Bate e rebate sobre o "golpe"

10/07/2015

Paulo de Tarso Lyra

Pelo quarto dia consecutivo, a presidente Dilma Rousseff e o presidente do PSDB, senador Aécio Neves (MG), protagonizaram um bate-boca político e público. Até o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva aderiu ao confronto. Da Rússia, Dilma criticou o tucano, que a acusara de querer passar por cima das instituições, numa alusão ao julgamento dos gastos do governo que será feito no Tribunal de Contas da União (TCU). “Quem coloca como já tendo havido uma decisão provoca um desserviço para o TCU e para o TSE, porque não há nenhuma garantia que qualquer senador de República, muito menos o senador Aécio Neves, possa prejulgar quem quer que seja ou definir o que uma instituição vai fazer ou não”, disse a presidente.Dilma foi ainda mais incisiva, recorrendo ao debate sobre golpe, tão em voga nos embates atuais entre governo e oposição. “A gente não fica discutindo quem é ou quem não é golpista.

Quem é golpista mostra na prática as tentativas, que começam por isso: prejulgar uma instituição”, atacou a presidente.No Senado, Aécio resolveu dar o troco. O senador desafiou a presidente a demonstrar quando ele teve alguma atitude golpista ao defender as investigações do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e do TCU que podem, em caso de condenação, retirá-la do cargo. “Desafio a presidente da República a demonstrar em que instante, eu, como presidente do PSDB, dei qualquer declaração de desrespeito à Constituição e à soberania das instituições”, cobrou Aécio.Para o tucano, a petista cria um factoide de algo que não é real. “É absolutamente inacreditável a desconexão da presidente Dilma com a realidade”, afirmou ele. “Não permitiremos é que instituições de Estado sejam constrangidas por ação do governo”, reforçou ele, lembrando que o PSDB jamais adiantou o resultado do julgamento do TCU.

Ele disse que o governo terá a oportunidade de se defender tanto no TSE quanto no TCU, mas ressaltou que ninguém, nem a presidente da República, está acima das instituições.“Dilma deveria falar que errou, fracassou e falhou na condução de uma série de questões, como o controle da inflação e do desemprego.

Isso não é obra da oposição, a oposição não é golpista”, rebateu. “Quero repelir, de forma mais veemente, as insinuações da presidente da República.” E aconselhou: “Economize as suas energias com a oposição. Concentre suas forças e energias para se defender sobre as inúmeras denúncias que recaem sobre Vossa Excelência e seu partido”, sugeriu.ParecerNa última terça-feira, logo após entrevista de Dilma à Folha de S.Paulo, Aécio disse que a presidente queria passar por cima das instituições ao afirmar que as chamadas “pedaladas fiscais” em julgamento no TCU aconteceram sempre, nos governos anteriores. “Em momento algum da minha entrevista eu passei por cima das instituições. Nem o TCU ainda deu um parecer definitivo sobre minhas contas. Eles abriram a oportunidade de nos explicarmos, e vamos explicar bem explicado e a mesma coisa ao TSE (que analisará as denúncias de financiamento ilegal na campanha de 2014)”, declarou a presidente.

O ex-presidente Lula também resolveu entrar na disputa. “O tempo do golpismo passou para nunca mais”, declarou o petista, lembrando que o país vive o período de maior solidez democrática desde a Proclamação da República. “O acúmulo das lutas do povo brasileiro forjou as bases de um país mais rico, menos desigual e consciente de seu potencial. Por isso, não há espaço para retrocesso”, concluiu o expresidente.

A postura mais incisiva de Dilma tem dividido opiniões. “Deveríamos parar de bater boca com a oposição, isso só dá holofotes para eles. Deixa o Lula falar o que ele quiser. A presidente já deu o seu recado na entrevista e deveria aproveitar para virar a página dessa história”, disse um interlocutor governista.

Para os petistas, contudo, a opinião é outra. “Precisamos pregar na oposição o carimbo de golpistas. Os empresários vão perceber que esse debate só conturba ainda mais os mercados e vão cobrar o fim desta disputa”, defendeu um líder petista. Outro deputado filiado ao PT classificou as palavras da presidente como uma convocação ao PT e aos movimentos sociais. “Nós estamos satisfeitos com esse governo? Não. Mas na hora em que as coisas degringolarem, essa turma (CUT, MST e outros movimentos sociais) saberá exatamente em que lado tem de estar”, disse o parlamentar.

_________________________________________________________________________________________________________________

Prazo para explicações

Paulo de Tarso Lyra

A pouco menos de duas semanas do término do prazo inicial dado pelo Tribunal de Contas da União (TCU) para que o governo explique as “pedaladas fiscais” em 2014 — o atraso nos repasses do Tesouro para os bancos públicos —, cresce a expectativa de uma possível prorrogação do tempo para a resposta. Oficialmente, a assessoria do TCU afirmou que não há qualquer previsão de alteração.

Mas, para alguns especialistas, a data-limite poderá ser prorrogada sob a alegação de que uma parte das informações que ajudariam a embasar a resposta da presidente não teriam sido entregues ao Planalto.No governo, contudo, todo o esforço está voltado para dar as respostas já no próximo dia 22. Segundo apurou o Correio, a mudança da data da defesa não é vista como um benefício pelos governistas. “Temos de resolver logo isso, ficar sangrando mais para quê?”, questionou um aliado da presidente Dilma Rousseff.HistóricoToda a defesa do governo está embasada no fato de que a prática das chamadas pedaladas fiscais aconteceu também em gestões anteriores, e as contas do governo jamais foram contestadas.

Todas as vezes em que houve ressalvas, feitas pelo TCU, elas foram embasadas em motivos diferentes dos questionados atualmente pela oposição.De acordo com interlocutores governistas que acompanham de perto a defesa elaborada pela Advocacia-Geral da União (AGU) e pelo Ministério do Planejamento, a argumentação está bem sedimentada. “Ao longo de todo esse tempo, o TCU jamais modificou diretriz de análise”, disse um especialista, lembrando que, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) resolveu alterar a interpretação em relação às medidas provisórias, decidiu que as modificações “valeriam dali por diante, sem retroatividade”.

A oposição apresentou uma ação no TCU afirmando que, ao praticar as pedaladas fiscais, a presidente Dilma estaria incorrendo em crime de responsabilidade fiscal. Se condenada, a partir da rejeição das contas de 2014, ela poderia sofrer um processo de impeachment na Câmara dos Deputados.