Levy, de Judas a Cristo
9 jun 2015
SÉRGIO ROXO, TATIANA FARAH, CATARINA ALENCASTRO, WASHINGTON LUIZ
“Não se pode fazer isso, criar um Judas ( referindo- se a Levy). Isso é mais fácil. É bem típico e uma forma errada de resolver o problema” Dilma Rousseff
Presidente da República “Ele ( Levy) tem que ser tratado como um Cristo, que sofreu muito, foi crucificado, mas teve uma vitória extraordinária” Michel Temer
Vice- presidente da República
- SÃO PAULO E BRASÍLIA- A presidente Dilma Rousseff disse que o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, não pode ser visto como um “Judas” por causa do ajuste econômico. O vice- presidente, Michel Temer, afirmou em seguida que Levy está mais para um “Cristo, que sofreu muito e obteve uma vitória extraordinária”. A cúpula do PT entendeu o recado do Palácio do Planalto, mas ainda trabalha para que o ministro não seja o alvo de “malhação” do congresso nacional da legenda, que começa quintafeira em Salvador.
O presidente nacional do PT, Rui Falcão, saiu a campo para evitar que as críticas do congresso petista a Levy, previstas na maioria dos documentos das tendências internas do partido, sejam o tema principal do encontro, que reunirá 800 delegados da legenda até sábado. Ele quer pôr em pauta temas que contemplem a esquerda, como a taxação de grandes fortunas e a volta da CPMF para custear a Saúde. Para ele, “é tempo de parar de falar em ajuste”.
O ex- presidente Luiz Inácio Lula da Silva também está conversando com os dirigentes para amenizar os ataques do PT ao governo. Ministros, como Ricardo Berzoini ( Comunicações), ex- presidente do partido, têm tentado conter as alas mais insatisfeitas.
Em entrevista ao “Estado de S. Paulo”, Dilma considerou “injustas” as críticas do PT a seu ministro:
— Não se pode fazer isso, criar um Judas. Isso é mais fácil. É bem típico e uma forma errada de resolver o problema— condenou a presidente.
Dilma também defendeu as medidas de ajuste ao jornal belga “Le Soir”:
— O ajuste é essencial, não é algo que podemos ou não fazer: não há outra solução a ser feita e, para isso, é preciso coragem. Isso permitirá em seguida que retomemos nosso programa de crescimento.
Ontem à tarde, Temer reforçou a defesa do ministro:
— Ele tem que ser tratado como um Cristo, que sofreu muito, foi crucificado, mas teve uma vitória extraordinária na medida em que deixou um exemplo magnífico, extraordinário para todo mundo. Penso que o ajuste fiscal que o Levy está levando adiante vai representar exatamente isso. No primeiro momento, parece uma coisa difícil, complicado, mas que vai dar os melhores resultados. Acho que muito menos Judas, muito mais Cristo — disse Temer.
PROPOSTA DE TAXAR “ANDAR DE CIMA”
Os dirigentes petistas desencadearam uma “operação abafa” para que Levy seja poupado no congresso do partido. O secretário de Comunicação do PT, o deputado estadual José Américo Dias ( SP), procurou demonstrar otimismo e e avaliou que os ataques a Levy terão apoio restrito entre os delegados:
— Essa coisa do Levy não diz respeito à maioria dos delegados. Até porque o Levy está cumprindo a orientação da presidente Dilma — afirmou Américo, um dos líderes da corrente Novo Rumo, mesma do presidente do PT, Rui Falcão.
Na mesma linha de Falcão, Américo disse que, no encontro, o tom será de cobrança para que o governo passe a taxar a parcela mais rica da população.
— Dilma está dialogando com o mercado, mas e o restante do povo? Vai ter cobrança no sentido de que ela precisa fazer muito pelo andar de baixo. Por exemplo, criando imposto sobre grandes fortunas. Se não mexer no andar de cima, daqui a um ou dois anos, terá problema ( com as contas públicas) de novo.
DIRIGENTE COBRA MODERAÇÃO
Outro que saiu em defesa das boas relações com o governo foi Francisco Rocha, o Rochinha, coordenador da CNB, corrente majoritária e que divide o comando do partido com a Novo Rumo. Em carta aos delegados do congresso, divulgada pela internet, ele cobrou das correntes petistas moderação nas críticas à política econômica.
“Nenhuma tendência interna do PT pode se arvorar em criticar exageradamente o ajuste fiscal porque todos nós, com raras exceções, estamos presentes no partido e no governo”, disse o petista, que tem discutido o tema com os delegados da CNB.
