As políticas de desenvolvimento regional, adotadas no Brasil há décadas para reduzir a desigualdade econômica, consomem 1,1% do Produto Interno Bruto (PIB) por ano em média, o equivalente, em 2013, a R$ 53,8 bilhões. Contudo, não se mostram capazes de elevar o PIB per capita das regiões mais beneficiadas, que permanece estável desde 1985, em torno de 63% da média nacional no Norte e de 48% no Nordeste. Para especialistas, como os investimentos não direcionados continuam concentrados no Sul e no Sudeste, sem as políticas regionais o quadro poderia ter se agravado nas regiões mais pobres. Os analistas também apontam que a falta de fiscalização e de acompanhamento dos resultados impede uma avaliação real da eficácia das iniciativas e ainda contribui para que parte dos recursos se perca na corrupção ou no uso indevido do dinheiro público.
O estudo Políticas de desenvolvimento regional no Brasil: uma estimativa de custos, do consultor legislativo do Senado cedido ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (Mdic) Luiz Ricardo Cavalcante, apurou que os gastos anuais resultaram da soma de incentivos fiscais de R$ 31,7 bilhões, de estímulos financeiros de R$ 14,2 bilhões e de investimentos diretos do governo federal de R$ 8 bilhões. “Mais de 55% desses gastos são destinados à Região Norte, especialmente em decorrência das isenções fiscais concedidas às empresas instaladas na Zona Franca de Manaus. Foram quase R$ 23 bilhões em 2013, 40% do total”, explica.
O pesquisador observa que, apesar de o trabalho não ter o objetivo de avaliar a eficácia das políticas implementadas, a pesquisa aponta que a evolução do PIB per capita das regiões mais pobres, e também as mais beneficiadas, não aumentou em relação ao PIB per capita nacional. No caso do Centro-Oeste, entretanto, a pesquisa mostra uma evolução bastante evidente: passou de 80% da média nacional para 126%. Porém, o autor do estudo atribui a mudança no cenário à expansão do agronegócio. “Isso também não quer dizer que a pobreza diminuiu no Centro-Oeste. Os fazendeiros da região enriqueceram bastante. Como o PIB per capita simplesmente divide a riqueza pela população, mascara a distribuição de renda”, alerta o doutor em desenvolvimento econômico pela Universidade do Paraná Luciano D’Agostini, do Conselho Federal de Economia (Cofecon).
Concentração
Na avaliação do coordenador de Estudos Regionais do Instituto de Pesquisa Econômica Avançada (Ipea), Guilherme Mendes Resende, existem duas forças no desenvolvimento econômico do país. “Além das políticas regionais, há uma gama muito maior de investimentos e programas que abrangem o território nacional, mas que tendem a concentrar ainda mais a riqueza nas regiões Sul e Sudeste. Uma força anula a outra. Por isso, os dados do Norte e do Nordeste parecem não reagir”, explica.
A maior parte dos incentivos das políticas regionais, quase 60%, são fiscais, com a renúncia de impostos. Os investimentos financeiros, que respondem por 26% do total, são recursos de fundos constitucionais. Diz a Constituição Federal: “Para efeitos administrativos, a União poderá articular sua ação em um mesmo complexo geoeconômico e social, visando a seu desenvolvimento e à redução das desigualdades regionais”. Os Fundos Constitucionais de Financiamento do Norte (FNO), do Nordeste (FNE) e do Centro-Oeste (FCO) são rubricas da política regional. Os recursos são provenientes de 3% da arrecadação federal do Imposto de Renda (IR) e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Entre 2004 e 2010, os três fundos tiveram cerca de R$ 83,2 bilhões em operações contratadas.
Ferramentas
Além dos fundos, os cálculos do estudo ainda incluem as renúncias fiscais de tributos federais concedidas no âmbito das superintendências regionais de desenvolvimento: Sudene, do Nordeste; Sudam, da Amazônia; e Suframa, da Zona Franca de Manaus. Cavalcante assinala que não se pode dizer que a política de desenvolvimento regional no Brasil não conta com recursos suficientes. “Mais de 1% do PIB por ano não é pouco. Mas ainda faltam ferramentas para apurar resultados. As avaliações são feitas pelos próprios órgãos. Deveriam ser padronizadas, com critérios capazes de aferir a agregação de valor daqueles investimentos incentivados para a região”, defende o consultor legislativo, autor da pesquisa.
O professor de economia da Universidade de Brasília (UnB) Newton Ferreira da Silva Marques compartilha da ideia de que o governo precisa estabelecer metas e cobrar resultados. “Sou a favor do intervencionismo porque, se deixássemos para a força de mercado as regiões pobres, não se desenvolveriam. Mas os incentivos devem ser apenas um empurrão inicial, com exigência de retorno, fiscalização, cobrança. Isso não existe. Como estão, são alvo fácil de corrupção, desvio de dinheiro e uso indevido dos recursos”, critica. “A Suframa, por exemplo, virou um passeio das montadoras”, emenda.
A equipe técnica da Secretaria de Fundos Regionais e Incentivos Fiscais do Ministério da Integração Nacional analisou o estudo de Cavalcante e observou que o documento abrange um conjunto maior de incentivos e investimentos do governo federal, e não somente os instrumentos de financiamento da Política Nacional de Desenvolvimento Regional (PNDR), em que a formulação e a condução ocorrem no âmbito do ministério. “Por se tratar de uma estimativa de custos, não se pode atribuir à pesquisa um caráter conclusivo. A participação dos fundos regionais e dos incentivos fiscais conduzidos pelo ministério assume um papel preponderante no desenvolvimento regional, conforme avaliações realizadas pela pasta”, afirma, em nota.