Propina da Odebrecht no Panamá

23/06/2015

EDUARDO MILITãO

Um advogado apontado como primo do presidente do Panamá é o elo que a Polícia Federal usa para ligar a Construtora Norberto Odebrecht (CNO) à empreiteira Del Sur, usada para fazer pagamentos de propina no exterior a partir de esquema de desvio de dinheiro da Petrobras. Em comunicado publicado nos principais jornais brasileiros ontem, a empresa brasileira, cujo presidente, Marcelo Odebrecht, foi preso na 14ª fase da OperaçãoLava-Jato, na sexta-feira, nega ter relações com a Del Sur. No país latino, a CNO executa obras do metrô e pagou uma viagem do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao Panamá.
Para delegados e agentes da PF, há pistas que mostram os vínculos entre a maior construtora do Brasil e a empresa usada para pagar propinas para os ex-diretores da Petrobras Paulo Roberto Costa e Renato Duque, além do ex-gerente da estatal e ex-diretor da Sete Brasil Pedro José Barusco. A PF listou comprovantes de pagamentos para contas ligadas ao trio. Barusco disse que a Odebrecht lhe transferiu US$ 916 mil de maio a setembro de 2009, por meio da Del Sur. Os documentos mostram transferências da Del Sur para a Pexo Corporation, empresa controlada pelo ex-dirigente da Petrobras. Barusco confessou ser destinatário de propinas de empreiteiras e de estaleiros que fecharam negócios com a estatal e com a Sete Brasil, empresa de capital privado e público que constrói navios-sondas para a exploração de petróleo na camanda pré-sal.

Segundo o Relatório n° 154 da Polícia Federal, a Del Sur foi criada em 2006, na Cidade do Panamá, e encerrada em 25 de agosto do ano passado, meses após a deflagração da Lava-Jato. Em 2009, a composição da diretoria e do agente que administra a construtora foi modificada para incluir o advogado Francisco Martinelli Patton. Para a PF, ele é primo do então presidente do Panamá, Ricardo Martinelli (2009-2013). O escritório de Francisco — Patton, Moreno e Asvat — foi contratado pela Odebrecht Óleo e Gás para emitir US$ 1,7 bilhão em títulos em favor da empreiteira.
No Panamá, a Odebrecht possui 55% do consórcio Linea Uno, que executa obra do metrô da capital panamenha, empreendimento de US$ 1,4 bilhão. Uma empresa ligada à Patton, a Sarda, assinou um contrato de consultoria de US$ 2,3 milhões com o consórcio. A PF suspeita de que pessoas ligadas ao então presidente panamenho, Ricardo Martinelli, foram beneficiadas nesses negócios.
“O consórcio Linea Uno subcontratou várias empresas, entre elas a Sofratesa — que seria vinculada ao consórcio GDE, cujos acionistas, em sua maioria dominicanos, manteriam relação pessoal com autoridades do governo panamenho, incluindo o ex-presidente Ricardo Martinelli”, diz o agente da PF Luiz Carlos Milhomem.

“Prova significativa”

Segundo o juiz da 13ª Vara Federal de Curitiba, Sério Moro, os depoimentos, os depósitos e as informações recolhidas pelos policiais mostram a relação da Odebrecht com a Del Sur. “Em depoimentos prestados em separado e em momentos distintos, três criminosos colaboradores — Paulo Roberto Costa, Pedro Barusco e Alberto Youssef — relacionaram esses depósitos da Constructora Internacional Del Sur à Odebrecht”, afirmou o juiz. “Trata-se de prova significativa de que a Odebrecht é, de fato, responsável por esses depósitos e pela movimentação das contas da Constructora Internacional Del Sur.” Moro classificou de “informações relevantes” as pesquisas feitas pela PF para ligar a Odebrecht ao escritório Patton.
A reportagem procurou Ricardo Martinelli, mas não o localizou. Uma secretária do escritório Patton disse ao Correio que Francisco Patton não trabalha mais no local, apesar de o nome dele continuar na empresa.

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Cacique petista no caribe

EDUARDO MILITãO

Os negócios da Odebrecht no Panamá envolveram uma viagem do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Em novembro de 2010, a empreiteira brasileira venceu a disputa para construir a linha 1 do metrô da capital panamenha. O preço proposto pelo Consórcio Línea Uno, liderado pela Odebrecht, era de US$ 1,44 bilhão. A previsão era terminar a obra em três anos e dois meses. Sete meses depois de um anúncio oficial, em 20 de maio de 2011, Lula visitou o país em viagem paga pela construtora.Por meio de nota, a empresa disse que “sempre tornou pública a contratação de palestras de ex-presidentes brasileiros e estrangeiros, que têm o objetivo de apresentar as potencialidades do Brasil e das empresas brasileiras para empresários, investidores, líderes políticos e formadores de opinião no exterior”.Já a assessoria do Instituto Lula negou ao Correio que o expresidente tenha feito lobby, apenas palestras. Na ocasião, ele visitou o então presidente do Panamá, Ricardo Martinelli. Eles jantaram na casa de um diretor da Odebrecht. Segundo a assessoria do petista, Lula não tratou de nada relacionado ao metrô, à empreiteira brasileira ou à Constructora Internacional Del Sur, acusada pela Polícia Federal de ter sido usada pela Odebrecht para distribuir propina no exterior. “A viagem não tem relação com isso. O ex-presidente repudia essas ilações e insinuações.”A Odebrecht negou ainda as ligações com a Del Sur. “A Odebrecht reitera que nenhuma de suas empresas possui, nem nunca possuiu, qualquer vínculo nem efetuou qualquer pagamento à referida empresa”, afirmou a empresa, em comunicado publicado nos principais jornais do país ontem.Segundo a empresa, a prisão de seus executivos, incluindo o presidente, Marcelo Bahia Odebrecht, foi ilegal. “A decisão que decretou as prisões de nossos executivos e deferiu as buscas e apreensões evidencia que, passado mais de um ano do início da Lava-Jato, a Polícia Federal não apresentou, como alegado na decisão judicial, qualquer fato novo que justificasse as medidas de força cumpridas, totalmente desnecessárias e, por isso mesmo, ilegais.”A empreiteira reforçou retificação feita pelo juiz da 13ª Vara Federal, Sérgio Moro, sobre documento apresentado pelo delator Pedro Barusco, ex-gerente da Petrobras. O magistrado destacou que não se trata de um depósito da Odebrecht, mas de uma compra, feita por Barusco, de títulos da Odebrecht no valor de US$ 300 mil.Segundo a Odebrecht, é erro de interpretação a suspeita de sobrepreço em naviossondas feita a partir de mensagem de e-mail enviada ao presidente da construtora, Marcelo Odebrecht. Nela, um dirigente da empresa fala em “sobrepreço de 20 a 25 mil dólares ou reais” na construção das embarcações para a Petrobras. Para a empreiteira, trata-se de taxa de lucro sobre os custos de operação. “O termo ‘sobrepreço’ (...) representa, apenas, a remuneração contratual da Odebrecht Óleo e Gás, como operadora de sondas.