linha com as moedas emergentes, analistas destacam que o Brasil segue com quadro macroeconômico frágil, com elevado déficit em conta corrente, baixo crescimento econômico e inflação pressionada.
Os ajustes nas políticas fiscal e monetária, com o Banco Central buscando retomar a credibilidade e perseguindo o centro da meta de inflação, ajudaram a afastar o que é conhecido como "risco de cauda" - ou um evento muito negativo no mercado, como a perda do grau de investimento do país. No entanto, ainda restam dúvidas sobre a capacidade do governo de implementar as medidas de ajuste fiscal necessárias, o que coloca o real em uma posição mais vulnerável que seus pares.
"O que foi feito em termos de ajuste das políticas fiscal e monetária certamente ajuda e, se não fosse isso, a situação estaria pior", diz o economista-chefe para a América Latina do ING, Gustavo Rangel. Ele afirma que a intenção de mudança de política econômica do governo é clara, mas o fato é que isso depende do Congresso Nacional e o governo atual está fraco politicamente.
A forte dependência dos termos de troca do país ao desempenho das commodities é outro fator de vulnerabilidade. As divisas atreladas a esses ativos têm sofrido recentemente diante de temores com uma desaceleração mais forte da economia chinesa.
Nesse cenário, o economista do ING ainda vê espaço para o real se desvalorizar, uma vez que a moeda ainda está longe de seu nível de equilíbrio, que segundo ele estaria entre R$ 3,30 e R$ 3,40.
O ajuste no câmbio é importante para reduzir o déficit em conta corrente e melhorar a competitividade das exportações brasileiras. O setor externo, afirma Rangel, teve contribuição positiva para o PIB no primeiro trimestre. As exportações avançaram 5,7% no período, enquanto as importações cresceram 1,2%, após ajustes sazonais.
O BC tem aproveitado a perspectiva de fluxo positivo para reduzir o estoque de US$ 112,78 bilhões em swaps cambiais. Após deixar vencer US$ 1,96 bilhão nesses contratos em maio, o BC sinalizou a renovação parcial do lote de US$ 8,742 bilhões que vence em julho, mantendo o volume de rolagem do mês anterior.
Isso já era de certa forma esperado pelo mercado. Por isso, não fez muita pressão no dólar ontem, que fechou em queda de 0,40%, a R$ 3,1717, diante de notícias da retomada de captações externas.
Para o economista para Brasil do Barclays, Bruno Rovai, o governo está buscando restabelecer o tripé macroeconômico, o que passa pelo câmbio flutuante. "O Brasil está passando por forte recessão e a pressão para o câmbio se desvalorizar é maior porque ele deve ser a válvula de escape nesse ajuste."
Rovai vê a política fiscal como o principal risco para o país, destacando que ainda há medidas importantes a serem aprovadas pelo Congresso, como a que prevê a redução da desoneração da folha de pagamentos. "Se o governo não conseguir aprovar as medidas, vai ter de compensar isso com aumento de imposto, o que pode comprometer mais o crescimento."
O estrategista de câmbio para mercados emergentes do banco Brown Brothers Harriman, Ilan Solot, ainda vê espaço para mais depreciação do real devido a riscos econômicos e políticos. Solot diz que a volatilidade alta tem minimizado os benefícios dos juros mais altos do Brasil para a moeda, esvaziando o apetite por operações de "carry trade", que buscam ganhar com a arbitragem de juros.
Ontem, as taxas dos contratos de Depósito Interfinanceiro (DI) subiram na BM&F, em meio à visão de que o BC deve continuar com seu tom mais duro na condução da política monetária, devido à resistência das expectativas de inflação. O DI para janeiro de 2016 subiu de 13,85% para 13,91%, enquanto o DI para janeiro de 2017 avançou de 13,32% para 13,42%.