Rochinha alertou os dirigentes de que o futuro político do partido pode ser posto em risco com as críticas internas. “Então, todos nós temos telhado de vidro, e não cabe a ninguém atirar a primeira pedra. O momento é delicado e a fúria dos adversários tem o claro objetivo de aniquilar com o PT e com o governo. Na minha opinião, o que está em jogo tem um alvo: o ex- presidente Lula e as eleições de 2018.”
O recado do petista não é endereçado apenas a seu grupo: atinge a segunda maior força da legenda, a Mensagem ao Partido, que abriga ainda a Democracia Socialista ( DS). A Mensagem e a DS têm sido bastante críticas a Levy, mas compõem a alta cúpula do governo, com nomes como os dos ministros Miguel Rossetto ( Secretaria Geral da Presidência) e José Eduardo Martins Cardozo ( Justiça).
Apesar dos apelos, o clima no congresso deve ser tenso. Semana passada, dirigentes da CUT, braço sindical do PT, elaboraram uma carta que será levada ao encontro do partido com ataques duros aos caminhos adotados pelo governo Dilma no início do segundo mandato.
“Consideramos que a política de ajuste fiscal regressivo e recessivo inaugurada com a nomeação de Joaquim Levy para o Ministério da Fazenda coloca o PT contra a classe trabalhadora e as camadas populares que sempre foram sua principal base”, diz trecho do texto, encabeçado pelo presidente da central, Vagner Freitas, integrante da CNB.
CHAPA MAJORITÁRIA REVÊ DOCUMENTO
A própria tese inicial da chapa majoritária, a Partido que Muda o Brasil, que engloba CNB e Novo Rumo, atacava a condução da economia pelo governo federal. “É problema que a sociedade não tenha sido consultada sobre as medidas — apenas informada a posteriori — e que o peso do ajuste proposto tenha recaído mais sobre os trabalhadores do que sobre outros setores das classes dominantes”, diz o documento, que estava sob revisão e deverá chegar a uma nova versão até a manhã de hoje.
A expectativa é que o texto revisado adote um tom mais contido. Ontem, os dirigentes se reuniram para finalizar o documento da PMB. Foi decidido que haverá o documento da chapa e um outro, assinado pelo Novo Rumo, grupo de Falcão e José Américo Dias. As outras tendências também têm o mesmo prazo para apresentar suas revisões.
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O congresso do PT debaterá, a partir de quinta- feira, a posição que o partido tomará em relação às medidas do governo Dilma, como as do ajuste fiscal. As propostas são defendidas em teses apresentadas pelas chapas.
João Paulo Cunha dá bolo em sua festa de aniversário
MARIANA SANCHES
O bolo de morango com os dizeres “Feliz aniversário companheiro João Paulo Cunha” teve de ser cortado sem a presença do aniversariante. O ex- presidente da Câmara dos Deputados, que cumpre pena pelo mensalão, desistiu na última hora de ir à festa organizada por diversos sindicalistas na sede do Sindicato dos Trabalhadores de Comércio de Minérios e Derivados de Petróleo, em Osasco, na Região Metropolitana de São Paulo, ontem de manhã.
Cerca de 50 pessoas foram ao evento. Uma das convidadas chegou à festa num carro da prefeitura de Osasco.
— A gente avaliou que era melhor ele não vir porque, como tem vários sindicalistas aqui, podem confundir um ato de amizade com um ato político. Ele não pode se expor desse jeito agora — afirmou João Batista Alves da Silva, do Sindicato do Transporte de Carga, que afirmou ter tirado dinheiro do bolso para comprar bolo, salgados e docinhos.
Entre as bebidas, nada alcoólico, só refrigerante e suco.
A decisão aconteceu depois da repercussão negativa da visita de João Paulo Cunha aos militantes do PT de Osasco, na qual Cunha discursou, sextafeira passada. Como teve os direitos políticos cassados e cumpre pena em regime aberto, atividades políticas podem ser um problema para o ex- deputado.
— Mas ele não disse nada sobre política, não, ele falou só das dificuldades da prisão, de brigas que ele assistiu na cadeia e da má qualidade da “xepa” — afirmou Valdir Fernandes, da CUT de Osasco, que negou que João Paulo tenha falado sobre o PT no encontro com os militantes.
Às 9h de ontem, dois seguranças já estavam diante da portaria do evento. Só entrava quem fosse reconhecido pelos sindicalistas, para tentar evitar que a imprensa se infiltrasse na festa.
— Opa, você tem cara de tucano, não vai entrar, não — dizia o sindicalista porteiro a um convidado em tom de chacota.
Frustrados com a ausência do companheiro, que, segundo eles, foi orientado pelo advogado a não aparecer mais em público, os convidados rapidamente comeram todos os quitutes. João Paulo, que havia recebido uma autorização para viajar a Osasco, retornou a Brasília ontem.